Endividamento


Política Agrícola

Dívida - O tamanho do buraco

Em que pesem as dificuldades conjunturais e as mudanças abruptas de cenários, a agricultura brasileira cresceu de forma vigorosa nos últimos quinze anos. A área de grãos ampliou a área plantada em mais de um terço, e a produção animal mais do que dobrou. A atividade ficou mais intensiva, com dependência de terceiros em termos de capital fundiário para a aquisição de terras, maquinários e benfeitorias, além de giro para os ciclos das lavouras e criações.

É claro que o grau de capitalização do setor não foi suficiente para bancar com recursos próprios um aquecido movimento expansionista. Além disso, sem instrumentos anti-cíclicos para enfrentar quadros adversos de clima e doença, como seguro rural, bem como fatores macroeconômicos como juros elevados e câmbio valorizado, deixam a atividade exposta altos riscos. Agroanalysis procura traçar uma situação do campo, principalmente na área de grãos, diante da influência das decisões tomadas em passado recente sobre o presente.

A situação atual dos agricultores reflete as suas obrigações financeiras para saldar a dívida crescente assumida entre o ciclo favorável de 1999 a 2004. Em termos absolutos, a dívida passou de R$18 bilhões para R$ 50 bilhões nesse período. Por isso, apesar de uma comercialização favorável na presente temporada, o setor depara com pesado fardo em função da queda de rentabilidade nas safras 2004/05 e 2005/06;

É importante olhar com atenção para a evolução dos créditos de investimento, de comportamento cumulativo e diferente dos outros empréstimos de ciclo anual. Entre as safras 2002/03 e 2003/04, houve a contração de uma dívida adicional de R$ 20,9 bilhões só na rubrica crédito de investimento. O valor ficou próximo ao do crédito de custeio, de R$ 22 bilhões. Entre as safras 2000/01 e 2004/05, o endividamento aumentou em R$ 41,8 bilhões.

Somente no Programa de Modernização da Frota de Tratores Agrícolas e Implementos Associados a Colheitadeiras (Moderfrota) , os produtores contraíram uma dívida de R$ 10,2 bilhões entre as safras 2002/03 e 2003/04.

Cabe assinalar também que as estatísticas do crédito rural do Banco Central não incluem o crédito extra-bancário, do sistema informal, de relevância crescente em anos recentes, como a Cédula do Produto Rural (CPR), um título criado pela Lei n° 8.929, em 22 de agosto de 1994, para fomentar a venda de produtos agrícolas, assim como a compra de insumos contra pagamento na safra.

O instrumento pode ser registrado na Central de Custódia e Liquidação Financeira de Título (Cetip) e avalizado por um agente financeiro. Quando não é registrado e avalizado o instrumento é chamado de "CPR de gaveta".

As operações da " CPR de gaveta", que somam valores bem maiores em comparação às CPRs avalizadas e registradas, fazem parte de um sistema informal de crédito desenvolvido no Brasil nos últimos anos. Seu crescimento decorre das dificuldades burocráticas e da oferta de garantia para acessar o sistema formal. As agroindústrias e traders, diante da maior facilidade para captar recursos, realizam "CPR de gaveta" com os agricultores a custos mais competitivos.

Quando se compara a evolução anual, os saldos devedores médios dos produtores cresceram em relação ao Produto Interno Bruto setorial, divulgado pelo IBGE. No biênio 2005/06, a participação da dívida agrícola no PIB subiu com todo vigor, pelo efeito combinado de aumento de R$ 9 bilhões e R$ 6 bilhões, respectivamente, nas dívidas de custeio e investimento, enquanto o PIB sofria queda.

Agricultura: Dívida do crédito em relação
ao PIB DA aRICULTURA

Ano

Custeio

Investimento

Comercialização

Total

1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
*2006

16,4
17,5
15,8
14,6
17,9
19,4
18,3
17,1
15,9
15,7
19,7
24,6

11,8
11,0
10,8
12,9
14,3
16,0
18,4
16,9
16,7
17,7
23,1
27,8

7,0
5,0
5,1
5,3
3,1
2,3
2,5
2,1
2,4
2,1
1,9
2,6

35,3
33,5
31,7
32,6
35,3
37,7
39,2
36,1
35,0
35,5
44,7
54,8

Fonte: Bacen e IBGE
(*) valores até outubro

Observação: Os valores das dívidas incluem uma estimativa do montante da dívida agrícola transferida em 2001 dos bancos federais para o Tesouro Nacional, com base na Medida Provisória nº 2.196-3, de 24 de agosto de 2001, de R$ 6 bilhões para o crédito de custeio e R$ 3 bilhões para o crédito de investimento.

Esse rápido crescimento do endividamento agrícola de curto e longo prazos, combinado com a queda na renda entre as safras 2004/05 e 2005/06, impede que o setor tenha capacidade para saldar seus compromissos.

Nos próximos anos, o grande desafio do governo está justamente em praticar uma política agrícola, que alivie o endividamento excessivo de uma atividade cercada de incertezas e volatilidades intrínsecas. Elevados investimentos sempre pressionam os custos fixos de produção e causam rigidez na oferta quando a conjuntura de preços está comprimida. Tudo isso torna o ambiente mais volátil e instável.

Luiz Antonio Pinazza, editor-executivo da Agroanalysis (Fundação Getúlio Vargas)

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Boletim Informativo nº 957, semana 21 a 27 de maio de 2007
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

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