RECURSO EM COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO SINDICAL - TRT- PR- 00491-2007-073-09-00-4 (RCCS)
RECORRENTES(S):
CONFEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA DO BRASIL - CNA, FEDERAÇÃO
DA
AGRICULTURA DO ESTADO DO PARANÁ - FAEP, SINDICATO RURAL DE GRANDES RIOS
e SINDICATO RURAL DE FAXINAL
RECORRIDO: V. C. B.
RELATOR: DIRCEU PINTO JÚNIOR
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de RECURSO EM COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO SINDICAL, provenientes da MM. VARA DO TRABALHO DE IVAIPORÃ, sendo Recorrentes CONFEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA DO BRASIL - CNA, FEDERAÇÃO DA AGRICULTURA DO ESTADO DO PARANÁ - FAEP, SINDICATO RURAL DE GRANDES RIOS e SINDICATO RURAL DE FAXINAL e Recorrido V. C. B.
I.RELATÓRIO
Inconformadas com a r. sentença de fls. 262/277, proferida pelo Exmo. juiz Ricardo José Fernandes de Campos, que rejeitou os pedidos formulados na inicial, complementada pela decisão de embargos de declaração de fls. 288/289, recorre a parte autora. Postula a reforma do julgado quanto à contribuição sindical.
Custas recolhidas à fl. 307.
Não foram apresentadas contra-razões.
Os autos não foram encaminhados ao Ministério Público do Trabalho em virtude do que dispõe o art. 44 da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho.
II.FUNDAMENTAÇÃO
1. ADMISSIBILIDADE
Conheço do recurso ordinário interposto pela parte autora, eis que regularmente interposto.
2. MÉRITO
CONTRIBUIÇÃO SINDICAL
A sentença (fls. 262/277) rejeitou a pretensão da parte autora por entender que, a partir do advento da Constituição Federal de 1988, o sindicato passou a ter natureza privada, e não mais semipública, motivo pelo qual deixou de ter a função delegada pelo Poder Público de executar diretamente as contribuições devidas compulsoriamente pela categoria econômica ou profissional, passando a ser inaplicável o art. 606 da CLT. Salientou que a contribuição sindical, tal como regulada nos arts. 578 a 610 da CLT, foi ab-rogada pela nova Carta Política. Asseverou ser inconstitucional a cobrança compulsória desta extinta contribuição sindical, aduzindo que tal cobrança não pode prevalecer contra os princípios maiores da liberdade e autonomia sindical. Destacou que a contribuição em tela não tem natureza de tributo e, mesmo que assim fosse considerada, seria necessária Lei Complementar que, no caso, não foi criada. Por fim, ressalta que a contribuição sindical patronal, se considerada um tributo, importaria em bitributação, visto que teria o mesmo fato gerador e base de cálculo do ITR.
Data venia do entendimento esposado pelo juízo de primeiro grau, entendo que o julgado merece reforma, no particular.
A
meu ver, ao contrário do asseverado pela sentença, os arts. 578 e
seguintes da CLT foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988,
sendo plenamente aplicáveis à hipótese.
Com
efeito, a capacidade tributária ativa, para arrecadar e fiscalizar a
cobrança da contribuição sindical rural, era, inicialmente, do INCRA -
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, conforme dispõe o
art. 4º do Decreto-Lei nº 1.166/71:
"Caberá ao Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). proceder ao
lançamento e cobrança da contribuição sindical devida pelos integrantes
das categorias profissionais e econômicas da agricultura, na
conformidade do disposto no presente Decreto-Lei."
Todavia, com o advento da Lei nº 8.022/90, a arrecadação da contribuição sindical rural passou a ser competência da Secretaria da Receita Federal, conforme dispõe o seu ano 1º: "É transferida para a Secretaria da Receita Federal a competência de administração das receitas arrecadadas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, e para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a competência para a apuração, inscrição e cobrança da respectiva dívida ativa", ressaltando o § 1º que "a competência transferida neste artigo à Secretaria da Receita Federal compreende as atividades de tributação, arrecadação, fiscalização e cadastramento".
Entretanto, a
Lei nº 8.847/94, em seu art. 24, inciso I, retirou da Secretaria da
Receita Federal essa atribuição ao preconizar que "a competência de
administração das seguintes receitas. atualmente arrecadadas pela
Secretaria da Receita Federal por força do artigo 1º da Lei nº 8022 de
12 de abril de 1990. cessará em 31 de dezembro de 1996: I -
Contribuição Sindical Rural, devida à Confederação Nacional da
Agricultura - CNA e à Confederação Nacional dos Trabalhadores na
Agricultura - CONTAG, de acordo com o artigo 4º do Decreto-Lei nº
1.166, de 15 de abril de 1971, e artigo 580 da Consolidação das Leis do
Trabalho - CLT;"
Com isto, a Lei nº 9.393/96, que dispõe sobre o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR, sobre pagamento da dívida representada por títulos da dívida agrária e dá outras providências, em seu art. 17, autoriza a Secretaria da Receita Federal a formalizar convênios para a cobrança das contribuições sindicais, indicando os órgãos da administração tributária das unidades federadas, visando delegar competência para a cobrança e o lançamento do ITR, e a Confederação Nacional da Agricultura - CNA e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG, com a finalidade de fornecer dados cadastrais de imóveis rurais que possibilitem a cobrança das contribuições sindicais devidas àquelas entidades.
Respaldado neste dispositivo
legal, houve a formalização de convênio entre a CNA e a Secretaria da
Receita Federal, cujo extrato foi publicado no Diário Oficial da União,
de 21.5.98, posteriormente alterado pelo Termo Aditivo firmado em
31.3.99 (DOU 5.4.99), em que consta a manutenção de todas as cláusulas
do convênio celebrado em 18.5.98, devendo a Secretaria da Receita
Federal fornecer à Confederação Nacional da Agricultura as informações
cadastrais e econômico-fiscais constantes da base de dados do Imposto
Territorial Rural - ITR, referente ao ano de 1990, atualizados, de
forma a possibilitar, em caráter suplementar, o lançamento e a cobrança
de contribuições administradas pela CNA, a que alude o art. 24 da Lei
nº 8.847/94, relativas ao exercício de 1997.
Observa-se, portanto, que, a partir de 1997, a CNA - Confederação Nacional da Agricultura passou a exercer a função de arrecadar a contribuição sindical rural, já que, uma vez cessada a competência da Receita Federal, a atividade arrecadadora volta a ser realizada na forma dos arts. 578 a 610 da CLT, que continuam em pleno vigor, mormente quando a Lei nº 8.383/91, que disciplinou, à época, sobre as atualizações de tributos administrados e devidos à Receita Federal, dispõe expressamente, em seu art. 98, sobre os dispositivos legais que foram por ela revogados, dentre os quais não se incluem referidos artigos da CLT.
Preconiza o art. 579 que "a contribuição sindical é
devida por todos aqueles que participarem de uma determinada categoria
econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do
sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou,
inexistindo este, na conformidade do disposto no artigo 591".
Complementa o art. 589 que "da importância da arrecadação da
contribuição sindical serão feitos os seguintes créditos pela Caixa
Econômica Federal, na forma das instruções que forem expedidas pelo
Ministro do Trabalho: I - 5% (cinco por cento) para a confederação
correspondente; II - 15% (quinze por cento) para a federação; III - 60%
(sessenta por cento) para o sindicato respectivo; IV - 20%· (vinte por
cento) para a 'Conta Especial Emprego e Salário'.
O art. 590 alerta que "inexistindo confederação, o percentual previsto no item I do artigo anterior caberá à federação representativa do grupo. §1º. Na falta de federação, o percentual a ela destinado caberá à confederação correspondente à mesma categoria econômica ou profissional. § 2º. Na falta de entidades sindicais de grau superior, o percentual que àquelas caberia será destinado à 'Conta Especial Emprego e Salário'. § 3º. Não havendo sindicato, nem entidade sindical de grau superior, a contribuição sindical será creditada, integralmente, à 'Conta Especial Emprego e Salário'.
Por fim, o art. 591 preconiza que "inexistindo sindicato, o percentual previsto no item III do artigo 589 será creditado à federação correspondente à mesma categoria econômica ou profissional. Parágrafo único. Na hipótese prevista neste artigo, caberão à confederação os percentuais previstos nos itens I e II do artigo 589".
Por isto, entendo que a
CNA - Confederação Nacional da Agricultura, FAEP - Federação da
Agricultura do Estado do Paraná e Sindicato Rural Grande Rios têm
legitimidade para efetuar a cobrança da contribuição sindical rural,
porquanto são, inequivocamente, credores de parte da exação.
Neste
diapasão, aplica-se o art. 606 da CLT, que determina que "às entidades
sindicais cabe, em caso de falta de pagamento da contribuição sindical,
promover a respectiva cobrança judicial, mediante ação executiva,
valendo como título de dívida a certidão expedida pelas autoridades
regionais do Ministério do Trabalho".
Referido dispositivo deve ser interpretado sob a ótica da norma constitucional que, em seu art. 8º, afasta as entidades sindicais do âmbito de intervenção do Estado. Com isto, para a cobrança da contribuição sindical, não se exige mais a expedição de certidão pelo Ministério do Trabalho (órgão da administração pública direta), sob pena de afronta ao texto constitucional. Basta somente a emissão das guias de recolhimento e dos demonstrativos de constituição do crédito tributário, como os juntados aos autos às fIs. 28/46.
Não bastasse tal fato, a cobrança da contribuição sindical está prevista em lei e tem, portanto, caráter compulsório (art. 149 da Constituição Federal), o que torna obrigatório o seu pagamento todos aqueles que se enquadrem nas hipóteses legais.
No que diz respeito ao enquadramento e à contribuição sindical rural, dispõe o art. 1º do Decreto-Lei nº 1.166/71 que "para efeito da cobrança da contribuição sindical rural prevista nos artigos 149 da Constituição Federal e 578 a 591 da Consolidação das Leis do Trabalho, considera-se: I - trabalhador rural: a) a pessoa física que presta serviço a empregador rural mediante remuneração de qualquer espécie; b) quem, proprietário ou não, trabalhe individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido o trabalho dos membros da mesma família, indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência c colaboração, ainda que com ajuda eventual de terceiros; II - empresário ou empregador rural: a) a pessoa física ou jurídica que, tendo empregado, empreende, a qualquer título atividade econômica rural; b) quem, proprietário ou não, e mesmo sem empregado, em regime de economia familiar, explore imóvel rural que lhe absorva toda a força de trabalho e lhe garanta a subsistência e progresso social e econômico em área superior a dois módulos rurais da respectiva região; c) os proprietários de mais de um imóvel rural, desde que a soma de suas áreas seja superior a dois módulos rurais da respectiva região. (Redação dada ao artigo pela Lei nº 9.701 de 17.11.1998, DOU 18.11.1998)".
Portanto, uma vez enquadrado nas hipóteses legais acima mencionadas, o empresário ou empregador rural torna-se sujeito passivo da exação e a cobrança efetuada pelas entidades sindicais é absolutamente legítima, em face da expressa disposição inserta nos arts. 579 e 589 da CLT.
Assim, somada a existência de previsão legal e a possibilidade de convênio firmado entre a CNA e a Secretaria da Receita Federal, a cobrança da contribuição sindical deve ser feita pela entidade sindical (CNA), que lança a cobrança da dívida a partir dos dados repassados pela Receita Federal, e que permitem enquadrar o devedor na condição de integrante da categoria sobre a qual incide a contribuição obrigatória, bastando, para tanto, a emissão de guia de recolhimento acompanhada do demonstrativo da constituição do crédito.
Nestes termos e considerando que a cobrança está sendo requerida pelos credores legitimados pela lei e que a obrigação de pagamento decorre de disposição legal, é devido o recolhimento da contribuição, na forma pretendida.
Não se cogita, por outro lado, de inconstitucionalidade da cobrança sindical, sob a alegação de ausência de lei complementar, porquanto já foi afastado pelo Excelso Supremo Tribunal Federal o argumento de que haveria necessidade de Lei Complementar para instituição da contribuição, tendo em vista sua recepção expressa pelo art. 10, § 2º, do ADCT.
Na hipótese, o próprio contribuinte, quando da declaração anual do Imposto Territorial Rural - ITR, informa o tamanho do seu imóvel à Secretaria da Receita Federal, que repassa essas informações à CNA, a fim de que esta verifique se há o enquadramento no conceito de empregador rural e possa efetuar a cobrança. Além disso, consta da aludida declaração o valor da terra nua tributável, sobre o qual incidirá a alíquota para cálculo da contribuição sindical, na forma do art. 580 da CLT.
A contribuição sindical rural tem natureza jurídica tributária, sendo seu pagamento obrigatório, independentemente de o réu ter ou não recebido a notificação para pagamento da contribuição. A meu ver, não há necessidade de sua notificação porque a contribuição sindical é anual e com tempo certo, na mesma época do pagamento do Imposto Territorial Rural, o que dispensa essa formalidade. Aliás, não seria razoável obrigar as requerentes a publicarem a cobrança da contribuição sindical nos jornais de circulação local de cada um dos Municípios da Federação em que se situa uma gleba rural, a fim de receber a contribuição sindical rural, mormente quando, tal como no caso dos autos, o réu foi notificado quanto à propositura da presente ação.
Assim, estabelecido que a ausência de publicação de editais de que trata o art. 605 da CLT não é óbice à propositura de ação de cobrança da contribuição sindical, não há que se cogitar de qualquer irregularidade no tocante.
Também o art. 600 da CLT dispõe sobre a incidência de multa para o pagamento fora do prazo do art. 587, mas espontâneo. Conclusivo, pois, que a disposição legal é no sentido da obrigatoriedade do recolhimento da contribuição sindical, independentemente de notificação do contribuinte, posto que estabelece a forma e o prazo para pagamento, bem como a incidência de multa para o pagamento extemporâneo, porém espontâneo.
Também não há que se falar em bitributação. É certo que o réu está obrigado ao pagamento do imposto sobre propriedade territorial rural (ITR), que tem a mesma base de cálculo da contribuição sindical rural. Todavia, esta é uma espécie de contribuição social destinada às entidades sindicais (art. 589 da CLT), com regime jurídico diferenciado. Assim, embora ambos tenham a mesma hipótese de incidência (propriedade rural), não há bitributação.
Pelo exposto, deve ser acolhida a pretensão posta na exordial quanto à condenação do recorrido ao pagamento das contribuições sindicais rurais relativas aos anos de 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006, acrescidas de multa do art. 600 da CLT, na forma postulada (fl. 14). Observe-se, porém, o limite imposto pelo art. 412 do CC. Em que pese a insurgência do réu acerca da multa, a ilação do art. 600 da CLT deixa claro que se afigura devido o pagamento.
Ainda, são devidos os honorários advocatícios em face da sucumbência, à razão de 20% sobre o total da condenação. Ressalto que a hipótese não se enquadra como ação trabalhista comum, sendo afastada, por isso, a aplicação do disposto na Lei nº 5.584/70. Devido, ainda, o ressarcimento do valor recolhido pela parte autora a título de custas, no importe de R$126,69.
Reformo, nos termos acima.
DOU PROVIMENTO
para condenar o recorrido ao pagamento das contribuições sindicais
rurais, acrescidas da multa do art. 600 da CLT, e de honorários
advocatícios de sucumbência, bem como do valor correspondente às custas
recolhidas pela parte autora.
III.CONCLUSÃO
Pelo que,
ACORDAM os Desembargadores da 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, por unanimidade de votos, CONHECER DO RECURSO EM COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO SINDICAL DAS PARTES. No mérito, sem divergência de votos, DAR PROVIMENTO AO RECURSO EM COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO SINDICAL DOS AUTORES para, nos termos da fundamentação, condenar o recorrido ao pagamento das contribuições sindicais rurais, acrescidas da multa do art. 600 da CLT, e de honorários advocatícios de sucumbência, bem como ao ressarcimento do valor correspondente às custas recolhidas pela parte autora.
Custas invertidas, fixadas em R$100,00, calculados sobre o valor provisoriamente atribuído à condenação de R$ 5.000,00.
Intimem-se.
Curitiba, 14 de fevereiro de 2008.
DIRCEU PINTO JÚNIOR
Relator