Assembléia-Geral da FAEP 


Campo também deve ajudar
a frear populismo, diz Ágide

Ágide Meneguette:"O sindicato não pode fazer política partidária porque isso é proibido pela Consolidação das Leis Trabalhistas. Mas isso não significa que não possa e não deva fazer política cívica, na defesa dos interesses dos produtores rurais e da sociedade"

A nova onda de populismo que, via instrumentos democráticos, tenta instaurar ditaduras e mudar o sistema econômico em país sul-americanos, deve servir como alerta para a sociedade civil brasileira. Cabe também ao campo, e aos líderes do sindicalismo rural, fazer a defesa do direito de propriedade, do desenvolvimento econômico, da livre manifestação do pensamento e da liberdade.

"O sindicato não pode fazer política partidária porque isso é proibido pela Consolidação das Leis Trabalhistas. Mas isso não significa que não possa e não deva fazer política cívica, na defesa dos interesses dos produtores rurais e da sociedade", disse Ágide Meneguette, presidente da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (FAEP) na assembléia-geral da entidade, que reuniu  no dia 21 dezenas de produtores rurais em Curitiba.

Assembléia-geral da entidade, que reuniu no dia 21 dezenas de produtores rurais em Curitiba

No tradicional encontro de início de ano, Meneguette fez também uma análise da atual situação econômica dos produtores rurais, que ainda carregam pesada dívida e são prejudicados pela política cambial do Governo; uma política que ofusca os efeitos do aumento da produtividade e da valorização das commodities no mercado internacional.

 
   Veja, a seguir, a íntegra do discurso de Ágide Meneguette.


Meus companheiros

O grande problema com que nos defrontamos no ano de 2007 foi, ainda, o endividamento dos produtores rurais.  

Em que pese a excepcional alta dos preços internacionais das commodities agrícolas, 88% acima dos preços históricos, em especial da soja, do milho e do trigo, os produtores rurais ainda carregam prejuízos e dívidas contraídas a partir do segundo semestre de 2004 até 2006. 

Parte dessa dívida e desse prejuízo tem como origem três secas sucessivas que castigaram o Sul do país, e de modo especial o Paraná.

Se o problema fosse apenas a seca, o Manual de Crédito Rural teria resolvido com facilidade e as dívidas com fornecedores poderiam ser roladas por um ano a mais. 

A questão maior foi, no entanto, a política cambial do Governo Federal. Nenhum esforço foi feito no sentido de minorar os perversos efeitos da brutal queda do dólar frente ao real. É bem verdade que a depreciação do dólar é um fenômeno mundial, mas foi no Brasil que essa queda se deu mais aguda.  

Ocorre que, além dos saldos líquidos na nossa balança de pagamentos, que no ano passado superou a US$ 40 bilhões, tem havido uma enxurrada de aplicações externas em nosso país, atraída pelos juros altos e pela benevolência inexplicável do Governo brasileiro em relação aos especuladores estrangeiros. 

Enquanto nós pagamos Imposto de Renda, por sinal alto, e Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que também é alto, para realizar aplicações financeiras, os estrangeiros estão isentos.   

É inadmissível esse protecionismo aos estrangeiros em detrimento de nós, brasileiros. Deveria prevalecer o princípio da isonomia. Não fosse esse protecionismo, provavelmente a entrada de dólares em nosso país seria menor e, portanto, menor o seu impacto na cotação das moedas. 

Essa política está vagarosamente destruindo o setor exportador, tirando a competitividade. Não há outra explicação para esse espetacular fluxo de importações chinesas, indianas e de outros países de moeda controlada. De outro lado, a conversão dos preços em dólar para real enfraquece a nossa posição.

O aumento da produtividade não está compensando essa defasagem cambial.

Já  imaginaram, com esses preços da soja, do milho, do trigo, da carne, a um câmbio um pouco  mais realista de R$ 2,50, por exemplo? Façam as contas e verifiquem o quanto estamos perdendo. 

Pois bem, tudo isso conspirou contra o produtor, forçado a se endividar. Em junho do ano passado, quando o Governo ainda torcia o nariz para qualquer negociação séria, a FAEP reuniu a bancada federal e o ministro da Agricultura numa sala na CNA, em Brasília, e mostrou o colossal prejuízo de R$ 9,7 bilhões que os produtores rurais do Paraná tiveram de 2004 até o início de 2007. 

O nosso encontro em Brasília teve o condão de levar a um reinício de negociações que tiveram, a bem da verdade, resultados parciais, com o Governo aceitando alguma forma de prorrogação de débitos.

Como a solução foi parcial, continuaremos a discutir o problema.

 Mas a crise não atingiu a todos de maneira uniforme. Alguns sofreram mais do que os outros, seja pela região, pelo produto, pela escala. Mas há um fato relevante: muitos produtores sofreram um impacto menor e conseguimos descobrir de muitos deles foram daqueles que participaram do programa Empreendedor Rural.   

É que o Empreendedor Rural ensina a trabalhar por projeto, o que reduz em muito os efeitos maléficos de uma crise e também ajuda a aumentar a renda.

Tenho comigo que esta foi uma das grandes "sacadas" do nosso sistema. O Empreendedor Rural está ajudando a profissionalizar nosso produtor e dando a ele novas alternativas. Já passaram pelos cursos mais de 15 mil trabalhadores e produtores rurais. Uma massa crítica de respeito que seguramente exerce uma influência estimulante direta e indireta sobre todo o setor.   

E o Empreendedor Rural é, hoje, um programa de prestígio nacional que está sendo replicado em vários outros estados. No encerramento da edição de 2007,  no dia 3 dezembro,  com a participação de 3 mil pessoas no Expotrade, incluindo dirigentes sindicais, tivemos a presença do ex-ministro, ex-deputado e professor Delfim Neto e do governador do estado de São Paulo, José Serra. Como em anos anteriores, que ministraram as aulas magnas o ex-governador do Mato Grosso Blairo Magi, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin, o saudoso presidente da CNA Antônio Ernesto de Salvo, o senador Osmar Dias, o prof. Xico Graziano, o ex- ministro Pratini de Morais. 

É claro que todo o esquema montado pelo  Senar Paraná em parceria com o Sebrae, a Fetaep e a Faep concorre para que haja essa melhoria na produção e na produtividade da agropecuária do estado. O Senar concorre, inclusive, para que haja mudanças no perfil de produção, com a introdução do plantio de novos produtos, com maior valor agregado.

Dentro desse espírito de dar melhores condições de produção e comercialização ao nosso produtor e assim aumentar a sua renda, a FAEP e o Senar iniciaram uma nova e importante empreitada: levar aos produtores do estado informações sobre como funciona o mercado futuro.  

Em parceria com o Banco do Brasil, o Senar preparou vários instrutores que, a partir deste ano, vão difundir os passos para negociar seu produto na Bolsa de Mercadorias,  para que o nosso produtor saiba comercializar melhor, travando preço e evitando as oscilações perturbadoras do mercado.

Em nosso relatório anual é feito um destaque especial para o Programa de Desenvolvimento Sindical. Em 2007 participaram 102 sindicatos, e 248 dirigentes sindicais.  

No encontro que tivemos no dia 3 de dezembro no Expotrade, tive a oportunidade de ouvir vários dirigentes companheiros nossos  e eles foram unânimes em considerar que o programa está dando a eles um instrumental valioso para dar e consolidar o prestígio do sindicato rural na comunidade.  

Espero que este ano os outros sindicatos também participem, e os que já fizerem a Fase 1, façam também a Fase 2, que trata mais especificamente da mobilização de pessoas para objetivos concretos, sob a liderança de nossos dirigentes.

Fortalecer o sindicato rural é fortalecer o sistema e dar a ele voz mais alta e firme. Quanto mais fortes fomos, maior será a nossa influência, quer como sistema, quer de cada um dos dirigentes.
 

Essa observação me leva a outra reflexão importante.

Sindicato faz política sindical. Mas não dá para separar a política sindical da política no seu sentido mais abrangente, a política que pretende influenciar o poder.  

O sindicato não pode fazer política partidária porque isso é proibido pela Consolidação das Leis Trabalhistas.

Mas isso não significa que não possa e não deva fazer política cívica, na defesa dos interesses dos produtores rurais e da sociedade.

De certa forma foi este o recado que pretendemos dar no evento do dia 3 de dezembro.

Os sindicatos laborais de um modo geral e de forma indireta estão fazendo política e política partidária, uma vez que ligados a um partido político. As Centrais Sindicais são braços políticos de partidos e atuam desabridamente, inclusive colocando seus dirigentes em cargos de direção no Governo Federal.

Nós não podemos fazer isso como sindicato, mas temos nosso dever cívico. Mais que dever, um direito como pessoa física que tem um título de eleitor e uma consciência que o obriga a defender o direito de propriedade, a livre manifestação, o desenvolvimento e  a liberdade.

Sei que todo mundo está profundamente preocupado com os rumos que o país está tomando, muito assemelhado com alguns vizinhos na América do Sul e América Central.

É realmente preocupante esta nova onda de populismo que se serve de instrumentos democráticos na tentativa de instaurar ditaduras e mudar o sistema econômico. A Bolívia está tentando. O Equador está ensaiando, a Nicarágua voltou ao poder dos sandinistas e a Venezuela deu uma contundente resposta ao seu presidente Chaves que desejava poderes ilimitados e para sempre, mas ele já anunciou que vai tentar conseguir seu intento por outros meios.

A derrota de Chaves, as dificuldades por que passa Evo Morales para impor a sua constituição  e a recente "tunda" que o Governo Federal levou no Senado na votação da CPMF são sinais que há reação e repúdio à forma autoritária com que querem governar. Mas isso não quer dizer que esses populistas não tentarão outros expedientes para impor a sua vontade.

Basta lembrar que, apesar do compromisso de não elevar qualquer outro imposto, virou o ano e o Governo Federal majorou as alíquotas do IOF, atingindo diretamente os produtores rurais, e a CSLL dos bancos, que fatalmente será repassada aos seus clientes, isto é, a nós todos.

A nós resta agir no Judiciário, quando for o caso de desrespeito à lei, como costuma fazer o MST e mesmo assim sem muito respaldo dos executivos cujo dever seria o de defender o direito de propriedade.  

Como  grande campo de ação os embates se darão no Congresso Nacional. É lá que a sociedade pode impedir a aprovação de leis que possam tolher a nossa liberdade. Já foi feito isso quando o Congresso disse "não" a projetos de lei com o objetivo de cercear a imprensa, garrotear a cultura, passos iniciais e necessários para alcançar a meta ditatorial. Chaves conseguiu chegar aonde chegou fazendo isso: fechando jornais e televisões, assumindo o controle de bens culturais. Sem informações, a sociedade acaba ficando a mercê do governo.

Como nós somos parte dos quadros responsáveis pela manutenção da democracia em nosso país, temos que nos preparar. Primeiro consolidando os nossos sindicatos, tornando-os representativos de fato, ampliando o número de associados e fazendo com que participem da vida sindical e da vida pública.

Como cidadãos - independentemente de nossa condição de dirigentes sindicais - temos o dever de mobilizar a sociedade na defesa de nossos valores sob pena de ver a nação amargar o peso de um totalitarismo que o mundo já repudiou, mas que parece insistir em renascer por estas bandas da América Latina.

Nestes últimos tempos esse tema tem sido recorrente porque na realidade devemos ter medo de que algo de maléfico aconteça ao nosso país. São assustadores os sinais e eles nos levam a ter que adotar ações muito claras, desabridas. Não é possível deixar as coisas como estão porque elas podem se encaminhar para um quadro indesejável.

Assim, não se pode renunciar a ações políticas como cidadão e nem se omitir da responsabilidade de mobilizar nossa gente e a sociedade.
 

Muito obrigado.

Ágide Meneguette.

Boletim Informativo nº 990, semana de 28 de janeiro a 3 de fevereiro de 2008
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná
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