O governo federal tem um certo compromisso com os assim chamados
movimentos sociais, no sentido de modificar os índices de
produtividade agrícola.
É preciso entender bem esse tema. Os índices de
produtividade foram criados nos anos 60 e tinham por objetivo
forçar os produtores rurais a investir em tecnologia, para
produzir mais por área. Com isso, a idéia era acabar a
especulação com a terra, bem como levar ao cumprimento da
função social da propriedade rural, que era gerar
empregos e renda para o país de forma sustentada.
E, por trás desses objetivos, havia um outro: as terras que
não atingissem o índice mínimo de produtividade,
independentemente do cultivo ou da região onde estivessem,
ficariam sujeitas a desapropriação para fins de reforma
agrária. Embora discutível, havia um sentido nisso tudo:
o setor rural não era homogêneo e havia segmentos
extremamente atrasados e incapazes de competir: estimular a
produtividade poderia ser um mecanismo interessante para mudar essa
realidade.
Por outro lado, a inflação alta também inibia a
eficiência, porque os custos de produção eram
“comidos” por ela, de modo que não havia
exposição dos produtores incapazes.
Mas isso tudo acabou. Os sucessivos planos de
estabilização da economia produziram resultados brutais
na agricultura: correções de preços, de
dívidas rurais com índices diferentes no Plano Collor e o
descasamento do Plano Real acabaram levando a uma tríplice
colisão na primeira metade dos anos 90:
estabilização interna da moeda, abertura comercial
indiscriminada e falência das políticas públicas
para o setor.
Isso gerou duas ondas simultâneas no campo: uma de conclusão e outra de competitividade.
Aqueles produtores - especialmente os pequenos - que por diversas
razões não conseguiram avançar foram
excluídos da atividade. E os remanescentes tiveram que investir
em tecnologia e em gestão para sobreviver. Com isso, o
agronegócio brasileiro hoje é extremamente eficiente e
competitivo, a produtividade aumentou espetacularmente e os
índices ficaram desatualizados. Mas, então, por que
corrigi-los agora? Por que aumentá-los? Só para ampliar o
número de hectares para reforma agrária? Por que
só no campo se exige uma produtividade mínima?
Indústria tem índice de produtividade? Loja tem?
Restaurante, bares, cinemas, farmácias, fábrica de
autopeças, de roupas, de alimentos, têm? Bancos têm?
Não, claro que não! Porque, se não são
eficientes e competitivos, não agüentam a
concorrência e quebram. Ora, isso também acontece no
moderno agronegócio brasileiro.
Acabou o tempo em que comprar terra era bom investimento. Hoje, o
produtor rural que não for competitivo também quebra.
Também é excluído. Com a inflação
dominada, não tem mais ineficiência escondida. Agora
está tudo às claras: ou é bom ou cai fora.
Por essas razões, não há sentido mais em
estabelecer índices de produtividade para desapropriar terras
para reforma agrária: o mercado desapropria, por si só.
E, além disso, seria uma injustiça: afinal, os
agricultores investiram em tecnologia, e, com isso, a produtividade
cresceu.
Aumentar os índices seria um castigo para quem investiu e melhorou as coisas para o país.
Não se discute se a reforma agrária é
necessária ou não. Mas forçar a barra para
arranjar mais terra para isso não parece lógico. Afinal,
qual a garantia de que os novos proprietários serão mais
produtivos?
Roberto Rodrigues foi ministro da Agricultura, é coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal. Texto publicado no jornal Folha de S. Paulo de 4 de agosto de 2007