Verde será o mundo ecologicamente correto e verde é o
dólar. Quem tiver juízo tentará lucrar com esse
mundo verdejante, produzindo os bens desejados pelos defensores do meio
ambiente. A mais nova iniciativa para esverdear o planeta, a partir dos
países mais desenvolvidos, é do presidente da
França, Nicolas Sarkozy, e do primeiro-ministro do Reino Unido,
Gordon Brown. Eles pretendem propor a redução do imposto
sobre valor adicionado (IVA) incidente nos produtos mais adequados
à preservação do ambiente, como carros menos
poluidores.
O comissário de Comércio da União Européia,
Peter Mandelson, defende uma política semelhante para o
comércio exterior, propondo impostos de importação
mais baixos para bens produzidos com preocupação
ambiental.
As duas propostas têm potencial para afetar o comércio
internacional e os brasileiros deveriam acompanhar o debate com
atenção.
A preocupação ecológica pode tanto criar
oportunidades para o comércio quanto favorecer o protecionismo.
Até agora os brasileiros estão mais familiarizados com o
lado perigoso das campanhas ambientalistas. Grupos de interesses podem
recorrer a alegações tão variadas quanto a defesa
das tartarugas marinhas, a preservação da floresta
amazônica e o combate à poluição
atmosférica para justificar barreiras comerciais. .
A alegações desse tipo somam-se facilmente outros
argumentos politicamente corretos, como a preservação da
saúde pública e a promoção de melhores
condições de trabalho nas economias emergentes.
A diplomacia comercial brasileira tem rejeitado, em princípio, a
inclusão de cláusulas sociais e ambientais nos acordos de
comércio. Essa tem sido, de modo geral, a atitude mantida na
Rodada Doha de negociações comerciais. A pretensão
européia de incluir no acordo agrícola certas
“preocupações não comerciais” foi
desde o início recebida criticamente. Essa posição
não é gratuita. Desde o começo da rodada, ficou
evidente o perigo de substituição de velhos
padrões por novos critérios protecionistas.
Mas o futuro das negociações globais é incerto e,
além disso, as preocupações politicamente corretas
- ambientais, sociais e sanitárias - tendem a ganhar
importância nos mercados mais desenvolvidos. O governo brasileiro
reconhece o fato e procura tirar vantagem dessa tendência, ao
tentar difundir noutros mercados o uso do etanol de cana. Esse
esforço inclui a melhora da imagem do País como produtor
de álcool.
A maior parte dos críticos do programa sabe pouco sobre a cana e
ainda menos sobre a Amazônia, mas o barulho político
produz efeito.
A decisão do governo de regular as condições
sociais e ambientais da produção de cana reflete a
preocupação com esse problema. É uma atitude
realista, em termos comerciais. Nesse caso, a preocupação
com o comércio impõe ao governo e aos produtores
brasileiros maior atenção a requisitos sociais e
ambientais valorizados em qualquer democracia razoavelmente moderna. O
País ganha de qualquer forma.
Outros setores da iniciativa privada reconheceram mais cedo que o
governo a importância das pressões politicamente corretas.
A Companhia Vale do Rio Doce deverá interromper o fornecimento
de minério de ferro a produtores de ferro-gusa do Pará e
do Maranhão, se usarem carvão vegetal produzido com
devastação florestal e em condições
degradantes de trabalho.
Processadores de soja vêm discutindo há mais tempo formas
de preservação ambiental, motivados por pressões
internacionais. Também no setor algodoeiro houve
reação a denúncias de trabalho escravo.
Seria muito melhor se iniciativas como essas fossem tomadas sem as
pressões do mercado externo. De toda forma, essas
pressões, motivadas ou não por interesses protecionistas,
vêm produzindo efeitos salutares. Mas não basta o cuidado
defensivo.
Os brasileiros podem oferecer ao mundo produtos bons e em
condições competitivas, como a carne, a soja, o
açúcar e o etanol. O governo e os produtores deveriam
gastar mais esforço para mostrar aos europeus as vantagens do
bife originário de um boi criado num pasto saudável. Mas
não podem dispensar, por enquanto, o esforço pela
conquista da credibilidade. Se tiverem sucesso, converterão a
preocupação com o verde numa generosa fonte de lucros.
(Editorial publicado no Estado de S. Paulo em 24 de julho de 2007)