No transcurso do Dia do Agricultor, o que comemorar? Tecer elogios a
esse herói que se arrisca todos os anos, como um trapezista que
salta sem rede e com as luzes apagadas? Francamente! Para mim, é
um dia triste só de pensar na situação aflitiva em
que se encontram milhares e milhares de famílias de produtores
rurais, sem muitas perspectivas aparentes.
Hoje em dia, produzir ficou mais difícil. Isto porque,
além do clima, não temos certeza se o Governo vai tomar
juízo e dar as condições mínimas
necessárias para que a agropecuária seja uma atividade
que garanta a sustentabilidade de uma família.
A agropecuária brasileira, em que pese ser a base para que o
agronegócio proporcione, todos os anos, saldos líquidos
de divisas de 40 bilhões de dólares, sofre de uma das
suas mais terríveis e profundas crises (ver página 23). E
isso em meio a uma das melhores condições de mercado
mundial que já existiram. Esse é o paradoxo que vivemos e
que é difícil aceitar.
Nunca os preços internacionais estiveram tão bons e o
mercado esteve tão ávido por nossos produtos, como
grãos, carnes, sucos, açúcar, álcool,
café e algodão. E, nunca, nossos custos estiveram
tão altos e os preços internos, tão baixos.
Culpa de quem? Do produtor que se endividou no início da
década, embalado pelo mercado e pelo incentivo dos
financiamentos oficiais? Ou do Governo, que é incapaz de
administrar a sua política cambial e o maior culpado pelos
preços internamente depreciados e pelos monumentais
prejuízos e endividamentos?
A agropecuária é uma atividade de altíssimo risco.
Depende dos humores de São Pedro e do mercado. Não faz o
preço de seus produtos e vive na dependência das
políticas do Governo. No mundo inteiro é assim. Seja nos
países desenvolvidos ou em desenvolvimento. As diferenças
entre cada país não são o clima e o mercado. Mas,
sim, as políticas de Governo.
Os Estados Unidos e a União Européia recusam-se a retirar
os subsídios dados, à mão cheia, a seus produtores
rurais. Mesmo que a agropecuária represente uma
fração insignificante de seu Produto Interno Bruto (PIB),
esses países têm na produção primária
a segurança da alimentação de suas
populações. Muitos desses países já
passaram fomes históricas e sabem muito bem o que vale um prato
de comida. Eles fazem tudo a seu alcance para proteger seus
agricultores e pecuaristas.
No Brasil, não! Aqui, há o preconceito de que o produtor
é rico, que vive chorando e mamando nas tetas do Tesouro sempre
que aperta o seu saldo devedor. Como também que as
pressões por renegociações de débitos
são para beneficiar apenas os grandes produtores. Ignora-se que
um estado, como o Paraná, tem, na sua maciça maioria,
produtores médios e pequenos. Como acontece em grande parte do
País.
Os três últimos anos foram lastimáveis! Plantava-se
com um dólar mais alto que o da colheita. A conversão do
preço internacional para o Real transformou-se num grande
prejuízo e num enorme endividamento. Tenta-se, de várias
maneiras, convencer o Governo de que só o alongamento das
dívidas vai permitir ao setor voltar a produzir e a crescer.
Querem uma prova de que a situação está realmente
difícil? Pelo terceiro ano consecutivo, sobram recursos a juros
pré-fixados em 8.75% ao ano. Fato inédito! E isso
não é porque o produtor está capitalizado. Muito
pelo contrário! É porque ele não tem mais limite e
nem garantias para dar, visando novos financiamentos. Só este
ano, sobram nos bancos R$ 5,4 bilhões e ninguém tem
capacidade de acessá-los.
Como o produtor não tem outra solução senão
produzir, mesmo que o faça com menos tecnologia e, portanto,
com menos produtividade, ele continua saltando no escuro e sem
rede de segurança. Nós continuaremos na luta, junto com
nossos parlamentares, para incutir juízo no Governo. Se
conseguirmos, vamos dar a esses heróis mais um fôlego. Mas
o que eles precisam mesmo são políticas coerentes e
incentivadoras para que continuem sendo a base para os grandes saldos
na balança comercial externa, como também, para colocar
comida no prato dos brasileiros.
Este não é um dia alegre! Mas deve ser um dia de
reflexão sobre os graves e grandes problemas do setor e de
reconhecimento pela coragem e pelo trabalho do produtor rural e de sua
família.
*Ágide Meneguette é presidente da Federação da Agricultura do Estado do Paraná - FAEP