O título de crédito clássico utilizado no
crédito rural é a cédula. Esta, além dos
elementos materiais e formais que lhe são próprios,
estipula os encargos moratórios. Prevalecem na hipótese
de inadimplência. Estes encargos somente poderão ser
aqueles previstos no Decreto-lei nº 167/67, lei de regência.
Os encargos moratórios se mostram exaustivos na referida lei,
não podendo a parte credora criar outros, a seu próprio
talante, porquanto estariam nulificados, ante a ausência de
previsão legal. A autonomia contratual em crédito
dirigido pelo estatismo como acontece com o rural, não pode
discrepar daquilo que a legislação afirma expressamente.
Aqueles dispositivos pertinentes aos encargos moratórios
não são meramente exemplificativos no Decreto, pois
exaurem as possibilidades de geração de outros. Mesmo que
alguns existam como tradição no direito comum, no direito
específico de crédito rural eles não têm
lugar.
Assim, não há como,
por exemplo, ser imposta a conhecida “comissão de
permanência” em títulos ou contratos atinentes a
financiamento rural. A vedação se origina da
interpretação do artigo 5º, parágrafo
único, do Decreto-lei nº 167/67. Na mesma esteira, a
legislação subsidiária contida no Decreto-lei
nº 413/69. Somente poderão ser cobrados, incidindo no saldo
devedor, juros moratórios de 1% ao ano, correção
monetária e a multa acaso o devedor não tenha se obrigado
a litigar por qualquer fato contratual. Obrigando-se o mutuário
a discutir o débito e, mostrando o excesso de cobrança,
estará afastada a aplicação da multa, nos termos
da jurisprudência majoritária do Superior Tribunal de
Justiça. No moderno CDC, após 1996, data de seu advento,
não pode a multa ultrapassar os 2%. Afastados, pois, os
draconianos 10%. Aplicam-se às instituições
financeiras as normas do Código do Consumidor.
Não se perca de vista
que o crédito rural é crédito de fomento e, dessa
forma, não se submete aos regramentos do direito cambial comum,
aplicado a negócios diversos, em que não há
objetivo de desenvolvimento de setor vital para o Estado, isto
é, produção de alimentos e garantia de
exportação, ensejando a maximização
favorável da balança comercial com reflexos diretos no
câmbio. Por essa razão a existência de
legislação de regência, plenamente
específica para o campo.
Ainda, no relativo à
incidência da comissão de permanência, nem sequer no
crédito comum tem sido permitida a sua cumulação
com a multa contratual pela inadimplência. Para isso reconhece a
superior instância do STJ, não ser cumulativa a multa com
a comissão de permanência, isso até nos
créditos comuns, eis que no crédito rural, desta
não se cogita. Aliás, essa é a compreensão
contida na Resolução nº 1129 do Banco Central, que
cumpriu decisão do Conselho Monetário Nacional, tudo na
consonância no artigo 4º, VI e IX, da Lei nº 4.595, de
31.12.64.
Prevalecente na
espécie rural é a decisão do STJ (REsp nº
59.461/RS), ao dizer “...Na hipótese de mora do devedor,
aplica-se o disposto no artigo 5º, parágrafo
único, do Decreto-lei nº 167, de 19.02.67, sendo ilegal a
previsão de aplicação de qualquer outra taxa,
comissão de permanência ou encargo tendente a burlar o
comando emergente do referido diploma legal. Precedentes do STJ.”
A rigor, trata-se da aplicação serena do disposto na lei
de regência do crédito rural. A sua infringência
gera nulidade.
Djalma Sigwalt é advogado, professor e consultor da
Federação da Agricultura do Paraná - FAEP - djalma.sigwalt@uol.com.br