PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DE SANTA CATARINA

RECURSO ORDINÁRIO - RO - 02839-2005-029-12-00-1
Recorrente:
A. C. DA S.
Recorridos:
CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA AGRICULTURA - CNA E OUTRO
RELATOR:
JUIZ GILMAR CAVALHERI

EMENTA:

CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL. DECRETO-LEI Nº 1.166/71. ENQUADRAMENTO SINDICAL. Nos termos do art. 1º, II, b, do Decreto nº 1.166/71, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 9.701/98, o enquadramento sindical do proprietário ou explorador de imóvel rural se dá em face da extensão da propriedade rural. Sendo ela superior a dois módulos rurais da respectiva região, ele é enquadrado como empresário ou empregador rural, independentemente de possuir ou não empregados e de trabalhar em regime de economia familiar.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de RECURSO ORDINÁRIO, provenientes da 2ª VARA DO TRABALHO DE LAGES, SC, sendo recorrente A. C. DA S. e recorridos CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA AGRICULTURA - CNA E OUTRO (02).

Recorre o réu da sentença de fls. 100-103, na qual foram julgados parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial para condená-lo ao pagamento da contribuição sindical rural dos exercícios de 1999, 2000, 2001 e 2002, no importe de R$ 1.612,79, a ser atualizado, mais honorários advocatícios de 20% sobre o valor líquido da condenação.

Nas suas razões recursais (fls. 105-109), aduz o réu que, garantindo a Constituição Federal a liberdade de associação, e não sendo ele filiado às entidades autoras, não pode ser obrigado a recolher contribuições sindicais a favor delas. Sustenta, nessa linha, não ter sido o Decreto-Lei nº 1.166/71 recepcionado pela Nova Ordem Constitucional, bem assim ter sido a matéria parcialmente regulada pelo Decreto Legislativo nº 0005/93 e Decreto Presidencial nº 1.703/95, através do qual o Congresso Nacional e o Poder Executivo ratificaram a Convenção nº 141 da OIT, destacando que, diante da mencionada Convenção, seu enquadramento sindical é como trabalhador rural, e não como empresário ou empregador rural.

Contra-razões são oferecidas pelas autoras (fls. 115-126), que pugnam pela manutenção da sentença.

É o relatório.

VOTO

Satisfeitos os pressupostos legais de admissibilidade, conheço do recurso e das contra-razões.

MÉRITO

Inicialmente destaco que a natureza jurídica da contribuição sindical é tributária, já que se amolda na redação do art. 149 da Constituição Federal, como uma contribuição de interesse das categorias econômicas e profissionais, e na definição contida no art. 3º do Código Tributário Nacional.

É o que extraio da lição do mestre Sérgio Pinto Martins (in "Direito do Trabalho". 20. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 748).

"A atual contribuição sindical é o antigo imposto sindical. Como imposto, tinha natureza tributária, como espécie do gênero tributo.

O Decreto-lei nº 27, de 14-11-66, acrescentou o art. 217 ao Código Tributário Nacional, mudando a nomenclatura do imposto sindical. Este passou a chamar-se contribuição sindical, mas a mudança em sua nomenclatura não mudou sua natureza jurídica de tributo, pois o que importa é seu fato gerador nos termos do art. 4º do CTN.

A natureza jurídica da contribuição sindical é tributária, pois se encaixa na orientação do art. 149 da Constituição, como uma contribuição de interesse das categorias econômicas e profissionais.

A contribuição sindical também se encaixa na definição de tributo contida no art. 3º do CTN. É uma prestação pecuniária, exigida em moeda. É compulsória, pois independe da vontade da pessoa em contribuir. O art. 545 da CLT mostra que o desconto da contribuição sindical pelo empregador independe da vontade do empregado. Não se constitui em sanção de ato ilícito. É instituída por lei (arts. 578 a 610 da CLT) e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada, que é o lançamento, feito pelo fiscal do trabalho (art. 606 e seu §1ºda CLT). Logo, sua natureza é tributária."

Por oportuno, destaco que a atual Constituição Federal, no art. 8º, inciso IV, recepcionou os arts. 578 a 610 da CLT, ao assim estabelecer:

"IV – a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei;"

Veja-se que, na primeira parte do dispositivo recém citado, a nova ordem constitucional estabelece a contribuição confederativa e, na parte final, recepciona a já existente contribuição sindical prevista nos arts. 578 a 610 da CLT.

Assim, o fato de o réu não ser filiado às entidades autoras não o exime da obrigatoriedade de recolher a contribuição sindical, que, como já dito, é devida por todos os integrantes da categoria profissional ou econômica.

Por oportuno, destaco que, em face do parágrafo único do recém citado dispositivo constitucional, este se aplica também aos sindicatos rurais e colônias de pescadores:

"Parágrafo único - As disposições deste artigo aplicam-se à organização de sindicatos rurais e de colônias de pescadores, atendidas as condições que a lei estabelecer." (grifei)

Assim, recepcionado está também o Decreto-Lei nº 1.166/71, que dispõe sobre enquadramento e contribuição sindical rural, pois, como cediço, não necessariamente a Constituição impõe que seja promulgada lei nova a regular a matéria. Se a lei já existente não afronta os princípios constitucionais, ela segue regendo a matéria, sendo recepcionada pela Nova Ordem Constitucional.

Além disso, o fato de a Lei nº 9.701/98 ter dado nova redação ao art. 1º do Decreto-Lei nº 1.166/71 também demonstra, inequivocamente, estar o decreto-lei em pleno vigor, tendo sido recepcionado pela Constituição Federal de 1988.

De outro lado, também não procede a alegação recursal de que a matéria passou a ser regulada exclusivamente pelo Decreto Legislativo nº 0005/93 e Decreto Presidencial nº 1.703/95, através do qual o Congresso Nacional e o Poder Executivo ratificaram a Convenção nº 141 da OIT.

Na verdade não há divergências entre a Convenção nº 141 da OIT e o Decreto-Lei nº 1.166/71.

O critério utilizado pelo decreto-lei para diferenciar o trabalhador rural do empresário ou empregador rural, na hipótese de proprietário de imóvel rural, é o tamanho da propriedade rural.

Com efeito, assim estabelece o art. 1º do Decreto-Lei nº 1.166/71, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 9.701/98:

"Art. 1º Para efeito da cobrança da contribuição sindical rural prevista nos arts. 149 da Constituição Federal e 578 a 591 da Consolidação das Leis do Trabalho, considera-se:

I - trabalhador rural:

a) a pessoa física que presta serviço a empregador rural mediante remuneração de qualquer espécie;

b) quem, proprietário ou não, trabalhe individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido o trabalho dos membros da mesma família, indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração, ainda que com ajuda eventual de terceiros;

II - empresário ou empregador rural:

a) a pessoa física ou jurídica que, tendo empregado, empreende, a qualquer título, atividade econômica rural;

b) quem, proprietário ou não, e mesmo sem empregado, em regime de economia familiar, explore imóvel rural que lhe absorva toda a força de trabalho e lhe garanta a subsistência e progresso social e econômico em área superior a dois módulos rurais da respectiva região;

c) os proprietários de mais de um imóvel rural, desde que a soma de suas áreas seja superior a dois módulos rurais da respectiva região". (grifei)

Portanto, sendo a propriedade rural explorada de área superior a dois módulos rurais da respectiva região, o enquadramento sindical do explorador - proprietário ou não, com ou sem empregado, mesmo que trabalhe em regime de economia familiar - é como empresário ou empregador rural. Fosse o imóvel inferior a dois módulos rurais da região, e seu explorador trabalhasse individualmente ou em regime de economia familiar, aí sim seu enquadramento seria como trabalhador rural, nos termos do inciso I, b, do dispositivo mencionado. Todavia, no caso do réu, o enquadramento se dá pelo inciso II, b, já que o imóvel supera em muito dois módulos rurais da região, como bem demonstrado na sentença.

Tudo isso, entretanto, em nada afronta a Convenção nº 141 da OIT, pois ela em nenhum momento estabelece que deve ser considerado trabalhador rural o proprietário de imóvel rural de qualquer dimensão, desde que trabalhe por conta própria, sem a ajuda de empregados. Ao contrário, ela acolhe como trabalhador rural apenas o pequeno proprietário rural residente e, desde que tenha a agricultura como sua principal fonte de renda e que trabalhe a terra individualmente, ou com a ajuda apenas da família ou, ocasionalmente, de terceiros.

É o que se extrai do texto do art. 2 da mencionada Convenção:

1 - Para fins da presente Convenção, o termo "trabalhadores rurais" significa quaisquer pessoas que se dediquem em aéreas rurais, as atividades agrícolas, artesanais ou outras conexas ou assemelhadas, quer como assalariados, quer como observância do disposto no parágrafo 2 do presente artigo, como pessoas que trabalhem por conta própria, tais como parceiros-cessionários, meeiros e pequenos proprietários residentes.

2 – A presente Convenção aplica-se somente aos parceiros-cessionários, meeiros ou pequenos proprietários residentes, cuja principal fonte de renda seja a agricultura e que trabalhem eles próprios a terra, com ajuda apenas da família ou, ocasionalmente, de terceiros, e que: a) não empreguem mão-de-obra permanentemente, ou b) não empreguem mão-de-obra sazonal numerosa, ou c) não tenham suas terras cultivadas por meeiros ou parceiros-cessionários. (grifei)

Portanto, o Decreto-Lei nº 1.166/71, ao utilizar o critério do tamanho da propriedade rural para distinguir o trabalhador rural do empresário rural, para fins de enquadramento sindical, em nada afronta a Convenção nº 141 da OIT, mas, ao contrário, com ela se compatibiliza totalmente.

No caso dos autos, o réu não pode ser considerado um pequeno proprietário rural. Como bem demonstrado na sentença, a documentação por ele juntada às fls. 81-83 indica que o imóvel rural de sua propriedade tem área de 1.557.026 (um milhão, quinhentos e cinqüenta e sete mil e vinte e seis) metros quadrados, enquanto a dimensão do módulo rural da respectiva região é de 200.000 (duzentos mil) metros quadrados, segundo informação do próprio réu (petição da fl. 80).

Desse modo, na definição do art. 1º, II, b, do Decreto-Lei nº 1.166/71, com a redação dada pela Lei nº 9.701/98, enquadra-se o réu como empresário ou empregador rural, sendo devedor da referida contribuição sindical.

Derradeiramente, observo não ter o réu impugnado os documentos juntados com a inicial, nem refutado a afirmação de que fora informado anteriormente da dívida existente. Os documentos juntados pelos autores, por aplicação analógica do art. 6º do Decreto-Lei nº 1.166/71 - que dispõe sobre enquadramento e contribuição sindical rural - são hábeis como meio de prova da existência da dívida, apresentando inclusive todos os requisitos exigidos por lei, incluindo a identificação do contribuinte e da entidade beneficiária, a base legal para a cobrança da contribuição, a sua forma de cálculo e os valores resultantes.

Por todo exposto, mantenho a bem lançada sentença, que condenou o réu ao pagamento das contribuições sindicais rurais postuladas na peça de ingresso.

Nego provimento ao recurso.

ACORDAM os Juízes da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região, por unanimidade, CONHECER DO RECURSO. No mérito, por igual votação, NEGAR-LHE PROVIMENTO.

Custas na forma da lei.

Intimem-se.

Participaram do julgamento realizado na sessão do dia 17 de outubro de 2006, sob a Presidência do Exmo Juiz Gilmar Cavalheri, as Exmas Juízas Lília Leonor Abreu e Ligia Maria Teixeira Gouvêa. Presente a Exma Dr.a Cinara Graeff Terebinto, Procuradora do Trabalho.

Florianópolis, 30 de outubro de 2006.

GILMAR CAVALHERI
Relator


Boletim Informativo nº 954, semana 30 de abril a 6 de maio de 2007
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

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