Apesar de suas bandeiras, camisetas e bonés - com o mapa do Brasil em verde, dentro de um círculo branco no centro de um pano vermelho - estarem sempre novos em folha, a demonstrar que dinheiro não falta à entidade para sustentar seu marketing, o Movimento dos Sem-Terra (MST) sempre se nutriu de idéias vetustas e de um até ingênuo primitivismo ideológico, bem sintetizado no pensamento de seu guru maior, João Pedro Stédile, expresso no Estado de segunda-feira: “A direita só quer ganhar dinheiro e manter a exploração e para isso se alia e controla qualquer governo, mesmo que seja de um ex-líder operário.”
Reconheça-se, no entanto, o senso de oportunismo desse movimento ilegal, que sempre usou métodos violentos - invasão de fazendas, matança de animais, depredação de sedes, colocação de trabalhadores rurais em cárcere privado, ocupação de estradas, saque e destruição de cabines de pedágio, etc. -, mas, de uns tempos para cá, longe de preocupar-se com reforma agrária, desfralda bandeiras ambientalistas para entrar na grande corrente de combate ao aquecimento global. É dentro dessa nova onda que, aliado à transnacional Via Campesina, o MST planeja intensificar, durante um mês inteiro, seus ataques às grandes empresas do agronegócio, especialmente as transnacionais.
Na verdade, essa programação de ataques intensificados já se iniciou em março no Rio Grande do Sul e no Espírito Santo, onde ativistas emessetistas e campesinistas ocuparam terras de reflorestamento de três empresas do setor de celulose - Aracruz, Votorantim e Stora Enzo -; no Paraná, onde os militantes dessas entidades fizeram protestos diante da Nortox, fabricante de herbicidas; em São Paulo, onde invadiram áreas da Usina Cevasa, produtora de álcool, que teve parte de seu capital vendido há pouco tempo para a Cargill, uma gigante mundial do agronegócio; e no Ceará, onde interditaram a chamada Rodovia do Agronegócio, usada por exportadores de frutas.
No rol de invectivas que essas entidades - que, com boa vontade, podemos chamar de prototerroristas - lançam contra o agronegócio transnacional está que as empresas impõem um modelo de monocultura ao País, com ênfase em produtos de exportação, e que promovem novo processo de concentração de terras, com riscos para a agricultura familiar, causando desemprego e agredindo o meio ambiente, pelo desmatamento e uso abusivo de agrotóxicos. Além disso, elas controlariam a produção de insumos no mundo e imporiam preços aos produtos agrícolas. Sem dúvida, algumas dessas “acusações” poderiam constar do ideário de uma organização não-governamental de cunho ambientalista. Não, porém, com a metodologia operacional do MST e da Via Campesina, que é a vandálica invasão e destruição de equipamentos de laboratório, de sementes, de material de pesquisa científica para aperfeiçoamento genético - às vezes fruto de trabalho de muitos anos - e violências assemelhadas.
A associação cada vez mais sólida entre o MST e a transnacional da depredação - a Via Campesina - parece ter juntado “a fome com a vontade de comer” no campo do primitivismo ideológico. Veja-se, a propósito, as conclusões a que chegaram, em fevereiro, 600 representantes de movimentos rurais de diversas partes do mundo, em reunião na pequena cidade africana de Sélingué, no Mali. Pretendendo defender a “soberania alimentar”, discutiram durante cinco dias e concluíram que devem reforçar a luta contra “o imperialismo, o neoliberalismo, o neocolonialismo e o patriarcado, e todo sistema que empobrece a vida, os recursos, os ecossistemas e os agentes que os promovem, como as instituições financeiras internacionais, a Organização Mundial do Comércio, os acordos de livre-comércio, as corporações transnacionais e os governos que prejudicam seus povos”.
Agora, o que essas entidades não costumam enfatizar é o fato de serem confortavelmente subsidiadas. A transnacional da depredação é sustentada por produtores rurais europeus que não desejam a competição com o agronegócio caboclo. Já a nacional vive dos subsídios do governo - utilizando-os, inclusive, para atacá-lo. Assim é fácil.
Texto publicado no jornal O Estado de S. Paulo de 11 de abril de 2007