“As dificuldades dos produtores rurais foram imensas em 2006 e nada indica que vão cessar este ano.
Estamos vivendo apenas uma pequena pausa no plantio e colheita da safra atual, mas a previsão é que a forma com que o Governo Federal equacionou a solução das dívidas dos produtores não será suficiente. E isso apesar de uma reação dos preços internacionais.
Os produtores rurais paranaenses sofreram no ano passado a terceira seca consecutiva, com quebras significativas de suas safras.
Essa seca apenas veio agravar uma situação que havia se instalado entre nós no segundo semestre de 2004 com a desvalorização do dólar, fator este que deprime os preços de nossos produtos, gerando prejuízos cumulativos.
A FAEP vem insistindo desde 2005 em diversos fóruns – no Governo Federal, junto ao Congresso Nacional - que a profundidade da crise é tão grande, que apenas um alongamento da dívida por vários anos tornaria possível o seu pagamento, e ainda desde que o governo mudasse a sua política cambial.
O Governo Federal de fato alongou a dívida, mas por um prazo inadequado para a sua gravidade e não deu solução para a crise cambial.Q
Isto quer dizer que, no final deste ano, poderemos assistir à volta da inadimplência, forçada pela falta de renda suficiente para arcar com as prestações postergadas.
A prova das dificuldades é facilmente apurada, bastando verificar que o crédito rural disponível para custeio não foi totalmente contratado, porque um grande número de produtores rurais já havia estourado os seus limites de crédito, em razão do montante dos alongamentos.
O esforço para dar uma solução para o endividamento rural - sobre o qual o produtor não tem nenhuma responsabilidade, já que é a vítima - gerou um movimento nacional de grandes proporções, que desembocou em manifestações gigantescas dia 16 de maio, especialmente no Paraná.
Os nossos sindicatos rurais deram uma exemplar demonstração de capacidade de mobilização ao deflagrarem protestos que reuniram mais de 100 mil produtores rurais em todo o Estado, para conscientizar a sociedade e pressionar o Governo Federal por uma solução para a crise.
Contudo, a crise teria um outro componente extremamente gravoso: a decretação de focos de febre aftosa na região noroeste em outubro de 2005, mas cujos efeitos repercutem até agora e provavelmente por um longo tempo, ainda.
Desde o início do aparecimento dos focos de aftosa no Mato Grosso do Sul, em áreas próximas à nossa divisa, o Governo do Paraná agiu de forma atabalhoada, gerando confusão e retardando uma solução como exigem as normas da Organização Mundial de Saúde Animal - OIE.
Adiando o sacrifício sanitário de animais nas áreas decretadas, o Governo do Estado apenas aumentou o prejuízo dos pecuaristas e das indústrias, com a perda de mercados internos e externos.
Toda a economia do interior do estado sentiu no bolso a forma inepta como se conduziu a crise da aftosa no Paraná, dada a natural repercussão que tem a economia agropecuária nos demais setores da sociedade.
Os grandes problemas que enfrentamos não foram apenas as secas e as doenças, mas também políticas erradas de nossos governos.
O federal com a insistência em deixar o barco correr em relação ao câmbio, sem dar importância se nossa moeda apreciada estava derrubando os preços do campo e criando uma situação insustentável para os produtores rurais.
Ou, ainda, cortando recursos destinados à defesa sanitária animal e vegetal, apesar das exportações de produtos do agronegócio, especialmente carnes, renderem mais de 40 bilhões de dólares ao ano na nossa balança comercial e, pelo saldo positivo, darem sustentação a nossa economia.
E mais. Ao invés de adotar uma ação prática e objetiva nas autorizações para pesquisa de organismos geneticamente modificados, através da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - a Ctnbio, se rende a questiúnculas políticas internas e, para agradar a esse ou a aquele companheiro, cria os embaraços que atrasam o desenvolvimento tecnológico de nosso país.
Aliás, esse tipo de comportamento chegou ao apogeu em nosso Estado.
Aqui, o Governo do Estado chegou ao cúmulo de proibir o plantio de soja transgênica, mesmo com uma legislação federal permitindo. Trata os transgênicos como se fosse um produto demoníaco, como faziam os supersticiosos da Idade Média.
Não satisfeito com decisão da justiça liberando o plantio, em mandado de segurança ganho pela FAEP, tentou atrapalhar a colheita com a proibição do uso do glifosato pós-emergente – como manda a tecnologia da soja RR.
Novamente a FAEP entrou com mandado de segurança para assegurar um direito dos produtores rurais.
Embora duas vezes derrotado, o Governo do Estado continuou insistindo em sua incompreensível cruzada contra os transgênicos, impedindo o embarque de soja pelo porto de Paranaguá e, com isso, aumentando o custo do transporte para outros portos e, como conseqüência, reduzindo o preço pago ao produtor e aumentando o seu prejuízo.
Novamente a FAEP foi à Justiça e, por questões de fórum, repassou a sua tese jurídica para a Associação Brasileira de Terminais Portuários, que finalmente obteve o mandado de segurança. O porto de Paranaguá, não sem espernear antes, foi obrigado a ceder e permitir o embarque de soja transgênica.
Só que essa inexplicável ojeriza do Governo do Estado aos transgênicos se estende a outros episódios. Basta lembrar a invasão e depredação provocada pelos “ sem terra” numa fazenda experimental da Monsanto em Ponta Grossa, que fez com que essa empresa saísse do Paraná.
Ainda recentemente, a Via Campesina invadiu uma outra fazenda experimental ao lado do Parque Nacional e destruiu anos e anos de pesquisa sob o olhar complacente do Governo do Estado, que nenhum esforço fez para garantir a reintegração de posse ganha pela Syngenta, outra empresa de pesquisa.
Não satisfeito em descumprir a lei – já que é o Estado o responsável por garantir a reintegração de posse – o Governo do Estado resolveu desapropriar a fazenda da Syngenta.
Ao invés de um campo de pesquisa de sementes mais produtivas, de maior interesse para o desenvolvimento da agricultura, o Governo vai usar a fazenda para preservar sementes “criolas”, como se para isso já não tivessem campos experimentais do IAPAR, praticamente abandonados por falta de apoio oficial.
Difícil fazer agricultura num Estado como este !
ara agravar ainda mais a situação, o Governo do Estado encampa uma postura equivocada do Governo Federal, embora se saiba muito bem que tem lá os seus interesses políticos: a da agricultura familiar em contraposição à agricultura comercial.
A agropecuária no Paraná, no Brasil, no mundo é tocada por famílias, portanto o setor é tipicamente familiar.
E são famílias, na sua maciça maioria, que produzem soja, milho, algodão, café, boi, frango, suíno, laranja e o que mais pensar, para atender o mercado interno e internacional.
Essa divisão entre agricultura familiar versus agricultura comercial é falsa e a grande prova disso são os próprios companheiros dirigentes de sindicatos. Não há entre nós agropecuárias no sentido de uma empresa registrada na Junta Comercial, tocada por um Conselho de Administração e executivos contratados.
São as nossas famílias que cuidam de nossos negócios, mesmo que haja empregados.
Como estão conscientes desse equívoco, mas têm interesse que a divisão prevaleça, passaram uma régua e estabeleceram que são familiares aquelas propriedades até 4 módulos fiscais. Se tiver quatro módulos e um pouquinho já é comercial, como se isso fizesse a diferença.
Não existem duas agriculturas no Brasil, apenas uma só, já que o milho produzido numa pequena propriedade é o igual o da grande. O que muda é o grau tecnológico e este, sim, faz a diferença para identificar dois tipos de agricultores: o voltado para o mercado, independentemente da sua natureza jurídica ou do seu tamanho em módulos fiscais ou rurais, e o de subsistência, de baixa tecnologia e pouca inserção no mercado.
Mas por conta dessa divisão, da reforma agrária e do perpétuo apoio financeiro aos assentamentos e ao movimento dos “sem terra”, o Governo Federal está carreando cada vez mais recursos para os pequenos produtores de pouca tecnologia, para os assentados de tecnologia nenhuma e para sustentar a baderna do MST.
E cada vez menos para os outros, os aptos a usar mais tecnologia e que realmente abastecem o mercado e as exportações. Àqueles que geram empregos, renda e resultados na balança comercial.
Vamos ter que conviver com isso por mais um tempo. Paciência!
Só que isso pode ter outras conseqüências para o nosso sistema sindical, como tive oportunidade de alertar nas reuniões do Fórum Regional de Desenvolvimento Sindical, realizado em novembro e dezembro do ano passado.
O Presidente da República sancionou em julho do ano passado a lei 11.326 estabelecendo diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais, pela qual considera agricultor familiar aquele com 4 módulos fiscais, algo em torno de 80 hectares.
Essa lei é meio caminho andado para a criação do sistema sindical da Agricultura Familiar que fatalmente vai engolir quase todo o sistema da Contag/Fetaep e nos tirar mais de 16 mil dos 78 mil filiados de acordo com o decreto lei 1166.
Isso e mais a reforma sindical que pode criar sérios problemas à nossa sobrevivência, como já tive a oportunidade de explicar.
Por tudo isso é que realizamos o Fórum Regional do Desenvolvimento Sindical e estamos montando os encontros de lideranças dos sindicatos rurais para aprimorar a nossa gestão, conquistar associados e permitir que nossos dirigentes confirmem e desempenhem o papel de liderança em suas comunidades.
Sobre esse assunto, volto a insistir que o perigo existe, é real e se quisermos manter o nosso sistema de pé, com vitalidade, vamos ter que nos aplicar. E muito.
Por essa razão, insisto no convite para que os dirigentes sindicais participem dos encontros que estão sendo programados. Vai ser extremamente útil não apenas para a sobrevivência e fortalecimento do sindicato, mas para cada um de nós, individualmente. E para a nossa ação na comunidade.
Pelo que é possível avaliar, as perspectivas para este e para os próximos anos não são das melhores.
O Governo Federal continuará mantendo a sua política econômica praticamente na íntegra. Se por um lado é bom, porque garante contratos, não haverá inflação, não seremos sacudidos por surpresas, por outro lado significa que os recursos de financiamento continuarão os mesmos e, pior, a política cambial não sofrerá mudanças.
O que pode minorar os efeitos do câmbio, serão ocorrências de preços altos no mercado internacional para esse ou aquele produto, em razão de escassez ou de eventual aumento mais que proporcional da demanda.
Quanto ao Estado, o que se afigura é uma repetição do que já conhecemos:
Tem que haver, sim, apoio aos pequenos produtores para que eles possam utilizar tecnologias novas e mais produtivas e se livrarem da pobreza.
Mas nunca esquecer ou, o que é pior, afrontar os que criam riquezas.
Mas até é possível produzir sem ajuda do Governo do Estado, desde que ele não atrapalhe e cumpra a lei quando for exigido, como nos casos de reintegração de posse e no combate aos atos de violência do MST.
Na verdade a política agrícola depende realmente é de decisões federais.
Apenas um ponto não podemos transigir em relação ao Governo do Estado. Ele vai ter que recuperar o sistema de defesa sanitária animal e vegetal, sem o qual não sairemos da crise da pecuária e não poderemos avançar na reconquista dos mercados perdidos pela febre aftosa.
Paralelamente, vamos buscar fortalecer o sistema privado formado pelos Conselhos de Sanidade Municipais e Intermunicipais, que dependem de nós .
E vamos, na medida do possível, trabalhar para melhorar a produção, seja através do SENAR de programas especiais voltados para aquelas propriedades que perderam ou vão perder escala de produção e que, por isso mesmo, estão fadadas a desaparecer se nada for feito.
O importante é manter o sistema sindical unido e atuante. Essa é a arma que dispomos e com essa arma vamos enfrentar os desafios que vierem a ser colocados em nosso caminho, sejam eles de que natureza forem.
Os companheiros já nos conhecem de longa data e sabem que na oportunidade do diálogo, sabemos dialogar, mas na hora do confronto também sabemos lutar.
O sistema sindical rural já deu inúmeras provas dessa sua coragem e dessa sua determinação. O 16 de Maio está ai como um magnífico exemplo.
Por tudo isso, pelas lutas que vencemos , pela justeza de nossas causas, nunca se abatam ante uma dificuldade.
Elas existem para comprovar nossa inteligência, a nossa determinação e o nosso valor.
Muito obrigado.
Ágide Meneguette
Presidente do Sistema FAEP"