Crédito: Medidas de apoio saem tardiamente e crise se agrava

Após admitir a crise vivida pelo setor rural, o Executivo processou de forma tardia e lerda a renegociação das dívidas recentes dos produtores. De concreto, resultou apenas a certeza de nova crise de liquidez na atividade, prevista para março e abril de 2007. Se tudo correr certo com o câmbio, clima e controle de pragas e doenças, as receitas obtidas com a comercialização da safra ainda serão insuficientes para o pagamento dos compromissos referente às safras passadas, avaliados hoje em R$ 20 bilhões.

O Banco do Brasil conseguiu regularizar quase toda a renegociação da safra 2005/2006, reabrindo mais 330 mil contratos e ajustando novo fluxo de pagamento de quase R$ 6 bilhões. Assim, a venda dos produtos colhidos em 2007 terá que ser suficiente para pagar o custeio da safra em curso, a parcela das dívidas de custeio e de investimentos alongadas em 2006. Em muitos casos, soma-se ainda parte dos custeios de 2005 não pagos em razão da crise. Há, também, algumas exceções, em que as parcelas da securitização e do PESA vincendo no próximo ano se agregam aos demais débitos. É preciso considerar que, frustrada a implementação do FAT Giro Rural, ainda há considerável estoque de dívidas com o setor privado, renegociado para pagamento na próxima safra, em espécie ou em produto.

A lentidão no processo de renegociação afetou o desempenho da concessão e liberação de crédito para a safra 2006/07. Segundo informações do Ministério da Agricultura, houve brutal e justificada queda, na ordem de 40%, na contratação de créditos de investimento com recursos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). De julho a setembro do ano passado, foram contratados R$ 758 milhões, para uma programação anual de R$ 8,5 bilhões, em 2006. No mesmo período, aplicou-se apenas R$ 455 milhões, para uma programação, de julho de 2006 a junho de 2007, prevista para R$ 6,1 bilhões.

Nas operações de custeio, as informações do MAPA revelam crescimento de 23%, se comparados a iguais períodos de 2005 e 2006. Neste ano, foram contratados R$ 6,8 bilhões, com recursos controlados de 8,75% ao ano, contra R$ 5,8 bilhões, no período julho a setembro de 2005. Acredita-se que esta performance ocorra devido à prática de muitas operações mata-mata para disfarçar negociações inconclusas, que abrem nova operação de financiamento para pagamento de parcelas já vencidas. No passado, este tipo de operação foi um dos responsáveis pela matriz do endividamento do setor.

Outro fator que contribuiu para a morosidade na liberação do crédito foi a vinculação da concessão de custeio à contratação de seguro rural. Essa exigência gerou justificado descontentamento entre os produtores, na medida em que não atende às necessidades das regiões. Simples análise das apólices permite observar que, para disparar a cobertura do seguro, é exigida comprovação de queda de produção motivada por fatores climáticos acima de 50% da média histórica obtida pelo produtor. Assim, a proteção do seguro somente ocorreria num quadro de probabilidade de ocorrência extremamente remota, beneficiando exclusivamente as seguradoras.

Para encerrar o ano, o anúncio de refinanciamento das parcelas de securitização e do PESA, vencidas e vincendas em 2005 e 2006, foi frustrada pela publicação da Medida Provisória nº 317. Como era de se esperar, as instituições financeiras foram relutantes em refinanciar uma dívida já renegociada, cujo risco passa a ser seu. Assim, os benefícios da MP ficaram restritos à prorrogação da data de pagamento das parcelas de securitização para até 29 de dezembro de 2006, com direito a bônus e sem incidência da correção do preço mínimo, ainda limitado apenas às operações celebradas com os bancos oficiais federais.

Os efeitos da MP também se restringiram, mesmo no caso de bancos oficiais federais, a dívidas não transferidas ao Tesouro Nacional por força da Medida Provisória nº 2.196. É o caso também das operações de PESA contratadas após a edição MP nº 317, que não serão contempladas com a redução de valor provenientes de bônus e dispensa de multas.

Este entendimento restritivo foi introduzido pela Resolução Bacen nº 3.418, de 3 de novembro deste ano. A inocuidade da MP 317 e os conflitos causados pela Resolução nº 3.418 geraram equívocos na interpretação das normas, confundindo os agentes financeiros e provocando insegurança entre os produtores. Ao procurarem os agentes financeiros privados e para manifestar interesse em prorrogar e/ou refinanciar seus contratos, os agricultores recebem como resposta a informação de que poderão realizar os pagamentos até 29 de dezembro. Mas o pagamento será no valor da parcela cheia dos financiamentos, isto é, sem bônus e com correção plena, o que eleva o valor da parcela em cerca de 70%.

O endividamento do setor rural está longe de ser solucionado, uma vez que as medidas adotadas abrangem períodos de crise e surtem efeito no curto prazo. Para reverter esse quadro, seriam necessárias medidas estruturantes, além de uma política agrícola que amenize as oscilações de renda do setor. Enquanto isto não acontecer, a cada safra, estaremos dando sempre dois passos à frente e um atrás.

Grãos: Produção cresce, mas
faturamento bruto do produtor caiu

A produção brasileira de grãos cresceu 5,3% em 2006, atingindo a marca dos 119,9 milhões de toneladas. Apesar da redução da área plantada em 3,7%, a regularidade climática na maioria das regiões produtoras garantiu o bom desempenho das lavouras, resultando em boa produtividade. a

Os resultados positivos na região sul do País, cuja produção é estimada em 51 milhões de toneladas, 27% superior à safra passada, puxaram para cima a produção brasileira de grãos. Esse incremento decorre da regularidade climática e o elevado percentual de crescimento é explicado pela baixa produtividade obtida nas duas safras anteriores. !

Nas demais regiões, a exceção do Nordeste, o clima ajudou, mas o impacto da redução de área plantada foi mais forte, contribuindo para a queda da produção.

No Centro-Oeste, a produção foi 6% menor, chegando a 40 milhões de toneladas. Os custos ainda elevados na safra 2005/2006 e as restrições creditícias, agravados pelas dificuldades logísticas da região, impactaram na redução de 1,3 milhão de hectares de área plantada. Este quadro, somado às perdas climáticas localizadas e a incidência da ferrugem asiática nas lavouras de soja, resultaram na produção de 39,6 milhões de toneladas, contra 41,2 milhões de toneladas produzidas na safra anterior.

Mesmo com boa safra, foi um ano difícil. Para a maioria dos produtos, houve reação dos preços no mercado somente no segundo semestre. O faturamento bruto da produção de cereais, fibras e oleaginosas caiu para R$ 46,2 bilhões, cerca de 14,76% menor que em 2005, quando atingiu R$ 54,2 bilhões.

A rentabilidade das lavouras não remunerou a atividade e os produtores acumularam, além da perda de renda, uma dívida de longo prazo. Somando-se o crédito rural oficial e o financiamento privado, o endividamento está avaliado em R$ 20 bilhões, resultado da queda dos preços no mercado internacional e do câmbio valorizado nos últimos dois anos.

Boletim Informativo nº 940 , semana de 18 a 24 de dezembro de 2006
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná
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