PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DO PARANÁ

RECURSO ORDINÁRIO Nº 79013-2005-091-09-00-7 (RCCS)
RECORRENTES :
CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA AGRICULTURA – CNA e FEDERAÇÃO DA AGRICULTURA DO ESTADO DO PARANÁ - FAEP
RECORRIDO :
J. C. N.
RELATOR :
BENEDITO XAVIER DA SILVA

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de RECURSO EM AÇÃO DE COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO SINDICAL, provenientes da MM Vara do Trabalho de CAMPO MOURÃO – PR, tendo como recorrentes CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA AGRICULTURA e FEDERAÇÃO DA AGRICULTURA DO ESTADO DO PARANÁ e como recorrido J.C.N.

I – RELATÓRIO

Inconformadas com a sentença (fls. 196/199), prolatada pelo Exmo. Juiz Jorge Luiz Soares de Paula, que julgou procedentes em parte as pretensões formuladas na ação, recorrem as autoras (1ª e 2ª) a este Tribunal, pleiteando a reforma no tocante à multa prevista no art. 600 da CLT, pelo atraso no pagamento da contribuição sindical, sob o argumento de que o referido artigo ainda continua em vigência.

Contra-razões apresentadas.

Custas atribuídas ao réu.

II – FUNDAMENTAÇÃO

1. Admissibilidade

Conheço do recurso ordinário e das contra-razões, vez que presentes os pressupostos legais.

2. Mérito

Multa do art. 600 da CLT

O Juízo de primeiro grau, na sentença, julgou parcialmente procedente a pretensão das autoras, relativamente à cobrança de contribuição sindical. Ou seja, julgou indevida a multa prevista no art. 600 da CLT, pelo atraso no referido pagamento, pois entendeu que o referido dispositivo foi revogado tacitamente pela Lei 8.022/90.

"Observa-se incorreção no tocante à multa aplicada, tendo em vista a inaplicabilidade do art. 600 da CLT pois revogada tacitamente pela Lei 8.022/90. Vale ressaltar que a Lei 8847/94, embora tenha modificado a competência para cobrança da contribuição, atribuindo-a à Confederação Nacional da Agricultura, nada disse acerca das penalidades aplicadas quando do atraso no pagamento, pelo que entende-se vigente o art. 2º da Lei 8.022/90. Não desconhece este Juízo a corrente doutrinária que opina pela vigência do art. 600 da CLT, ante a revogação da Lei 8.022/90 pela Lei 8.847/94, todavia, deixa de adotá-lo por entender que lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência (art. 2º, § 3º da Lei de Introdução ao Código Civil)". (fl. 198)

As autoras recorrem, a fim de que seja deferida a multa prevista no art. 600 da CLT, sob o argumento de que o mesmo ainda continua em vigência.
Com razão.
O art. 600, caput, da CLT dispõe:

"Art. 600. O recolhimento da contribuição sindical efetuado fora do prazo referido neste Capítulo, quando espontâneo, será acrescido da multa de 10% (dez por cento), nos 30(trinta) primeiros dias, com o adicional de 2% (dois por cento) por mês subseqüentes de atraso, além de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês e correção monetária, ficando, nesse caso, o infrator, isento de outra penalidade. (redação dada pela Lei nº 6.181, de 11.12.1974)

A Lei 8.022, de 12 de abril de 1990, no artigo 1º, caput, transferiu para a Receita Federal a competência de administração de receitas arrecadas pelo INCRA, sem alterar o disposto no art. 600 da CLT.

"Art. 1º É transferida para a Secretaria da Receita Federal a competência de administração das receitas arrecadadas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, e para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a competência para a apuração, inscrição e cobrança da respectiva dívida ativa."

Estabeleceu ainda:

"Art. 2º As receitas de que trata o art. 1º desta lei, quando não recolhidas nos prazos fixados, serão atualizadas monetariamente, na data do efetivo pagamento, nos termos do art. 61 da Lei nº 7.799, de 10 de julho de 1989, e cobradas pela União com os seguintes acréscimos: (destaquei)
I – juros de mora, na via administrativa ou judicial, contados do mês seguintes ao do vencimento, à razão de 1% (um por cento) ao mês e calculados sobre o valor atualizado, monetariamente, na forma da legislação em vigor;
II – multa de mora de 20% (vinte por cento) sobre o valor atualizado, monetariamente, sendo reduzido a 10% (dez por cento) se o pagamento for efetuado até o último dia útil do mês subseqüente àquele em que deveria ter sido pago;
III – encargo legal de cobrança da Dívida Ativa de que trata o art. 1º do Decreto-Lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969, e o art. 3º do Decreto-Lei nº 1.645, de 11 de dezembro de 1978, quando for o caso.
Parágrafo único: Os juros de mora não incidem sobre o valor da multa de mora.

A Lei 7.799/89 alterou apenas a legislação tributária federal (débitos para com a Fazenda Nacional), estabelecendo no artigo 61, caput: "os débitos de qualquer natureza para com a Fazenda Nacional e os decorrentes de contribuições arrecadadas pela União, quando não pagos até a data do seu vencimento serão atualizados monetariamente, a partir de 1º de julho de 1989, na forma deste artigo".
Por sua vez, a Lei 8.847, 28 de janeiro de 1994, atribuiu à Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) as receitas que especifica, dentre elas, a que se refere o art. 600, da CLT:
"Art. 24. A competência de administração das seguintes receitas, atualmente arrecadadas pela Secretaria da Receita Federal por força do art. 1º da Lei 8.022, de 12 de abril de 1990, cessará em 31 de dezembro de 1996:
I – Contribuição Sindical Rural, devida à Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), de acordo com o art. 4º do Decreto-Lei nº 1.166, de 15 abril de 1971, e art. 580 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT);
II – Contribuição ao Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), prevista no item VII do art. 3º da Lei nº 8.315, de 23 de dezembro de 1991." (grifei)

O art. 2º da Lei de Introdução ao Código Civil (DL 4.657/42) dispõe:

"§1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.
§ 2º A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.
§ 3º Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência."

MARIA HELENA DINIZ anota que a revogação tácita ocorre "quando houver incompatibilidade entre a lei nova e a antiga, pelo fato de que a nova passa a regular parcial ou inteiramente a matéria tratada pela anterior".1 
Para que se verifique a revogação, a incompatibilidade não pode ser duvidosa.
A manutenção da contribuição sindical, encontra-se autorizada, sem qualquer alteração de seu conteúdo e sanções. Em outras palavras: a norma celetária foi recepcionada pela atual Constituição Federal, conforme insculpido no seu artigo 149, caput: "Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou economicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, par. 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo."
As chamadas contribuições sociais de interesse de categorias profissionais, na observação de HUGO BRITO MACHADO, têm natureza para fiscal:

"
As contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas, bem como as contribuições de seguridade social, ostentam nítida função parafiscal. Destinam-se a suprir de recursos financeiros entidades do Poder Público com atribuições específicas, desvinculadas do Tesouro Nacional, no sentido de que dispõem de orçamento próprio.
As contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas devem constituir receita nos orçamentos das entidades representativas dessas categorias, quanto contribuições de seguridade social constituem receita no orçamento da seguridade de que o art. 165, § 3º, da Constituição. São, portanto, nitidamente parafiscais".

Continua o mesmo autor:

"A contribuição social caracteriza-se como de interesse de categoria profissional ou econômica quando destinada a propiciar a organização dessa categoria, fornecendo recursos financeiros para a manutenção de entidade associativa.
Não se trata, é bom insistir neste ponto, de destinação de recursos arrecadados. Trata-se de vinculação da própria entidade representativa da categoria profissional, ou econômica, com o contribuinte. O sujeito ativo da relação tributária, no caso, há de ser a mencionada entidade.
A esta conclusão se chega através da interpretação do artigo 149, combinado com o art.8º, inciso IV, da vigente Constituição. Realmente, este último dispositivo estabelece que a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei. A contribuição prevista em lei, no caso, é precisamente a contribuição social a que se refere o art. 149, restando claro, portanto, que a ressalva está a indicar a entidade representativa da categoria profissional, ou econômica, como credora das duas contribuições. Uma, a contribuição fixada pela assembléia geral, de natureza não tributária. A outra, prevista em lei, com fundamento no art. 149 da Constituição, é a espécie de contribuição social de que se cuida.
Há quem sustente que a contribuição referida no art. 8º, inciso IV, da Constituição Federal é uma espécie de tributo, em relação à qual não se aplica o princípio da legalidade. Não nos parece que seja assim. Preferimos entender que se trata de contribuição de natureza não tributária, em tudo idêntica à contribuição cobrada por qualquer associação civil".2 
Por último, é de se acrescentar ainda:

A competência e a legitimidade conferida à Fazenda Nacional pela Lei 8.022/90, para a arrecadação da contribuição sindical, não tem o condão de transmudar a sua natureza de contribuição social para imposto em sentido restrito.
Cada espécie de tributo e de contribuição social regem-se por normas autônomas. Assim, a norma que estabelece competência e legitimidade à Fazenda Nacional para arrecadar, além de seus tributos, a contribuição sindical, com relação a estas, dado a sua natureza secundária, instrumental e operacional, não afeta e nem altera as normas autônomas(primárias) de cada ramo do sistema legislativo estruturante (princípios da racionalidade e especialidades das leis).
Desta forma, a norma especial não pode ser revogada por lei de outro mecanismo, que não se afigura compatível quanto ao destino das respectivas arrecadações. Seria, a meu juízo, um equívoco dar às normas especiais e comuns a mesma exegese, alcance e aplicabilidade, quando possuem métodos, princípios e finalidades diversas.
Esta, a meu ver, é a logicidade do nosso sistema jurídico. Isto vale dizer, que o primado de cada ramo do Direito lhe garante a sua coerência. Registre-se que o sistema da comunicação das normas se restringe ao conteúdo e à natureza dos direitos e deveres nelas encerrados, o que por óbvio, afasta a pretensa e ilimitada extensão e força revogatória da Lei 8.022/1990.
Por conseguinte, o princípio "lex posterior derogat priori" aplica-se tão-somente quando se tratar de normas da mesma categoria, sob pena de não se preservar o sentido, a unidade e a finalidade do sistema jurídico nos seus mais diversos seguimentos.

Extrai-se
, portanto, que não houve revogação do art. 600 da CLT, já que a contribuição sindical no se insere no conceito de tributo federal devido à Fazenda Nacional.

Do exposto, pode-se concluir o seguinte:
a) A contribuição sindical é parafiscal e não tem como destinatário o Estado. Tem por objetivo atender as finalidades das entidades a que se destina. É uma intervenção do Estado no domínio econômico em favor de entidades criadas com objetivos sociais.
b) Fica fora do alcance da Lei 8.022/90 a contribuição sindical, quanto às penalidades referidas no seu artigo 2º, dada a sua natureza de contribuição parafiscal.
c) A Lei 8.022/90 aplica-se apenas quanto à transferência da atribuição para arrecadar.
d) A contribuição sindical, em razão de sua finalidade, não pode receber o mesmo tratamento dado aos tributos e as contribuições sociais destinadas aos entes públicos, que prestam serviços públicos. No caso, as entidades sindicais prestam serviços às respectivas categorias profissionais.
e) Portanto, o art. 600 da CLT, como norma especial, não se encontra em desconformidade com os princípios e regras que regem o sistema e nem revogada por norma tributária propriamente dita.

Destarte, o não-recolhimento da contribuição sindical enseja o acréscimo da multa de 10%, nos trinta primeiros dias, com o adicional de 2% ao mês de atraso, além de juros de mora de 1% ao mês e correção monetária, segundo o disposto no art. 600, caput, da CLT.

Nesse sentido é a jurisprudência:

"RECURSO ESPECIAL. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL PATRONAL. LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA. ENCARGOS DE INADIMPLEMENTO E MORA. COBRANÇA NA FORMA PREVISTA NO ART. 600 DA CLT. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A contribuição sindical rural, criada inicialmente com o título de imposto (Lei 4.212/63, art. 135), teve seu enquadramento regulado pelo Decreto-Lei 1.166/71. 2. As alterações concernentes à competência para a adminstração e arrecadação da contribuição em comento, promovidas pela Lei 8.022/90 (art. 1º), Lei 8.847/94 (art. 24,II) e Lei 9.393/96 (art. 10), não tiveram o condão de afastar a forma de cobrança dos encargos de mora, nos termos previstos no Decreto-Lei 1.166/71 (art. 9º). 3. O não-recolhimento da contribuição sindical rural no vencimento acarreta o acréscimo de multa de 10% sobre o valor devido, nos trinta primeiro dias, com o adicional de 2% ao mês, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, bem como de correção monetária, segundo a dicção do art. 600 da CLT. 4. Recurso especial provido." (Resp 705879 / PR; RECURSO ESPECIAL 2004/0167149-0. Relator(a) Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI (1124) Relator(a) p/ Acórdão Ministra DENISE ARRUDA (1126) Órgão Julgador T1 – PRIMEIRA TURMA Data do Julgamento 19/04/2005 Data da Publicação/Fonte DJ 08.08.2005 p. 198)

Reformo para acrescer à condenação a multa prevista no art. 600 da CLT, pelo atraso no pagamento da contribuição sindical.

Isto posto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO DAS AUTORAS para acrescer à condenaçãoa multa prevista no art. 600 da CLT, pelo atraso no pagamento da contribuição sindical.

III - CONCLUSÃO

Pelo que,

ACORDAM os Juízes da Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, por unanimidade de votos, EM CONHECER DO RECURSO ORDINÁRIO DAS AUTORAS (1ª e 2ª) e das contra-razões. No mérito, sem divergência de votos, EM DAR-LHE PROVIMENTO para, nos termos da fundamentação, acrescer à contribuição a multa prevista no art. 600 da CLT, pelo atraso no pagamento da contribuição sindical.

Custas acrescidas, sobre o valor provisoriamente arbitrado à condenação de R$ 1.000,00, no importe de R$20,00.

Intimem-se

Curitiba, 03 de outubro de 2006

BENEDITO XAVIER SILVA
Relator

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1 In, Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro interpretada, 10ª ed. Saraiva/2004, p. 69.
2 In, Curso de Direito Tributário, 24ª ed. Malheiros Editores/2004, p.389/390 e 392/393.


Boletim Informativo nº 935, semana de 13 a 19 de novembro de 2006
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

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