Usucapião e posse rural

A propriedade de um bem imóvel ou móvel nem sempre é adquirida através de simples compra e venda. Existem várias outras formas de obtenção do domínio sobre a coisa, desde a transmissão sucessória até doação, dação em pagamento, permuta e outros. Uma das maneiras de alguém adquirir o domínio e propriedade de um imóvel, por exemplo, pode dar-se perfeitamente através do usucapião. Esse tipo de aquisição da propriedade decorre do simples exercício possessório sobre a coisa, isto é, do fato do possuidor encontrar-se no uso dela, embora se ache o bem registrado em nome de outrem que é o proprietário. No capítulo possessório a propriedade do senhor da coisa pode ser afastada e tornada sem efeito ante o exercício da posse, desde que essa preencha alguns requisitos exigidos na lei civil. Trata-se de instituto muito antigo, revelador da força da posse, dependendo sempre da qualidade do seu exercício. Em outras palavras, o possuidor que reúne os elementos necessários à declaração judicial do usucapião pode quebrantar a força do direito dominial, representado pela propriedade. Nesse momento o direito real de propriedade cede espaço ao direito de posse, ensejando o nascimento de um novo proprietário ao tornar sem efeito a qualidade do proprietário anterior. Há verdadeira transmudação da posse em propriedade, com afastamento e desaparecimento da propriedade anterior ligada ao antigo titular. Porém, insista-se, para que isso aconteça é necessário que o proprietário tenha abandonado o seu domínio, enquanto que o possuidor passou, ao longo de certo tempo, exercitando a posse que ao final adquiriu a força de direito capaz de gerar usucapião.

A posse capaz de quebrantar a propriedade é aquela exercida sem interrupção, nem oposição, isto é, mansa e pacífica, em que o titular do direito dominial não se insurgiu contra ela, deixando correr o prazo em favor do possuidor. Os prazos variam na lei civil, conforme a natureza da posse exercida. O período de posse mais largo é de quinze anos, que é encurtado para dez anos, acaso o possuidor "houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo". Porém, neste tipo de procedimento, inexiste limite de área instituído na lei. Envolve áreas urbanas e rurais sem limite de extensão. Também, não se cogita nessa espécie de título e boa-fé.

Outra espécie de usucapião, a qual se diferencia da geral no tocante a área máxima e ao prazo, é o rural. Deverá exercitar a posse por mais de cinco anos e o alcance máximo de área limita-se a cinqüenta hectares. Basta, nessa situação ao possuidor que não seja proprietário de imóvel rural ou urbano, e possua como sua, "por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade".

Por essas razões deve o proprietário de imóvel formalizar sempre as cessões de posses, estabelecendo expressamente os contratos agrários existentes, previstos nas várias legislações. Se ocorrer, por exemplo, empréstimo de área, que seja efetivado o contrato de comodato, instrumentalizando-o, conforme a norma legal. Vale para outras situações contratuais específicas como o arrendamento rural e a parceria, ou ainda, qualquer outro tipo de relação contratual, ainda que inominada. O que o proprietário necessita sempre, ao ceder a posse e fruição da coisa, permanecer com a posse indireta em seu favor, embora a direta não seja mais exercitada por ele, porque nesse caso estará imune ao usucapião. A formalização do ato de vontade unilateral ou contratual é garantia a ser assegurada para as partes envolvidas, evitando dissabores futuros.


Boletim Informativo nº 932, semana de 16 a 22 de outubro de 2006
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

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