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PODER JUDICIÁRIO |
RECURSO ORDINÁRIO 02572-2005-038-15-00-7 RO RECORRENTE : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA AGRICULTURA - CNA RECORRIDA : L. A. de S. RELATOR : Juiz LUIZ CARLOS DE ARAÚJO |
EMENTA: A conclusão a que se chega é que a contribuição sindical rural tem natureza de contribuição social, prevista no artigo 149 da Constituição Federal, enquanto que o imposto territorial rural constitui verdadeiro imposto, com a finalidade de "desestimular a manutenção de propriedades improdutivas". Em virtude de tais distinções, entendo que não se verifica o efeito da bitributação, apontado na r. sentença, uma vez que esta somente ocorre entre dois impostos e não impostos e contribuições sociais. Não é demais observar, ainda, que a vedação prevista no artigo 153, inciso VI combinada com o artigo 154, inciso I, ambos da Constituição Federal, se refere exclusivamente à instituição de novos IMPOSTOS, ou seja, a instituição de fontes novas de custeio que não a já prevista no artigo 153, inciso VI, não vedando, porém, a criação de uma contribuição social já prevista no texto constitucional, como no caso a contribuição sindical rural, que tem previsão no Decreto-lei nº 1.166/71 e no artigo 149, mesmo que com fato gerador ou base de cálculo idênticos ao imposto já existente. Necessário ressaltar que a Constituição Federal permite a cobrança simultânea da contribuição sindical rural com o imposto territorial rural, nos termos do § 2º do artigo 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. RELATÓRIO Inconformada com a r. decisão de fls. 34/37, que julgou improcedente a ação, recorre a reclamante, Confederação Nacional da Agricultura, consoante razões de fls. 39/43. Sustenta, em síntese, que a contribuição sindical rural patronal (CSRP) não constitui bitributação com o imposto territorial rural (ITR), em face da distinção entre uma e outro, pois esta está prevista no Código Tributário Nacional e Lei nº 9.393/96, enquanto que aquela rege-se pela CLT, Decreto-lei nº 1.166/71 e § 2º do artigo 10 do ADCT, entre outras diferenças, não havendo que se falar na sua inconstitucionalidade, podendo ser cobradas simultaneamente. Pede a reforma da r. sentença. Custas, de acordo com a legislação civil, às fls. 44. Sem contra-razões. O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por meio dos v. Acórdãos de fls. 59/60 e 103/105, determinou a remessa dos presentes autos para esta Justiça Especializada, em face da nova redação dada ao artigo 114 da Constituição Federal pela Emenda Constitucional nº 45/2004. Dispensado o parecer da Douta Procuradoria, nos termos dos artigos 110 e 111 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal. É o relatório. VOTO Conheço do recurso, nos termos do artigo 114 da Constituição Federal, com a nova redação que lhe deu a Emenda Constitucional nº 45/2004. Quanto à contribuição sindical rural patronal Trata-se de ação de cobrança de contribuição sindical rural patronal, fundamentada na CLT (artigo 578 e seguintes), no Decreto-Lei nº 1.166/71 e no § 2º do artigo 10 do ADCT, ajuizada por entidade sindical patronal, em caráter nacional, contra produtor rural pertencente à categoria econômica que a mesma o representa. O MM. Juízo de 1ª Instância, na r. sentença, considerou inconstitucional a contribuição sindical patronal pleiteada por entender ter havido a bitributação, sob o fundamento de que teria a mesma base de cálculo do Imposto Territorial Rural – ITR, qual seja, o valor da terra nua ou o valor fiduciário (este mencionado no artigo 30 do Código Tributário Nacional), bem como a mesma incidência deste imposto, isto é, ser proprietário de imóvel rural, nos termos do artigo 153, inciso VI, da Constituição Federal, o que seria vedado pelo artigo 154, inciso I, da Carta Magna. Entretanto, este não é o melhor entendimento. Nos termos dos artigos 578 e seguintes da CLT, a contribuição sindical, ao contrário das contribuições assistencial ou confederativa previstas em convenções ou acordos coletivos e em sentenças normativas – que dependem da não oposição dos trabalhadores e não podem ser exigidas de empregados não filiados ao sindicato, de acordo com o Precedente Normativo nº 119 do Colendo Tribunal Superior do Trabalho – pode ser exigida de toda a categoria, econômica ou profissional, e até mesmo de profissionais liberais, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão e, na inexistência deste, à Federação ou Confederação respectiva (artigos 579 e 591 da CLT). Neste sentido, já decidiu o Excelso Supremo Tribunal Federal: "A Constituição de 1988, à vista do art. 8º, IV, in fine, recebeu o instituto da contribuição sindical compulsória, exigível, nos termos dos arts. 578 ss. CLT, de todos os integrantes da categoria, independentemente de sua filiação ao sindicato (cf. Adin 1.076, med. cautelar, Pertence, 15.6.94) (STF, RMS 21.758/DF, Min. Sepúlveda Pertence, PP 29.831)" (extraído da obra "Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho", de Valentin Carrion, Ed. Saraiva, 30ª ed., nota 1 ao artigo 578, págs. 455/456). Com relação à bitributação, a interpretação sistemática da legislação pertinente a afasta. Dispõem os §§ 1º dos artigos 4º e 7º do Decreto-lei nº 1.166/71 que: "Art. 4º ... § 1º Para efeito de cobrança da contribuição sindical dos empregadores rurais organizados em empresas ou firmas, a contribuição sindical será lançada e cobrada proporcionalmente ao capital social, e para os não organizados dessa forma, entender-se-á como capital o valor adotado para o lançamento do impôsto territorial do imóvel explorado, fixado pelo INCRA, aplicando-se em ambos os casos as percentagens previstas no artigo 580, letra c, da Consolidação das Leis do Trabalho. ... Art. 7º ... § 1º A aplicação da contribuição sindical rural, objetivando o desenvolvimento setorial e atendidas as peculiaridades de cada categoria, será feita pelas respectivas entidades, nos têrmos de instruções baixadas pelos Ministros do Trabalho e Previdência Social e da Agricultura, que estabelecerão normas visando a harmonizar as atividades sindicais com propósitos sociais, econômicos e técnicos da agricultura." (grifos do Relator) Dispõem os artigos 153, inciso VI e o artigo 154, inciso I, ambos da Constituição Federal que: "Art. 153. Compete à união instituir impostos sobre: ... VI – propriedade territorial rural; ... Art. 154. A União poderá instituir: I – mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição;" (grifos do Relator) Dispõe, ainda, o "caput" do artigo 149 da Constituição Federal: "Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas ..." Inicialmente, ainda que se possa constatar identidade entre as bases de cálculo e os fatos geradores da contribuição sindical rural (CSR) e do imposto sobre a propriedade territorial rural (ITR), a destinação de suas arrecadações são distintas: a primeira objetiva o "desenvolvimento setorial e atendidas as peculiaridades de cada categoria" e o estabelecimento de "normas visando a harmonizar as atividades sindicais com os propósitos sociais, econômicos e técnicos da agricultura"; já, o segundo, trata-se de um dos impostos sobre o patrimônio, cujo objetivo maior é estimular a eficiente utilização das terras rurais. Com relação ao ITR, José Afonso da Silva, ao discorrer sobre o Sistema Tributário Nacional, nos ensina: "(5) Imposto sobre a propriedade territorial rural. É um dos impostos sobre o patrimônio. É de competência da união para funcionar como instrumento auxiliar da política agrária. Por essa razão é que deverá ter suas alíquotas fixadas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas, que, por isso, contrariam sua função social (art. 184). ..." (in "Curso de Direito Constitucional Positivo", Malheiros Editores, 17ª ed., pág. 700) Logo, a conclusão a que se chega é que a contribuição sindical rural tem natureza de contribuição social, prevista no artigo 149 da Constituição Federal, enquanto que o imposto territorial rural constitui verdadeiro imposto, com a finalidade de "desestimular a manutenção de propriedades improdutivas". Em virtude de tais distinções, entendo que não se verifica o efeito da bitributação, apontado na r. sentença, uma vez que esta somente ocorre entre dois impostos e não impostos e contribuições sociais. Não é demais observar, ainda, que a vedação prevista no artigo 153, inciso VI combinada com o artigo 154, inciso I, ambos da Constituição Federal, se refere exclusivamente à instituição de novos IMPOSTOS, ou seja, a instituição de fontes novas de custeio que não a já prevista no artigo 153, inciso VI, não vedando, porém, a criação de uma contribuição social já prevista no texto constitucional, como no caso a contribuição sindical rural, que tem previsão no Decreto-lei nº 1.166/71 e no artigo 149, mesmo que com fato gerador ou base de cálculo idênticos ao imposto já existente. Necessário ressaltar que a Constituição Federal permite a cobrança simultânea da contribuição sindical rural com o imposto territorial rural, nos termos do § 2º do artigo 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, assim redigido: "Até ulterior disposição legal, a cobrança das contribuições para o custeio das atividades dos sindicatos rurais será feita juntamente com a do imposto territorial rural, pelo mesmo órgão arrecadador." Deste modo, condeno o reclamado ao pagamento da quantia de R$1.060,60, referente às contribuições sindicais dos anos de 1997, 1998 e 1999, com multa de 2%, correção monetária e juros na forma da lei. Defiro honorários advocatícios com base nos artigos 389 e 404 do Código Civil, no importe de 10% sobre o valor da causa. Diante do exposto, decido conhecer do recurso da Confederação-reclamante e, no mérito, dar-lhe provimento para, reformando a r. sentença, julgar procedente a ação e condenar o reclamado a pagar a quantia de R$1.060,60, referente às contribuições sindicais dos anos de 1997, 1998 e 1999, com multa de 2%, correção monetária e juros na forma da lei, bem como honorários advocatícios em 10% sobre o valor da causa, tudo nos termos da fundamentação. Arbitra-se o valor da condenação em R$3.000,00. Custas na forma da lei, pelo reclamado, no importe de R$60,00. LUIZ CARLOS DE ARAÚJO |
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Boletim Informativo nº
927,
semana de 4 a 10 de setembro de 2006 |
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