Jornal O Estado de S. Paulo

Sementes aos porcos

Mesmo que se admitisse, como hipótese de trabalho, que os integrantes da chamada Via Campesina estão imbuídos de propósitos ecológicos em suas operações de invasão e destruição de centros de pesquisas científicas, no campo da agronomia, suas ligações estreitas com o Movimento dos Sem-Terra (MST), a utilização de seus métodos predatórios, vandálicos, de total desrespeito às leis e à ordem pública são suficientes para desqualificar qualquer empenho cívico com que pretendam revestir suas deletérias badernas, como as que perpetraram em 2003, em Ponta Grossa (PR) contra a Monsanto, ou mais recentemente, em Barra do Ribeiro (RS) contra a Aracruz, ou a invasão, que já dura quatro meses, da estação de pesquisas da multinacional suíça Syngenta, criada na cidade de Santa Tereza (PR) em 1987.

Em todos estes casos o que se tem visto é o claro propósito de se colocar um verdadeiro espantalho, para afugentar quem quer que pretenda realizar investimentos científicos, capazes de contribuir para o desenvolvimento do agronegócio no País.

Em 14 de março a Syngenta Seeds, maior empresa no desenvolvimento de sementes e defensivos agrícolas instalada no Brasil - onde fatura US$ 800 milhões por ano -, teve seu centro de pesquisas invadido por mil integrantes da Via Campesina. Cinco dias após a invasão, a empresa obteve na Justiça um mandado de reintegração de posse. O juiz concedeu mais cinco dias para a desocupação pacífica da área. Vencido o prazo, o governador do Paraná, Roberto Requião, deveria ser notificado para determinar a desocupação com força policial. Mas "o juiz levou quase três meses para conseguir entregar a notificação ao governador" - como informou o diretor-geral da empresa, Pedro Rugeroni. A invasão causou perda potencial do trabalho de quatro ou cinco anos, por força da danificação de sementes melhoradas ou em vias de melhoramentos: 7 mil linhagens e 8 mil híbridos guardados cuidadosamente por pesquisadores ao longo dos últimos 20 anos.

A empresa, que programara investimentos no Brasil, este ano, da ordem de US$ 12 milhões, depois de sofrer, com a invasão, prejuízos de cerca de US$ 1,5 milhão - e prejuízo potencial em torno de US$ 50 milhões - informa que "o investimento para o ano que vem, certamente, vai tender a zero". E entende-se perfeitamente a intenção revelada pelo executivo da empresa, de deixar o Paraná, com seu desabafo: "Agora, as sementes plantadas para utilização em pesquisa estão sendo usadas para alimentar porcos e galinhas dos invasores." Como se diz das pérolas, jogam-se sementes aos porcos - e este é o retrato fiel de uma estúpida mentalidade.

Como não poderia deixar de ser, a "defesa" do vandalismo dessa organização chamada "A Via Campesina" - bando internacional de pequenos agricultores europeus cultores da violência e mantidos pelo subsídio - é feita por quem, no Brasil, é coordenador dos dois bandos ("Via" e MST) e com o maior dos cinismos se pronuncia em defesa da lei, alegando que a multinacional suíça "atropelou a lei brasileira que proíbe experimentos com transgênicos em áreas próximas aos parques nacionais, numa faixa de proteção de dez quilômetros chamada de zona de amortecimento".

A empresa desmente enfaticamente qualquer desrespeito às leis vigentes e alega que o trabalho em seu centro de pesquisas tem autorização do Ibama e demais agências do meio ambiente. É claro que caminhos há para se chegar à cobrança do pleno cumprimento da lei - mas uma aberrante contradição seria admitir que esse caminho fosse o da pura ilegalidade. As organizações sérias, realmente preocupadas com a defesa do ecossistema, sabem como realizar mobilizações legítimas e legais em favor do meio ambiente.

Por sobre tudo o que significa de insegurança para a atividade produtiva, quando deixam de ser observadas garantias fundamentais para o exercício da atividade econômica - inclusive o direito constitucional à propriedade -, é preciso ressaltar o quanto essa insegurança jurídica é capaz de espantar os que pretendem investir no mercado brasileiro, por acreditarem no seu potencial.

A crença nesse potencial persiste, mas a dúvida é quanto à nossa capacidade institucional de assegurar seu livre desenvolvimento.

Editorial do jornal O Estado de S. Paulo de 9 de julho de 2006


Boletim Informativo nº 920, semana de 17 a 23 de julho de 2006
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

VOLTAR