Indústria do paraná: um flash sombrio

*Gilmar Mendes Lourenço

"A nítida inversão da curva de crescimento industrial do Paraná está diretamente associada ao entrelaçamento de alguns fatores negativos, sintetizados na queda de rendimento físico e financeiro do agronegócio"

Em pleno ambiente de festejos alusivos à Copa do Mundo de futebol, o Estado do Paraná recebeu uma péssima, embora esperada, notícia: o desempenho negativo de seu parque industrial no primeiro quadrimestre de 2006, na contramão da recuperação da indústria brasileira, conforme pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geográfica e Estatística.

Mais que isso, o flash sombrio acusado pela indústria paranaense traduziu o pior desempenho entre os treze estados pesquisados pelo IBGE, corroborando uma trajetória de pronunciada desaceleração, esboçada desde o começo do segundo semestre do ano passado, quando os painéis dos pontos de ônibus, em Curitiba, estampavam propaganda institucional indicativa de que o complexo manufatureiro regional ostentava a segunda melhor performance do país, atrás apenas do Amazonas.

De fato, o volume físico produzido pela indústria estadual declinou 5,7% entre janeiro e abril de 2006, em comparação com idêntico intervalo de 2005, contra expansão de 2,9% constatada pela indústria brasileira. O indicador acumulado nos últimos doze meses encerrados em abril também observou variação negativa (-2,0%), à frente apenas das indústrias catarinense (-2,9%) e gaúcha (-3,6%), ambas prejudicadas pela crise provocada binômio agricultura e câmbio.

Os resultados negativos da indústria do Paraná, no começo de 2006, foram influenciados decisivamente por veículos automotores (-18,2%), química (-18,0), máquinas e equipamentos (-15,1%), madeira (-11,4%), mobiliário (-10,6%), minerais não-metálicos (-8,4%) e alimentos (0,0%). Em máquinas, química (adubos e fertilizantes) e alimentos, os recuos podem ser imputados primordialmente à crise na agropecuária. Nos segmentos de mobiliário e minerais não-metálicos, o encolhimento experimentado advém da mais que decenal instabilidade da construção civil, apesar da recente redução de impostos para a cesta básica de insumos. Já para o ramo madeireiro, o comportamento depressivo resulta do câmbio não competitivo.

Em meio a esse cenário desanimador, emergiram os desempenhos positivos de borracha e plástico (16,8% - produção de pneus), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (13,0% - em virtude da redução de preço dos componentes, devido à desvalorização do dólar, da diminuição dos tributos e das facilidades de crédito, com a queda dos juros e a ampliação dos prazos), bebidas (11,9% - consumo de verão), e celulose e papel (8,9%), sendo que este último ramo começa a acusar perda de rentabilidade nas exportações com o câmbio apreciado.

A nítida inversão da curva de crescimento industrial do Paraná está diretamente associada ao entrelaçamento de alguns fatores negativos, sintetizados na queda de rendimento físico e financeiro do agronegócio, nos efeitos da persistência do viés monetarista na gestão macreconômica do país, e em decisões pontuais de empresas estratégicas sediadas no Estado.

Esse último ponto pode ser exemplificado pela transferência da linha do automóvel Fox Europa da Volkswagen, de São José dos Pinhais (Paraná) para São Bernardo do Campo (São Paulo), verificada no segundo semestre de 2005, em atendimento à programação da companhia determinada por pressões e/ou negociações de natureza sindical.

Mais precisamente, a combinação entre a ocorrência de distorções climáticas (secas) por três safras consecutivas, o declínio dos preços internacionais das commodities agrícolas, o aparecimento, a propagação ou os reflexos de problemas fitossanitários (febre aftosa e ameaça da gripe do frango asiática), e o câmbio defasado, retiraram expressiva capacidade de geração de renda dos ramos ligados direta e indiretamente ao setor primário regional, ao atingirem a demanda de grãos e de carnes e implicarem quedas relevantes nos preços da terra e de outros ativos, como máquinas e implementos.

A maior proteção à fração microeconômica do agro, ensejada pelas inovações tecnológicas, particularmente em utilização de insumos e defensivos, por práticas de irrigação e por modalidades de transações em mercados futuros, foi praticamente anulada pelos constrangimentos de natureza macro, inclusive por meio da deterioração cambial acusada pelo retardo temporal entre a aquisição dos bens de produção e a comercialização efetiva da safra. O mais grave, porém, é a situação de descapitalização e inadimplência dos produtores, resultando em depreciação dos preços dos ativos, particularmente dos imóveis rurais, superior a 40,0% nos últimos dois anos.

Ao mesmo tempo, a intransigente defesa e prática de juros reais elevados pelo Ministério da Fazenda contribuiu para a compressão do consumo, a despeito do reforço da massa de salários - proporcionado pela redução do desemprego e das elevações dos rendimentos reais maximizadas pelos reajustes do mínimo -, dos investimentos privados, do poder de fogo do dispêndio e das inversões públicas e do ritmo de expansão da exportações, este último por conta da valorização cambial proporcionada pelos juros altos.

É bastante provável que os reflexos positivos trazidos pela Copa, pelo ciclo eleitoral e pela flexibilização monetária adotada pelo Banco Central, não possuam força suficiente para promover uma reversão desse panorama perverso no restante do ano, na ausência de consistentes diretrizes estruturais para o desenvolvimento da indústria operante Estado. Feliz 2007, Paraná.

*Gilmar Mendes Lourenço é economista do IPARDES e coordenador do 
Curso de Ciências Econômicas da UniFAE – Centro Universitário


Boletim Informativo nº 916, semana de 19 a 25 de junho de 2006
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

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