PODER JUDICIÁRIO |
RECURSO ORDINÁRIO
VOLUNTÁRIO RO-V
00834-2005-023-12-00-6 |
CERCEIO AO DIREITO DE DEFESA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. MATÉRIA PREDOMINANTEMENTE DE DIREITO. Quando a matéria em debate é predominantemente de Direito e não reclama outras provas documentais além daquelas já trazidas a Juízo, não se afigura a hipótese de cerceio ao direito de defesa, porque o próprio ordenamento jurídico sinaliza a viabilidade de julgamento antecipado da lide. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de RECURSO ORDINÁRIO VOLUNTÁRIO, provenientes da Vara do Trabalho de Araranguá, SC, sendo recorrente Z. D. e recorridos CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA AGRICULTURA - CNA E OUTRO (02). Decidiu o Juiz da 1ª Vara de Direito da Comarca de Araranguá condenar o réu, Z. D., ao pagamento de R$ 4.490,76, referente à contribuição sindical rural, acrescido de correção monetária a partir da data do vencimento e de juros legais a contar da citação. Em recurso dirigido ao Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, o réu-recorrente, em primeiro plano, aduz ter havido cerceio ao direito de defesa, porquanto tencionava provar a condição de pequeno produtor rural em regime de economia familiar, aspecto que o coloca alheio à obrigação de recolher contribuição em proveito da entidade representante de categoria econômica. Contudo, a produção de prova lhe foi obstruída, donde requer a anulação de todo o processado a partir da audiência de conciliação, a fim de que seja oportunizado a ele produzir prova testemunhal. No mérito, discorre, novamente, sobre a inépcia da exordial, tendo em vista que enxerga a inobservância do rito processual adequado, tratando-se de cobrança de contribuição sindical rural. Exorta seja observado o rito traçado na Lei de Execução Fiscal, "que exige a necessidade de lançamento, com a instauração de prévio procedimento administrativo para verificar a ocorrência do fato gerador do tributo". Acentua que a contribuição em tela não constitui crédito civil, persistindo a configuração de tributo, não obstante a lei tenha repassado às entidades sindicais rurais o procedimento de cobrança. Enfim, aponta violação ao art. 606 e parágrafos da CLT. Sob outra linha argumentativa, assevera estar filiado ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Araranguá, conforme provado documentalmente, porquanto explora a área rural juntamente com a sua família, não se utilizando de empregados rurais temporários ou permanentes, de maneira que nada deve, em termos de contribuição, à Confederação Nacional da Agricultura – CNA e à Federação da Agricultura do Estado de Santa Catarina – FAESC. Contra-razões são apresentadas às fls. 75-82. Remetidos os autos ao Ministério Público Estadual, restou enunciada a desnecessidade de atuação ministerial (fls. 86-88), "uma vez que o mérito da quaestio não se subsume a nenhuma das hipóteses do art. 82 do CPC". Quando do julgamento da apelação, resolveram os Juízes da 3ª Câmara de Direito Público, em face da Emenda Constitucional nº 45, redirecionar a reanálise do feito a esta Corte Especializada. É o relatório. VOTO Conheço do recurso e das contra-razões, porque estão atendidos os pressupostos legais de admissibilidade. PRELIMINAR DE NULIDADE POR CERCEAMENTO AO DIREITO DE DEFESA O que motiva o recorrente a suscitar a nulidade processual situa-se no fato de não se haver permitido produzir provas de que constitui pequeno produtor rural, na forma alegada na contestação. Contudo, a prova documental produzida nos autos, com notável distinção àquelas encartadas às fls. 15-23, e o revolvimento de matéria preponderantemente de direito persuadiram o Julgador de origem, propiciando-o julgar antecipadamente o feito, na forma do art. 330, inc. I, do CPC. Nessa atitude não vejo nulidade processual nenhuma; ao revés, fez-se valer a celeridade incessantemente almejada, contudo, poucas vezes alcançada por uma série de fatores intra e extraprocessuais. A conformação ou não do recorrente à condição de pequeno produtor rural, por sua vez, revolve questão meritória e, portanto, assim será devidamente apreciada. MÉRITO INÉPCIA DA INICIAL POR INOBSERVÂNCIA DO RITO PROCESSUAL ADEQUADO (PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO – LEI DE EXECUÇÃO FISCAL). CONFORMAÇÃO OU NÃO DO RECORRENTE À CONDIÇÃO DE PEQUENO PRODUTOR RURAL De início e ligeiramente, convém recordar que, de fato, após o advento da Emenda Constitucional nº 45, esta Justiça Especializada foi dotada de competência para processar e julgar "as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicato e empregadores". Deflui, pois, que detém este Juízo competência para dirimir a contenda envolvendo as contribuições sindicais rurais cobradas pela Confederação Nacional da Agricultura – CNA e a Federação da Agricultura do Estado de Santa Catarina – FAESC. Para ilustrar cito a seguinte ementa oriunda do STJ: "CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL INSTITUÍDA POR LEI. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA TRABALHISTA. ART. 114, INCISO III DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EC Nº 45 DE 08 DE DEZEMBRO DE 2004. APLICAÇÃO IMEDIATA. ART. 87 DO CPC. 1. Examina-se conflito de competência estabelecido entre a Justiça Estadual Comum e a Justiça do Trabalho surgido de ação de cobrança ajuizada pela Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil objetivando o recebimento de contribuição sindical rural fundada no art. 578 e seguintes da Consolidação das Leis Trabalhistas. 2. A EC nº 45 dispõe, conforme redação que deu ao art. 114, III da CF/88, que: "Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: ... III - as ações sobre representação sindical, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores." 3. As ações ajuizadas por entidades sindicais atinentes à cobrança de contribuição sindical devem ser processadas e julgadas na Justiça Trabalhista em face da carga cogente do art. 114, inciso III da Constituição Federal. Competência atribuída pela EC nº 45 de 08 de dezembro de 2004. 4. No tocante ao fenômeno da aplicação da Emenda Constitucional referida no tempo, tenho que ela se aplica, desde logo, em face do disposto na parte final do art. 87 do CPC. 5. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo da Primeira Vara do Trabalho de Governador Valadares/MG, o suscitante." (Conflito de Competência 2005/0035071-4, Min. José Delgado, publ. no DJ em 05.09.2005). Quanto ao tema contribuição sindical rural, é de inarredável pertinência evocar o art. 578 e seguintes da CLT e o Decreto-Lei nº 1.166/71, devidamente recepcionados pela Constituição da República de 1988. A contribuição sindical prevista nos arts. 578 e 579 da CLT, matéria pacífica, tem natureza tributária, compulsória e de exigência anual de todos aqueles integrantes de determinada categoria profissional ou econômica (definindo, pois, os contribuintes e a hipótese de incidência). A Lei Maior oferta inegável sustentáculo à referenciada contribuição sindical quando deita referências no art. 8º, inc. IV1 , e no art. 1492 . O segundo diploma citado e específico à contribuição sindical rural, Decreto-Lei nº 1.166/71, também tem respaldo na Constituição da República, no parágrafo único3 do citado art. 8º. Está-se defronte a uma ação ordinária de cobrança de contribuição sindical rural pelas entidades sindicais de grau superior, representantes da categoria econômica (agricultura), de maneira que, exatamente por isso, não há falar em lançamento, constituição do crédito tributário e lei de execução fiscal. Outra Lei importantíssima para o deslinde da quaestio é a de nº 8.847/94, que, ao fazer cessar a competência da Secretaria da Receita Federal quanto à administração da contribuição sindical, passou a indicar que o lançamento e a cobrança dessas contribuições sindicais rurais estão a cargo das Confederações, posição inclusive já referendada em muitas decisões do STF. A Lei nº 9.393/96, em seu art. 17, permissionária da celebração de convênios entre a Secretaria da Receita Federal e as Confederações com a finalidade de fornecer dados cadastrais de imóveis rurais, só veio a fortificar a pregnosticada legitimidade das Confederações. Muito antes, o lançamento e a cobrança da contribuição coube ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e mais recentemente à Secretaria da Receita Federal. Logo, se a Confederação tem a prerrogativa para a cobrança da contribuição sindical rural, fazendo-a por meio da presente ação em grau de recurso, inviável subjugá-la às diretrizes do procedimento administrativo e da Lei de Execuções Fiscais, notadamente a execução fiscal, que em muito reduz a possibilidade do contraditório pelo contribuinte. A propósito, movido pelo desejo de bem elucidar a matéria, reproduzo excertos do seguinte julgado proferido pela 2ª Segunda Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, cuja relatoria coube à Exma. Desembargadora Cláudia Menge: "Não se vê inviabilizada a cobrança pela ausência de prévia notificação. A CNA é pessoa de direito privado à qual, excepcionalmente, se atribuiu crédito de natureza tributária, a contribuição sindical rural. Tal circunstância não faz dela pessoa de direito público e não a autoriza a realizar atos administrativos como o lançamento. Trata-se de hipótese diversa daquela prevista no Código Tributário Nacional, quer na Lei de Execuções Fiscais. Daí porque não há necessidade de lançamento, nem, em conseqüência, de prévia notificação para possibilitar a cobrança." (Disponível em www.faep.com.br/boletim/bi890/bi890pag25.htm, acesso em 06, dez, 2005) Quanto à contribuição em si, o art. 1º, inc. II, alínea "b", do Decreto-Lei nº 1.166/71, com a redação atribuída pela Lei nº 9.701/98, dispõe, a respeito do que deva ser compreendido como empregador rural para efeito da contribuição sindical rural, como segue: "quem, proprietário ou não, e mesmo sem empregado, em regime de economia familiar, explore imóvel rural que lhe absorva toda a força de trabalho e lhe garanta a subsistência e progresso social e econômico em área superior a dois módulos rurais da respectiva região." Desvanece, portanto, toda a argumentação de que seria o réu-recorrente pequeno produtor rural em regime de economia familiar, dado que, conforme as guias de recolhimento anexadas às fls. 15-23 – no que não há qualquer dúvida -, o imóvel rural de sua propriedade, sito na Estrada Geral, sem número, Bairro Rio dos Anjos, Araranguá, tem a extensão de 170,1 hectares, suplantando, em muito, os dois módulos rurais da região (representam área rural mínima suficiente para que uma família possa viver e progredir com a sua exploração). Mesmo sem contar com o auxílio de empregados, o recorrente enquadra-se como empregador rural, suscetível ao recolhimento da contribuição sindical rural, frisa-se, de exigência compulsória, cuja base de incidência leva em conta o mesmo valor adotado para a incidência do imposto territorial rural. A final, pouco importa se o recorrente verteu contribuições em proveito de outra entidade sindical à qual entendia representá-lo (Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Araranguá). Nego provimento ao recurso. Pelo que, ACORDAM os Juízes da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região, por unanimidade de votos, CONHECER DO RECURSO; por igual votação, rejeitar a preliminar de nulidade por cerceio ao direito de defesa. No mérito, por unanimidade de votos, NEGAR-LHE PROVIMENTO. Custas na forma da lei. Intimem-se. Participaram do julgamento realizado na sessão do dia 07 de março de 2006, sob a presidência da Exma. Juíza Ione Ramos, os Exmos. Juízes Geraldo José Balbinot (Revisor) e Amarildo Carlos de Lima (Relator). Presente a Exma. Procuradora do Trabalho Dra. Quézia Araújo Duarte de Aguiar. Florianópolis, 21 de março de 2006. AMARILDO CARLOS DE LIMA
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Boletim Informativo nº 911,
semana de 15 a 21 de maio de 2006 |
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