Queda nos preços das commodities
afeta renda dos produtores rurais

Agropecuária - efeito cumulativo e potencialização da crise

Queda de Preços na Safra 2004/05



   As crises na agricultura brasileira são resultantes, em grande parte, dos efeitos das políticas econômicas vigentes e das variações climáticas.

Os preços das principais commodities agrícolas, notadamente soja, milho e trigo, registraram queda acentuada no segundo semestre de 2004, afetando a rentabilidade do setor, com margem estreita de lucratividade e até mesmo severos prejuízos em alguns produtos.

Foram poucos os produtores rurais que conseguiram resultados compensatórios em 2004. A queda de preços dos principais produtos agrícolas, o 

aumento dos insumos pressionando os custos de produção e a queda do dólar foram fatores que afetaram o desempenho da agropecuária, iniciando a crise no setor.


   O agravamento da crise agropecuária em 2005 se deu com a combinação da política cambial, a queda dos preços internacionais da soja, milho e trigo e a estiagem que atingiu as principais regiões produtoras do País, com quebra de safra e redução da produtividade.

Em 2005 os preços da soja no mercado internacional registraram queda de 20% em relação às cotações da Bolsa de Chicago em 2004. Já os preços recebidos pelo produtor paranaense, em igual período, assinalaram variação negativa de 28%.

Não obstante os preços internacionais apresentarem queda, estão dentro da média histórica. A política cambial 


assume o papel de grande vilã da agropecuária. Ocorre que os produtores adquiriram os insumos com o dólar mais elevado e, conseqüentemente, custos de produção elevados e baixa disponibilidade de recursos para custeio à taxa fixa de 8,75% ao ano.



   Vale salientar que o Brasil não tem propositalmente política cambial. O valor do real frente ao dólar é dado pelo ingresso de capitais externos (capital especulativo) que entram no país em busca de juros elevados e garantidos pelo Tesouro Nacional.

O resultado do ano para o produtor rural é dado por: L = R – C, onde L significa lucro ou parte da renda apropriada pelo produtor, R é a receita (preço x quantidade) e C o custo de produção. Acontece que em 2005 o lucro foi mais baixo; o preço também baixo em função da política cambial, a quantidade produzida menor e os custos elevados.


   O impacto ocasionou menor renda para o produtor, com os resultados sendo previstos para os demais agentes do setor:

  • Menor alocação de recursos em tecnificação das lavouras na safra 2005/06, basicamente adubos e fungicidas;

  • Custo elevado do financiamento, dado que houve redução no volume de financiamentos a juros de 8,75% ao ano;

  • Efeito na economia: redução do uso de adubo (as indústrias comercializaram menor volume em relação às safras anteriores); redução da renovação do parque de máquinas e equipamentos, além do efeito multiplicador reverso em razão da menor renda injetada no comércio e serviços das cidades das regiões de produção do Paraná;

  • Falta de recursos próprios do produtor para investir na atividade; e

  • Plantio em algumas regiões realizado tardiamente em função do excesso de chuvas na primavera.

Conforme estimativas das indústrias de fertilizantes (ANDA) a redução da produção brasileira está avaliada entre 10 a 15% para a safra 2005/06. O consumo brasileiro é de 22 milhões de toneladas e a redução do consumo prevista em 3 milhões de toneladas. O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos – USDA igualmente prevê uma queda do consumo de adubo para a próxima safra norte-americana no entorno de 15%.

No Paraná, o consumo de adubo na safra 2004/05 foi de 1,8 milhão de toneladas e a estimativa de redução do consumo, dentro de uma projeção cautelosa, é de 250 mil toneladas.

A quantificação inicial das perdas para o produtor rural pode ser mensurada pelo comparativo de preços e da inflação. A variação acumulada do IPR - PR (Índice de Preços Recebidos) foi negativa em 0,70%, em comparação com a variação positiva de 5,69% do IPCA; 5,03% do INPC; 4,53% do IPC-FIPE; 1,22% do IGP-DI e 1,21% do IGP-M. A interpretação dos índices mostra perda de poder de troca no período para os agricultores paranaenses em 4,99 pontos percentuais em relação ao IPCA; 4,35 pontos percentuais frente ao INPC; 3,83 pontos em relação ao IPC-FIPE; 0,52 pontos frente ao IGP-DI e 0,51 pontos em relação ao IGP-M.



Observa-se a partir de março de 2005 uma queda contínua do Índice de Preços Recebidos (IPR), com alguma recuperação dos preços nos meses de novembro e dezembro, em razão de repiques de preços no mercado internacional e da recuperação momentânea do dólar.



   

Desde o início do plantio da safra havia a expectativa da crise se estender para 2006. O quadro vigente confirma a continuidade dos problemas no setor agropecuário, com conseqüências ainda mais graves, haja vista o "efeito cumulativo" das causas: política cambial; seca nas principais regiões produtoras das culturas de verão; o caso do trigo; o caso da pecuária de corte com perdas resultantes da febre aftosa no Estado. Às incertezas climáticas com as quais a agricultura convive, somam-se os fatores mencionados, sem falar do problema crônico da infra-estrutura que tem efeito sobre todo o sistema econômico porquanto desarticula o processo produtivo a partir da porteira até o porto de embarque.

Mesmo assim, com obstáculos de todos os tipos, e situação crítica por três safras consecutivas, agravada pela conjunção de problemas estruturais e conjunturais, com perdas duplas e impactos negativos na capacidade de pagamento dos financiamentos, o agronegócio continua gerando superávits líquidos na balança comercial. E o pior: a agropecuária continua pagando a conta da política de estabilização da economia.

Sob a ótica do custo de plantio, embora aparentemente os preços dos insumos registrem queda, o custo fixo do produtor permanece o mesmo tanto para uma colheita normal (hora/máquina), como no caso de perda da produção. Na hora da colheita é que será possível quantificar precisamente a perda de renda do produtor.

Pelo lado da produção, as primeiras estimativas oficiais indicam uma redução de 17% na safra de verão em função da seca, com quebra de produtividade que só vai aparecer na colheita. As culturas mais afetadas são o milho e a soja, mas outras culturas, como o feijão, batata, arroz e algodão também registram perdas. A seca também já ameaça as culturas de cana-de-açúcar e mandioca.

Com relação aos preços, vale ressaltar que o preço internacional está em patamares considerados bons, dentro da média histórica; já os preços internos estão péssimos, não permitindo no atual patamar da moeda americana, prever lucro para o produtor.

Em função da situação conjuntural pode-se inferir que, em 2006, a renda do produtor será menor do que em 2005, permitindo afirmar que a seca vai potencializar a crise da agricultura.

Ademais, parte dos custos (plantio, mão-de-obra, combustível) já foi realizada e o pagamento dos financiamentos e a apropriação da renda do produtor serão prejudicados, obrigando o produtor a refinanciar seus financiamentos para poder garantir sua sobrevivência.

Somente nas culturas de soja e milho, as perdas decorrentes da quebra de safra 05/06, avaliadas em 14% e 22%, respectivamente, representam em termos financeiros, se adotarmos como parâmetro os preços constantes , isto é, eliminando os efeitos inflacionários, o montante de R$ 1,56 bilhão, equivalente a US$ 699 milhões (taxa cambial de R$ 2,2300/US$). A perda de renda pelo preço ainda não pode ser avaliada. Caso a paridade cambial se mantenha, a perda poderá ser maior que o efeito seca.

 


   Implicações outras devem ser analisadas, tais como:

  • Menor ou nenhuma renda ao produtor; perda de produção e produtividade;

  • Em 2006 não tem sobra financeira do ano anterior; em 2005 ainda tinha sobra de 2004; e

  • Efeito multiplicador reverso e potencializado na economia regional pela geração de menor renda. A economia do Paraná nas regiões de produção deverá se ressentir, mais uma vez, da perda de renda cumulativa e com conexões perversas em todos os segmentos do agronegócio.

O custo da inexistência e/ou falta de uma política agrícola, significa:

  • Produtor rural: sem renda;

  • Economia Regional: sem alavancagem (renda) para crescer;

  • Mercado Financeiro: investidores auferindo ganho dos juros para manter o dólar baixo.

  • O custo da estabilização econômica sem política agrícola, resultou em 2005 numa dívida interna da ordem de R$ 1,0 trilhão, correspondente a uma dívida atual superior a R$ 5.000,00 para cada brasileiro.

A crise de renda na agropecuária e os problemas decorrentes levaram as lideranças do setor - Federação da Agricultura do Estado do Paraná (FAEP), Organização das Cooperativas do Estado do Paraná (Ocepar), Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Estado do Paraná (FETAEP), Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul (FETRAF-SUL) e Secretaria da Agricultura e do Abastecimento (SEAB-PR) – a elaborar, em 25 de janeiro último, um documento aos Ministérios da Agricultura, Planejamento e Desenvolvimento Agrário, contendo os pleitos do setor agropecuário para atenuar o difícil momento que vive o setor e sobretudo dar condições para que o produtor continue produzindo, haja vista os efeitos cumulativos e a potencialização da crise em 2006.

Gilda Bozza Borges
Economista DTE/FAEP


Boletim Informativo nº 898, semana de 6 a 12 de fevereiro de 2006
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

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