PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇADO ESTADO DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CÍVEL N. 2.0000.00.518838-9/000 da Comarca de ITUIUTABA

APELANte: C. V. M.

APELADA: CONFEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA DO BRASIL - CNA

RELATOR: DES SEBASTIÃO PEREIRA DE SOUZA

 

CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA AGRICULTURA – COBRANÇA – JUSTIÇA GRATUITA – CUSTAS AO FINAL – POSSIBILIDADE – FAZENDA PÚBLICA – LEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA – CONSTITUCIONALIDADE – MULTA

Nos termos do art. 606 da CLT, os benefícios concedidos à Fazenda Pública se estendem aos sindicatos, restando diferido, para o final do processo, o pagamento das custas processuais, nos termos do art. 27 do CPC e 39 da Lei 6.830/80.

Em recente uniformização de jurisprudência, suscitada no processo 328872-02/01, restara pacificada a legitimidade ativa da CNA para a cobrança das contribuições sindicais rurais, com supedâneo na Lei 8.847/94, que transferira a competência para a arrecadação da contribuição, originariamente concedida à Receita Federal.

A contribuição sindical prevista no artigo 578, da CLT foi recepcionada pela Constituição Federal e tem natureza jurídica tributária, porque compulsória e estatuída em lei, cujo pagamento é obrigatório, independentemente de associação. As contribuições exigidas com amparo no Decreto-lei n. 1.166/71 caracterizam-se como de interesse da categoria profissional ou econômica, conforme disposto no artigo 149, da Constituição Federal.

VOTO

DESEMBARGADOR SEBASTIÃO PEREIRA DE SOUZA:

Perante a 1ª Vara Cível da Comarca de Ituiutaba, a apelada, Confederação Nacional da Agricultura – CNA, aforou a presente ação de Cobrança em desfavor do apelante, C. V. M.

Consta na peça exordial, no essencial, que a apelada é entidade sindical de grau superior e que pretende, com base nos dados fornecidos pela Secretaria da Receita Federal, receber do apelante contribuição sindical do exercício de 2002. Pede a procedência do pedido inicial para condenar o recorrente no pagamento do débito atualizado.

Na contestação, o apelante aduz que a CNA não faz jus aos benefícios da justiça gratuita; que o pedido é juridicamente impossível; que não é parte legítima pois nunca foi filiado à CNA; que a cobrança é inconstitucional e que o valor da guia foi fixado de forma unilateral pela CNA. Acrescentou que no caso de alguma condenação, a multa a ser aplicada é de 2% do valor da prestação e que os juros de mora devem incidir desde a citação. Entende que a apelada é litigante de má-fé e pede o indeferimento da inicial ou a improcedência do pedido.

Sobreveio sentença que julgou procedente o pedido inicial e condenou o apelante no pagamento da contribuição no valor equivalente a R$ 1.194,24 devidamente corrigido desde 03/12/2002. Fundamentou que a CNA é parte legítima para cobrar a contribuição, que é constitucional.

Inconformado, o apelante recorreu alegando que a apelada não faz jus aos benefícios da justiça gratuita deferida pelo MM Juiz a quo, não podendo ser equiparada à Fazenda Nacional, já que tem fiz lucrativos; que o pedido é juridicamente impossível pois a cobrança da contribuição é inconstitucional; que a apelante não é parte legítima para cobrar as contribuições, uma vez que é Confederação e que é parte ilegítima passiva já que não é filiado à recorrida. No mérito assevera que a cobrança é inconstitucional; que teve seu sigilo fiscal quebrado pela apelada; que houve erro na data da correção pelo MM Juiz e que a multa é de 2%.

Nas contra-razões recursais a apelada ratifica as teses da r. sentença e roga pelo improvimento do apelo.

Conheço do apelo pois presentes os pressupostos de admissibilidade.

O caso é o seguinte: A recorrida ajuizou a presente ação de cobrança em desfavor do apelante pleiteando receber a contribuição sindical do exercício de 2002. O pedido foi julgado procedente, razão pela qual o recorrente apelou asseverando que se deve indeferir os benefícios da justiça gratuita; que o pedido é juridicamente impossível pois a cobrança da contribuição é inconstitucional; que a apelante não é parte legítima para cobrar as contribuições, uma vez que é Confederação e que é parte ilegítima passiva já que não é filiado à recorrida. No mérito assevera que a cobrança é inconstitucional; que teve seu sigilo fiscal quebrado pela apelada; que houve erro na data da correção pelo MM Juiz e que a multa é de 2%.

Passo a analisar as preliminares.

Primeira - Justiça gratuita - CNA - Rejeitada

Assevera o apelante que a CNA não faz jus aos benefícios da justiça gratuita. De fato a questão não se trata de justiça gratuita ou assistência judiciária gratuita. Mesmo porque não se presume hipossuficiência da pessoa jurídica. O fato é de equiparação da apelada à pessoa jurídica para efeitos processuais, especialmente com relação à antecipação do depósito prévio de custas.

Nos termos do art. 606 da CLT, os benefícios concedidos à Fazenda Pública se estendem aos sindicatos, restando diferido, para o final do processo, o pagamento das custas processuais, nos termos do art. 27 do CPC e 39 da Lei 6.830/80. Rejeito a preliminar.

Segunda - Impossibilidade jurídica do pedido

Argüiu o apelante que o pedido é juridicamente impossível, sob o fundamento da inconstitucionalidade da cobrança. Referida questão, ou seja, de constitucionalidade da contribuição, confundi-se com o próprio mérito da questão e será analisada oportunamente. Rejeito a preliminar.

Terceira - Ilegitimidade ativa – Afastada

Levantou ainda o recorrente a ilegitimidade ativa da CNA. Em relação ao tema, apesar da inicial ocorrência de controvérsia deste Sodalício, em recente uniformização de jurisprudência, suscitada no processo 328872-02/01, restara pacificada a legitimidade ativa da CNA para a cobrança das contribuições sindicais rurais, com supedâneo na Lei 8847/94, que transferira a competência para a arrecadação da contribuição, originariamente concedida à Receita Federal, constando de seu artigo 24 que "a competência de administração das seguintes receitas, atualmente arrecadadas pela Secretaria da Receita Federal por força do artigo 1o da Lei nº 8.022, de 12 de abril de 1990, cessará em 31 de dezembro de 1996: I - Contribuição Sindical Rural, devida à Confederação Nacional da Agricultura - CNA e à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG, de acordo com o artigo 4º do Decreto-Lei nº 1.166, de 15 de abril de 1971, e artigo 580 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT". Situação posteriormente corroborada pelo Convênio autorizado pela Lei 9393/96, ao prever, em seu artigo 17 que: "a Secretaria da Receita Federal poderá, também, celebrar convênios com: II - a Confederação Nacional da Agricultura - CNA e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG, com a finalidade de fornecer dados cadastrais de imóveis rurais que possibilitem a cobrança das contribuições sindicais devidas àquelas entidades". Rejeito a preliminar.

Quarta - Ilegitimidade passiva - Afastada

Aduziu também o apelante que é parte ilegítima passiva no feito para responder pela demanda tendo em vista que não é filiado da apelante. Cumpre esclarecer ao apelante, como oportunamente decidiu o MM Juiz, referida contribuição sindical possui natureza tributária, e portanto compulsória, independente de filiação ou não do contribuinte sindicalizado. Por esta razão afasta-se a preliminar de ilegitimidade passiva alegada pelo apelante.

No mérito

No mérito, assevera o recorrente que não está obrigado a contribuir, sendo referida cobrança inconstitucional e que as guias não são suficientes para configurar o crédito da apelada, já que adquirida por prova ilícita com quebra de sigilo fiscal e que há irregularidades nos encargos aplicados.

Sem razão o apelante, pois a contribuição sindical prevista no artigo 578, da CLT foi recepcionada pela Constituição Federal e tem natureza jurídica tributária, porque compulsória e estatuída em lei, cujo pagamento é obrigatório, independentemente de associação. As contribuições exigidas com amparo no Decreto-lei n. 1.166/71 caracterizam-se como de interesse da categoria profissional ou econômica, conforme disposto no artigo 149, da Constituição Federal.

A recepção das contribuições para custeio das atividades dos sindicatos rurais restou reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, sendo exigida, nos termos do artigo 578 e seguintes da CLT, de todos os integrantes da categoria, independentemente de sua filiação ao sindicato (ADIn nº 1076 – Medida Cautelar, negando provimento ao recurso em MS, rel. Min. Sepúlveda Pertence, RMS nº 0021758-94). Deve-se admitir a juntada de documentos, na fase recursal, que em nada influam no mérito da causa, vez que não prejudicam o apelado, inexistindo malícia processual da parte que os ocultou. Quanto à prova, impende destacar serem suficientes as guias de recolhimento da contribuição, acompanhadas dos demonstrativos de cálculo, eis que se baseiam em dados cadastrais fornecidos pela apelada à Receita Federal, que, além de necessários à cobrança do tributo (que, repita-se, é compulsório), foram autorizados pelo art. 10 § 2º do ADCT e Leis Correlatas (art. 24 da Lei nº 8.847/94; art. 17 da Lei nº 9.393/96; art. 679 da CLT), bem como pelo convênio celebrado. (TAMG – AP 0351858-1 – (50519) – Bueno Brandão – 5ª C.Cív. – Rel. Juiz Mariné da Cunha – J. 07.02.2002)JCLT.578 JCF.149 JADCT.10 JADCT.10.2 JCLT.679.(grifei)

Assim, o pedido da apelada é juridicamente possível, uma vez que não é vedado pelo ordenamento jurídico e totalmente constitucional nos termos acima mencionados.

No que tange à suficiência das guias para configurar o crédito da apelada, entendo serem as mesmas aptas à constituição da obrigação, que é de caráter tributário. As guias da contribuição sindical rural são preenchidas mediante dados fornecidos pela Secretaria da Fazenda, obtidos mediante informações do próprio contribuinte, semelhantemente ao imposto sobre a propriedade territorial rural, não tendo qualquer fundamento a alegação de obtenção de informações por prova ilícita.

Por fim, resta a ser verificada a aplicação de multa de 2% e a data inicial da correção monetária.

No que se refere à multa, a questão é regida pelo artigo 600 da CLT que estabelece:

"O recolhimento da contribuição sindical, efetuado fora do prazo referido neste Capítulo, quando espontâneo, será acrescido da multa de 10% (dez por cento), nos 30 (trinta) primeiros dias, com o adicional de 2% (dois por cento) por mês subseqüente de atraso, além de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês e correção monetária, ficando, nesse caso, o infrator, isento de outra penalidade" (grifei).

Assim a multa a ser aplicada deve ser a prevista no artigo 600 da CLT.

No que se refere à aplicação de correção monetária, vejo que assiste razão ao apelante. É que o valor pleiteado já se encontra atualizado até 30/10/2004, f. 13 e 14. Portanto, a correção deverá incidir a partir de 31/10/2004 e não de 03/12/02, como entendeu o MM Juiz.

Com tais razões de decidir, dou parcial provimento ao apelo para determinar que no valor a que foi condenado o apelante incida correção monetária pelo índice fixado na r. sentença desde 31/10/04. Custas, pelo apelante, face à mínima sucumbência da apelada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL N. 2.0000.00.518838-9/000 da Comarca de ITUIUTABA, sendo Apelante (s): C. V. M. e Apelado (a) (os) (as): CONFEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA DO BRASIL - CNA, ACORDA, em Turma, a Décima Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais REJEITAR AS PRELIMINARES E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.

Presidiu o julgamento o Desembargador MAURO SOARES DE FREITAS (2º Vogal) e dele participaram os Desembargadores SEBASTIÃO PEREIRA DE SOUZA (Relator) e OTÁVIO DE ABREU PORTES (1º Vogal).

O voto proferido pelo Desembargador Relator foi acompanhado na íntegra pelos demais componentes da Turma Julgadora.

Belo Horizonte, 9 de novembro de 2005.

Des. SEBASTIÃO PEREIRA DE SOUZA

Relator


Boletim Informativo nº 894, semana de 19 a 25 de dezembro de 2005
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

VOLTAR