Justiça isenta volante (bóia-fria) de
pagar contribuição previdenciária

Antes de apresentar a decisão da Justiça Federal de Francisco Beltrão (PR) queremos lembrar que, desde 1992, estamos questionando o tema devido ao fato de haver interpretações variadas e divergentes sobre o assunto, emanadas das áreas de fiscalização e arrecadação da Previdência Social.

A decisão, agora em 2005, é de primeira instância, mas surge como um alento. Emana de uma ação movida por um produtor do Sudoeste Paranaense para contestar uma notificação do INSS, que alega débito originado da falta de recolhimento da contribuição previdênciária de trabalhadores eventuais que trabalharam na colheita e limpeza de sua propriedade rural. O INSS emitiu a notificação depois de propor um acordo de pagamento, que o produtor não aceitou.

Para reafirmar a posição e a luta da Consultoria de Previdência Social a respeito deste assunto, transcrevemos a coluna publicada no Boletim Informativo da FAEP nº 73, de 2002:

Como o bóia-fria pode se aposentar por idade

"Fundamentada na legislação, a diretoria colegiada do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) tem expedido instruções normativas estabelecendo rotinas operacionais, visando a agilização dos pedidos de aposentadorias, pensões e auxílios dos segurados da previdência social. A mais recente é a Instrução Normativa nº 78 (16/07/2002) que, revogando as anteriores, e principalmente a de nº 57 (10 de outubro de 2001), trata também da situação do trabalhador rural denominado "bóia-fria" que, no vai-e-vem da canoa envolvida nas marolas, ainda enfrenta dificuldades no processo de obter aposentadoria por idade nos termos do art. 143, da Lei nº 8.213, de 1991.

Não se preocupem os leitores do Boletim Informativo, pois não estou voltando ao tema "bóia-fria não recolhe contribuição". Se administrativamente ainda não se obteve êxito, com certeza o Judiciário corrigirá".

"Art. 133. Os trabalhadores rurais denominados safrista, volante, eventual, temporário ou "bóia-fria", caracterizados como contribuinte individual, deverão apresentar os comprovantes de inscrição nessa condição e os de recolhimento de contribuição a partir de novembro de 1991 exceto quando for requerido benefício previsto no art. 143 da Lei 8.213, de 1991".

"Finalmente, ao considerar a possibilidade de ausência dos documentos elencados no art. 131 e, em obediência ao disposto no art.143 da Lei, uma vez a inexistência de comprovantes de inscrição como contribuinte individual e recolhimento de contribuição, estabelece no art. 134, que a comprovação do exercício de atividade rural na condição de bóia-fria poderá ser feita através de declarações, não do tomador de mão-de-obra mas sim do Sindicato dos Trabalhadores Rurais e, na falta deste, por duas declarações de autoridades".

Este entendimento motivou o encaminhamento do produtor rural para entrar com a Ação Declaratória de Inexistência de Débitos, depois de ele ter recusado o acordo proposto pelo INSS.

A seguir, conheça a transcrição da decisão proferida pelo Juiz Federal de Francisco Beltrão:

1- Autos nºs 2002 7007 002726;

2 – Originado da Notificação Fiscal recebida pelo produtor rural para pagar a contribuição previdenciária incidente sobre a mão-de-obra avulsa utilizada nos períodos de colheita e limpeza da propriedade;

3- O levantamento do INSS deu-se com base nas declarações fornecidas pelo produtor rural a fim de instruir os processos de aposentadoria por idade pleiteados pelos trabalhadores volantes, os chamados "bóia-fria" efetivamente concedidos pelo INSS;

4- Com base nestas declarações o INSS efetuou o levantamento do suposto débito num montante de aproximadamente R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), calculando-o de forma contínua, sem observar que a prestação de serviço era feita de forma eventual, sem continuidade ou subordinação.

5- Fundamentos da decisão

"(....)

Dos documentos que aportam os autos, mais precisamente o relatório fiscal de fIs. 201/203, infere-se que a autoridade administrativa efetuou o enquadramento dos segurados obrigatórios como "empregados", com base nos pressupostos da não-eventualidade, subordinação, remuneração, habitualidade e continuidade, apesar de todas as declarações firmadas pelo autor reconhecendo que os trabalhadores que contratava prestavam serviços em sua propriedade rural sob a condição de "avulsos".

Ademais, a prova testemunhal colhida na via judicial, sob o crivo do contraditório, ratificou que o labor era exercido sem vinculo empregatício, pois as testemunhas ouvidas afirmaram, de forma unânime e coerente, que o trabalho na propriedade do autor se dava eventualmente, normalmente em época de colheita.

Dessa forma, considerando que as contribuições foram continuamente e integralmente lançadas na qualidade de "empregado", não se restringindo aos dias de serviço realmente trabalhados e de forma proporcional, a desconstituição da NFLD e do Auto de Infração é medida que se impõe, sem prejuízo de, respeitando o prazo prescricional, lançar o INSS o débito gerado pelo não recolhimento das contribuições dos trabalhadores que prestaram serviços ao autor sob a correta classificação desses.

Posto isso,

Julgo procedente os pedidos formulados na exordial e extingo o processo com julgamento do mérito, com base no artigo 269, inciso I " do Código de Processo Civil, para o fim de anular o lançamento tributário consubstanciado na Notificação Fiscal de Lançamento de Débito n° 35.236.997 -3 e no auto de infração DEBCAD Nº 35.236.998-1, no que pertine ao autor.

(.....)

6- A ação foi elaborada e promovida pela advogada Maria Inês Prybysz de Paula, do Sindicato Rural de Toledo. ** Esta sentença ainda não transitou em julgado e deverá ser objeto de recurso de apelação da parte do INSS. Porém, já se constitui em uma grande vitória dos produtores rurais, visto que os bóias-frias são tidos como trabalhadores autônomos na legislação previdenciária, cabendo a eles, ou aos sindicatos e associações de mão-de-obra, promover o recolhimento da contribuição previdenciária a cargo destas categorias de trabalhadores.

Quanto ao mérito, esta decisão deve ser a primeira em âmbito de varas federais a reacender a discussão da necessidade de reconhecimento da categoria de trabalhadores rurais avulsos, e, assim, eliminando-se o problema do acesso do "bóia-fria" à aposentadoria e de seus dependentes aos demais benefícios da previdência social.

Lembramos que esta categoria de trabalhadores rurais só tem acesso aos benefícios do INSS através de "favores", principalmente os obtidos de políticos mal-intencionados que prejudicam a relação de trabalho no meio rural.

Concluindo, acrescente-se os problemas de ordem social que surgem nos períodos de entressafra, e a da idade avançada destes trabalhadores, prejudicando a categoria na falta de comprovação da permanência no exercício da atividade. Estas situações poderão ser resolvidas através de uma entidade sindical ou associação que represente-os e identifique-os efetivamente.

João Cândido de Oliveira Neto

Consultor de Previdência Social


Boletim Informativo nº 888, semana de 7 a 13 de novembro de 2005
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

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