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Função social do contrato Ao tempo da vigência do Código Civil de 1.916 a doutrina relativa aos pressupostos do direito contratual estipulava poucos limites à vontade das partes em estabelecer o pacto. Estabelecia restrições apenas relativas a legislações específicas, algumas apenas anunciadas no Código, como o direito de vizinhança, posturas, inquilinato, jazidas mineralógicas, espaço aéreo e subterrâneo, leis enfitêuticas de marinha, navegação, expropriações legais, enfim delineava alguns limites administrativos ao direito de contratar. Mas com relação ao contrato em si, nem sequer a teoria da imprevisão conheceu o seu apogeu, sendo admitidas em casos especialíssimos na doutrina, e assim mesmo, com muitas reservas. Em outros termos, estabelecidas as cláusulas contratuais pelas partes estas se subordinavam totalmente ao “pacta sunt servanda”, sendo raras as intervenções judiciais, mediante sentença, que quebrantassem aquela vontade contratual das partes, ante a rigidez da validade e prevalência da avença. Enfim, reinava absoluta a liberdade de contratar sem peias ou amarras, e foi assim, por todo o século passado. Esse substrato pretérito foi radical-mente modificado pelo atual Código Civil (Lei nº 10.406/2003), divorciando-se intensamente da antiga doutrina que presidia a interpretação da norma contratual sob a égide do velho Código. A criação mediante lei expressa (artigo 421) da função social do contrato incidente sobre a liberdade de contratar impregnou as relações jurídicas contratuais de subjetivismo intenso. O dispositivo assinala “ a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”. Decorre daí a plena possibilidade do questionamento judicial do contrato, principalmente daqueles desligados de leis de regência especiais (inquilinato, posturas municipais, etc). Os pactos contratuais de natureza civil, regrados apenas pelos dispositivos do Código atual, podem encerrar múltiplas demandas judiciais, em se tratando de interpretações alusivas ao instituto da função social, agora antevisto em lei, de forma direta e frontal, capaz de nulificar a avença desde que esta não tenha acatado os seus limites. Mas, a dificuldade nasce da identificação das situações fáticas em que teriam sido extrapolados os limites da função social, até porque, o grau de subjetivismo é forte na espécie. O próprio legislador preferiu não optar por definições ou aponte de circunstâncias ensejadoras dessa função social. Deixou, assim, à cargo do exame judicial cada situação isolada, a qual dependerá da cognição plena do processo sopesada pela prova. Porém, não resta dúvida de que o alcance e teor do instituto da “função social” possibilitam a mais variada gama de interpretações, oferecendo oportunidades de revisão do contratado, não mais preso às amarras antigas do vetusto Código, isto é, plena liberdade de avença.
Djalma Sigwalt é advogado, |
Boletim Informativo nº 885, semana de 17 a
23 de outubro de 2005 | VOLTAR |