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Genoma café |
Estamos nos acostumando aos sucessivos mapeamentos cromossômicos, tecnologia dominada por grupos científicos brasileiros, o que nos coloca no estado da arte mundial no setor. Tudo começou com a visão de futuro dos dirigentes da FAPESP, que enxergaram longe e souberam entender a importância que o tema teria para a melhoria da qualidade de vida e para os negócios, no futuro que já bateu à nossa porta. Pioneirismo - A bem da verdade, em 1986, na condição de chefe geral da Embrapa Soja, propusemos um consórcio internacional (Brasil, FAO, China, Japão, EUA) para o mapeamento genético da cultura da soja. Para a época, era uma proposta ousada e muito avançada e, em parte, não foi entendida pelos parceiros. Porém, em parte, ela foi muito bem entendida, sim senhor(a), razão pela qual os países mais avançados preferiram fechar-se em copas a facilitar a vida dos emergentes. O insucesso do episódio foi uma lástima, pois teria permitido ao Brasil dez anos de antecipação nas pesquisas de mapeamento genético. Mesmo assim, a partir da rede ONSA, financiada pela FAPESP, foi possível criar diversas equipes de excelência, que nada ficam a dever às melhores do mundo. O sequenciamento - Parece um bicho de sete cabeças - mas não é tanto assim. Com equipamentos de última geração e cientistas experientes e bem treinados, é possível identificar as seqüências genéticas de um organismo, para melhor utilização de seus genes, em benefício da Humanidade. Na prática, a partir de material genético presente nas células de diversos tecidos do organismo alvo, efetua-se a extração do RNA, organizados em bibliotecas, sendo efetuado o sequenciamento, donde se obtém a ordem correta das bases que compõem o gene. As bases são adenina, timina, guanina, citosina, representadas pelas letras ATGC. Parece simples, mas trata-se de um estudo caro, demorado e que exige muito treinamento e experiência dos cientistas. EST - Justamente por ser caro e demorado, diversos projetos optaram pela técnica denominada EST (Etiquetas de Seqüências Expressas). Na prática, significa que, ao invés de mapear integralmente todo o cromossomo, os cientistas fazem o mapeamento apenas daqueles genes que possuem interesse imediato. Por exemplo, podem ser aplicados estresses na planta, como redução da disponibilidade de água ou o ataque de uma bactéria, verificando, nos diferentes tecidos da planta, quais genes estão sendo expressos, ou seja, estão ativos. Com esta técnica, os estudos são mais bem focados, mais rápidos e com orçamentos compatíveis com a disponibilidade de recursos. Café - Esta cultura sempre esteve presente na agricultura familiar, sendo um dos melhores exemplos de como obter sucesso em pequenas áreas. A Embrapa Café lidera o Consórcio B do cafeeiro, cuja face visível é um banco de dados contendo 200 mil seqüências de DNA. A partir dessa biblioteca, foram identificados mais de 30.000 genes, responsáveis por diversos processos na planta. Benefícios - Obviamente que o sequenciamento é apenas uma etapa. De posse do conhecimento auferido pelo mapeamento genético, os agrônomos podem, agora, introduzir, com rapidez e facilidade, características no cafeeiro, que se constituam em demandas da cadeia produtiva. Por exemplo, será possível obter plantas mais produtivas, tolerantes à seca ou resistentes às pragas. Torna-se possível, também, melhorar a qualidade do produto, criando variedades que produzam bebidas com melhor sabor e aroma, com menos cafeína, ou com outras características nutritivas ou funcionais, de interesse do consumidor. Com o auxílio do sequenciamento genético, poderemos antecipar esses benefícios em até 20 anos, justificando o investimento da sociedade na pesquisa. O autor é Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja
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Boletim Informativo nº
877, semana de 15 a 21 de agosto de 2005 | VOLTAR |