Multa e eventual exclusão
no financiamento rural


Oartigo 71 do Decreto-lei nº 167/67, verdadeira lei de regência do financiamento rural, estipula, que, em caso de inadimplência do mutuário rural perante cédula ou outro qualquer título oriundo do crédito rural, obriga-se ele a arcar com a responsabilidade da multa. Porém, o dispositivo apresenta temperanças necessárias. Surgem situações, algumas comuns no financiamento rural, que a mora originadora da multa, não é do devedor mas sim do credor.

Basta que o credor tenha exigido encargos indevidos ou valores erroneamente calculados para que se transfira a responsabilidade da mora, incorrendo ele credor em mora, e não o devedor, apesar da aparente inadimplência. Nas situações de mora do credor diz-se que não há a mora "solvendi", do devedor. Inexiste, pois, a mora "debitoris" imputada apenas ao mutuário. Em seu lugar surge a mora "accipiendi", isto é, a mora do credor, que com seu ato deu ensejo à impossibilidade de pagar pelo financiado (devedor), obrigando-o a debater o seu direito mediante demanda que se instalou para isso, seja em ação direta ou indireta (ação incidental de embargos do devedor), ou ainda qualquer outra forma procedimental em que o tema seja posto, alinhado e discutido.

Na realidade, a cobrança excessiva de valores, seja pertinente ao principal ou encargos excessivos ou não devidos, por contrato ou pela lei, geram a mora do credor e a sua responsabilidade perante o fato. Contudo, se extingue a obrigação ao mutuário rural sob a chancela da multa preconizada no artigo 71, do Decreto-lei nº 167/67. Constata-se, pois, que havendo exigência indevida pelo credor não se pode vislumbrar mora do devedor, e assim, não é de se admitir postulação de multa.

No que concerne à multa oriunda do financiamento rural, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça (STJ) de modo específico em favor da exclusão, em situações de mora do credor, conforme se vê do acórdão adiante reproduzido parcialmente: "... 2. Multa de 10% (Decreto-lei nº 167/67). Conforme precedente da 3ª Turma. Considera-se indevida uma vez que se reconheceu ter o devedor motivo para não efetuar o pagamento nos termos pretendidos (REsp 163.884, DJ de 15.3.99). 3. Recurso especial não conhecido." (REsp nº 135.743/RS, Terceira Turma, Relator Ministro Nilson Naves, DJ de 25/10/99).

Em outro julgado envolvendo multa, mora e crédito rural, surge referência ao entendimento pacífico da Segunda Seção do STJ, relatoria do Ministro César Asfor Rocha: " Agravo em Recurso Especial. Crédito Rural. Juros. Limitação. Ausência de autorização do CMN. Capitalização mensal dos juros. Súmula n. 5/STJ. Afastamento da mora. Precedentes do STJ. Agravo desprovido. (...) A cobrança de encargos indevidos pelo credor afasta a mora do devedor, nos termos do entendimento pacificado na Segunda Seção desta Corte. Subsistentes os fundamentos do decisório agravado, nega-se provimento ao agravo." (AgREsp 399.937-RS, por mim relatado, DJ de 12.05.03).

Observa-se que a aplicação do dispositivo relativo a multa, contido no artigo 71 da legislação regente, não tem qualquer aplicação, desde que a mora seja do credor através da tentativa de cobrança de valores ou encargos indevidos, justificando-se, nesse caso, a resistência do devedor de mútuo rural visto inexistir a inadimplência.


Boletim Informativo nº 874, semana de 25 a 31 de julho de 2005
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

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