Arroz Dourado O arroz dourado é um arroz transgênico que contém altos teores de beta-caroteno, o precursor da vitamina A. Ele foi desenvolvido para auxiliar a reduzir a mortalidade ou a cegueira causadas pela deficiencia de vitamina A nos países pobres, cuja alimentação básica é o arroz. Entretanto, ele possui um potencial de mercado invulgar nos países ricos. Seu desenvolvimento representou não apenas um sucesso científico mas uma quebra de conceitos entre dois pólos: o senso humanitário e a necessidade de lucros. Perda de nutrientes - O arroz que compramos no supermercado sofre um processamento que elimina as camadas externas do grão, restando apenas o endosperma. Este é composto de amido e algumas proteínas. A eliminação da parte externa, a aleurona, rica em óleo, evita a rancificação do arroz. Ocorre que o processamento não elimina apenas o óleo, porém diversos nutrientes presentes nesta camada, inclusive a pró-vitamina A. Essa é a causa principal da deficiência de vitamina A nas populações que têm no arroz a base de sua alimentação. Melhoria - Os agrônomos vinham tentando, há muito tempo, aumentar o teor de vitamina A no endosperma do arroz. Como não existe nenhuma variedade cultivada ou selvagem, que produza vitamina A no endosperma, apenas a biotecnologia pôde melhorar o arroz. Isto foi possível porque a técnica de regeneração do arroz está completamente dominada, bem como a bioquímica da produção dos carotenóides precursores da vitamina A é conhecida. O genótipo transgênico recebeu os genes psy e lyc, clonados de Narcissus pseudonarcissus e cryt1, clonado de Erwinia uredovora. A primeira planta produz uma flor muito bonita (daffodil) do Norte da Europa, enquanto E. uredovora é uma bactéria, porém ambos expressam altos teores de pró-vitamina A. Os cientistas também adicionaram a esse genótipo um gene que aumenta, consideravelmente, o teor de ferro no grão de arroz. Assim, além da deficiência em vitamina A, o novo genótipo também combate a anemia ferro-priva. Propriedade intelectual - Através da biotecnologia, é possível introduzir características desejáveis, que não são encontradas nos genótipos do organismo em estudo, antecipando em muitos anos o lançamento de novas cultivares melhoradas. Entretanto, gerar uma nova variedade transgênica não é tarefa fácil, muito menos barata. No caso do arroz dourado, foi necessário formar um time de cientistas de primeira linha, envolvendo diversas universidades e empresas privadas. Cada qual entrou com o seu conhecimento, seus equipamentos, suas patentes e suas fontes de financiamento. Ao final, obteve-se um genótipo com as características desejadas, cuja propriedade pertencia tanto a entidades públicas como a empresas privadas. Como fazer para tornar este genótipo, com alto custo de pesquisa, acessível às populações carentes e necessitadas? Acordo - A Syngenta, empresa privada que participou do projeto, abriu mão dos royalties sobre as variedades transgênicas, desde que cultivadas em países pobres. Em contrapartida, ela pode cobrar royalties de cultivares desenvolvidas nos países ricos, cujos consumidores podem pagar pelo arroz melhorado. Existe um Painel Humanitário, que se reúne regularmente, e que autoriza o acesso do material genético aos países pobres. A partir de 2001, o IRRI (International Rice Research Institute), baseado nas Filipinas, está autorizado a desenvolver novas cultivares de arroz dourado, apenas para os países pobres. O Instituto recebeu em seus laboratórios pesquisadores vietnamitas, que melhoraram suas antigas variedades. A China, maior consumidor mundial de arroz, também deve se beneficiar deste genótipo. Outros países do Sudeste Asiático, da África e da América Latina também são elegíveis para receber o material, isento de roialties, uma vez demonstrada a necessidade e a dificuldade de seus cidadãos para pagar os roialties. Este acordo marca uma nova era no tratamento dispensado às patentes tecnológicas, trazendo para o mundo real a responsabilidade social das empresas. |
Décio Luiz Gazzoni é engenheiro agrônomo da Embraba Soja |
Boletim Informativo nº 867, semana de 06 a 12 de junho de 2005 | VOLTAR |