Competitividade e
investimento em tecnologia
Décio Luiz Gazzoni

A Embrapa completou 32 anos de profícua existência. Para comemorar a efeméride, ao invés de texto laudatório, proponho uma reflexão. A inserção do Brasil no mercado globalizado pressupõe a manutenção de alta competitividade do seu agronegócio. Uma das pilastras da competitividade é o estado da arte tecnológico, o que impõe a existência de sistemas de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) e de Transferência de Tecnologia (TT) condizentes com as metas que o país se propõe a atingir, na disputa pelos mercados.

Os números - Os sistemas de PD&I e de TT existentes no Brasil demonstraram sua capacidade de alavancar e sustentar a competitividade do agronegócio brasileiro. O setor responde por 34% do PIB nacional, por 37% da oferta de empregos e pela totalidade do saldo na balança comercial, devendo angariar divisas líquidas superiores a US$30 bilhões, no corrente ano, apesar de S. Pedro, dos juros, dos impostos e da valorização do real.

Esgotamento - Diversos problemas de ordem estrutural e macro-econômica, vinculados às políticas de estabilização da moeda e de inserção do Brasil no mercado financeiro internacional, conduziram à compressão da capacidade de investimento do Estado. Além da dívida financeira – cuja quitação é prioritária para o governo e que atinge 60% do PIB - existem outras dívidas (social, de justiça, de infra-estrutura, educacional, de PD&I), de difícil resgate no horizonte visível, mantida a presente política governamental. A pressão tributária (real de 51% e praticada de 40-48%) ao tempo em que torniqueteia o desenvolvimento nacional, encontra-se em um patamar muito elevado, impedindo novos avanços tributários sobre o sistema produtivo.

Descompasso - A Embrapa, maior organização de PD&I do agronegócio, serve como exemplo do descompasso entre o investimento em PD&I e o crescimento das demandas, que aumentam com a pujança do agronegócio e o crescimento da população. Em 1977, três anos após sua criação, a Embrapa atingiu o pico orçamentário em relação ao PIB do agronegócio (0,46%). Após algumas oscilações, o orçamento de 1985 alcançou a segunda melhor relação histórica (0,40%). Este índice despencou para 0,13% em 2004, talvez o menor dos 32 anos da Embrapa.

Orçamento x consumidores - Em relação à população brasileira, o melhor orçamento da Embrapa foi o de 1982, quando o investimento per capita equivaleu a R$8,02 (valores atualizados). Atualmente, esse investimento é de R$4,28, semelhante ao de 1977. Pontualizando para a soja, o produto mais importante do agronegócio nacional, o orçamento da Embrapa Soja de 1990 equivaleu a 0,4% do valor da produção da soja brasileira. Em 2004, este valor foi de 0,05% - oito vezes inferior ao índice observado há 14 anos.

Tecnologia e competitividade - Não apenas o agronegócio cresceu, aumentando proporcionalmente as demandas. Ocorre que elas tornaram-se mais sofisticadas, o consumidor ficou mais exigente, o Brasil passou a ser um player respeitado no mercado internacional, firmamos acordos bilaterais, multilaterais ou internacionais, que nos obrigam a dispor de um sistema de PD&I com nível de excelência equivalente aos melhores do mundo. Caso contrário, como garantir a nossa competitividade? Como contra-arrestar os subsídios agrícolas? Como contrapor-se às barreiras sanitárias, como ocorreu recentemente com os focos de aftosa, a calúnia da BSE ou o affair da soja na China?

Novo modelo - Para resolver a inequação resultante da falência do Estado como provedor de PD&I e TT e as demandas crescentes - e cada vez mais sofisticadas do sistema produtivo – proponho que se discuta um novo modelo em que, solidária, complementar e suplementarmente ao Estado, os atores do agronegócio invistam no que, talvez, seja seu insumo mais importante: tecnologia adequada. Em tempos de metáfora, poderíamos dizer que isto será a salvação da lavoura.

Décio Luiz Gazzoni é Engenheiro
Agrônomo da Embrapa Soja


Boletim Informativo nº 863, semana de 9 a 15 de maio de 2005
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

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