|
Índice de produtividade
rural: perguntas que merecem respostas Sonia Racy |
Helton Perillo Ferreira Leite, engenheiro agrônomo de Lorena, enviou à coluna (publicada no O Estado de S. Paulo) algumas considerações interessantes sobre a proposta do aumento dos índices mínimos de produtividade rural para fins de reforma agrária. Fala-se em adotar índices que reflitam a incorporação da moderna tecnologia. Leite pergunta: O governo se refere à agricultura que usa GPS, plantio direto, colheita mecanizada, adubação química, sementes mais produtivas, rações de alto potencial, animais de melhor carga genética, máquinas mais eficientes? Em caso afirmativo, destaca que ela não é acessível a todos. "Não existe mais no País um sistema eficiente de divulgação da tecnologia rural e o acesso é caro." O projeto, da forma como está sendo divulgado, fará um nivelamento por cima. E pergunta de novo: será que o produtor rural não tem o direito de não ser tão capaz quanto os melhores da região? Ou menos eficiente? "O industrial pode, o comerciante pode, o professor pode, o político pode, o médico pode. O produtor rural, não? Será que o produtor menos eficiente sobreviverá às exigências atuais do mercado? Não seria aceitável que o próprio mercado decidisse sobre sua permanência?" É fato que grande parte da tecnologia que permite alta produtividade só é viável para produções extensivas, em larga escala. Criticadas como antiecológicas ou antinaturais. "Aquelas exigências prejudicarão os pequenos produtores, a produção familiar e até os assentados da reforma agrária. O argumento de que para os pequenos basta o associativismo, o cooperativismo e que em grupo terão acesso a máquinas mais produtivas (e mais caras), que se tornarão viáveis com seu uso intensivo, é duvidoso", diz, lembrando que as primeiras cooperativas criadas no Brasil foram as de leite e, mesmo assim, apenas 20% do leite produzido aqui é processado por elas: no resto do mundo ocupam até 90%. "Lá fora, o sistema protege o cooperado e sua cooperativa, aqui ninguém liga. Será diferente amanhã?" Alta produtividade geralmente implica alto índice de mecanização, que estimula o desemprego rural. E quanto mais sofisticada a tecnologia, maior a exigência em escolaridade. Como estão nossas escolas rurais? "Não basta atingir índice de produtividade, é necessário saber sobre lucratividade, viabilidade financeira. Teoricamente é possível obter altíssima produtividade do milho, da soja ou da vaca. Mas, para isto ser economicamente interessante, é preciso que dê lucro", coloca. E isto muda ao longo do tempo já que os insumos têm preços alterados por taxas diferentes. "Assim é possível que certa produtividade seja interessante em 2004 e não em 2005. Alta produtividade não significa necessariamente alto lucro", diz. No Brasil, explica Leite, existe um sistema de classificação do solo baseado em sua capacidade de uso sustentável, um conceito antigo. "A exigência de altos níveis produtivos nem sempre respeita a capacidade produtiva do solo, ou do ambiente. Para garantir alta produtividade é esperável o uso de mais adubos químicos, de mais agrotóxicos. Seria isto interessante para o ambiente? Seria sustentável para todos os solos?" Erosão, assoreamento dos rios e enchentes são sintomas do uso intensivo e inadequado do solo. "Parte do cerrado brasileiro tem 1 bilhão de anos. Merece mais respeito." E como ficarão os produtores orgânicos que não buscam alta produtividade, mas sim qualidade e sustentabilidade da produção? Serão prejudicados? O boi orgânico ou o boi verde, alimentados a pasto, deverão ter sua alimentação alterada, ficando suscetíveis à vaca louca (que atinge bovinos alimentados com rações com resíduos animais)? As aves e suínos em alto índice de confinamento também podem ser vulneráveis a novas doenças como a gripe do frango. O mesmo se dá com as plantas: quanto maior a exigência de produtividade maior o risco sanitário. Finaliza Leite com a pergunta: O caminho correto seria mesmo exigir alta produtividade para todos? A qualquer custo? Não haveria opções mais adequadas? "Alega-se que os índices têm cerca de 30 anos e estariam defasados. Será que o método de aferição baseado em rendimento em peso por área também não estaria defasado?" Com a palavra, o Ministério da Reforma Agrária. Na frente - Em conversa com a coluna, o ministro Roberto Rodrigues ponderou que este é um péssimo ano para mudar índices. "No Sul, houve uma perda enorme de produção, por causa da seca, que levou a uma queda da renda. Com aumento dos custos de produção, a produtividade agrícola caiu." Rodrigues esclarece que não está dizendo que a revisão é necessária. Diz que ela precisa ser discutida e que a questão tem de passar pelo Conselho Nacional de Política Agrícola. Para o ministro, é preciso olhar a questão de maneira conceitual. Por um lado, o agricultor tem de modernizar sistemas, levando em consideração que a terra tem que cumprir papel social e a produtividade agrícola é uma parte da função social. Por outro, na mesma linha de raciocínio, quem se moderniza investindo em tecnologia busca ser mais competitivo. Pergunta o ministro: Qual é o prêmio para quem se modernizou e cresceu? "Precisamos pôr frente a frente os dois conceitos: o da produtividade como instrumento de função social da terra e o do crescimento em investimentos, que leva ao aumento da produtividade um castigo para quem investiu." |
|
|
Boletim Informativo nº 862,
semana de 2 a 8 de maio de 2005 |
VOLTAR |