Depositário na alienação
fiduciária, prisão e STJ

Na garantia de alienação fiduciária, contrato acessório, quase sempre integrante do mútuo financeiro, surge uma situação de depósito atípico. O substrato legal da garantia fiduciária se fixa no Decreto-lei nº 911/69, anterior à Constituição de 1988, portanto, momento pretérito ao preceito constitucional de hipóteses de prisão civil, no caso em que o devedor fiduciário deixa de entregar ao credor fiduciante, sem justa causa, o bem dado em alienação fiduciária, ou a quantia equivalente em dinheiro.

A Carta Política prevê apenas as possibilidades de prisão civil envolvendo dívida de alimentos e de depositança infiel. É o que se denota do artigo 5º, LVII, ao afirmar que "não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel". Inobstante o dispositivo constitucional não fazer a distinção entre o depositário judicial de bens (em ação judicial) do depositário particular (pignoratício, fiduciário, etc.), a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendido que, é descabida tal prisão para o devedor fiduciário, não se compreendendo aí a figura do depositário infiel. No primeiro, o depósito é público (procedimento judicial), no segundo é particular (contratual).

Em recente acórdão a Quarta Turma do STJ referenda julgados anteriores no mesmo sentido, isto é, da impossibilidade jurídica da prisão civil nascida de dívida fiduciária, ao enunciar, em sua ementa, dessa forma: " CIVIL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PRISÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1 – Conforme pacificado pela Corte Especial não se admite prisão civil, decorrente de dívida oriunda de contrato de alienação dado que descabida, nesses casos, a equiparação do devedor à figura do depositário infiel. 2 – Ordem concedida. Acórdão. Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conceder a ordem de habeas corpus. Os Ministros Aldir Passarinho Júnior, Jorge Scartezzini, Barros Monteiro e César Asfor Rocha votaram com o Ministro Relator. Brasília, 22 de fevereiro de 2005 (data de julgamento). (Hábeas Corpus nº 39.656-SP, DJ de 21/03/2005, pág. 382).

Em realidade, embora o cotejo de entendimento oposto entre o STJ e o STF, a Corte Especial do STJ, conforme os julgados definidos nos EREsp nº 149.518/GO, Relator o Ministro Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 28/02/2000, e HC nº 11.918/CE, Relator o Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ de 10.6.02, firma-se no sentido de não admitir a prisão civil de depositário infiel vinculado a contrato de alienação fiduciária. A compreensão sobre o tema no Supremo mostra-se diametralmente oposta. Tratam-se de interpretações jurídicas diversas.

Em recente decisão do STJ, DJ de 18.3.2005, da lavra do Ministro Castro Filho, no AI nº 655725/RS, constata-se da ementa, a manutenção do entendimento anterior consagrado na Corte Especial do Tribunal, ao que se observa: " Processual Civil. Recurso Especial. Alienação Fiduciária. Ação de Depósito. Prisão Civil. Impossibilidade. Precedentes. Impossibilidade da prisão civil do devedor de contrato com alienação fiduciária em garantia (Corte Especial, EREsp nº 149.518/GO, DJ de 28.02.2000). Agravo de instrumento improvido."

Na esteira das decisões firmes do STJ verifica-se o entendimento de que não é legítima a prisão do devedor que descumpre contrato garantido por alienação fiduciária.

Djalma Sigwalt
é advogado, professor e consultor da Federação da Agricultura do Paraná


Boletim Informativo nº 862, semana de 2 a 8 de maio de 2005
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

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