Os juros remuneratórios
e o novo Código Civil

Não se confundem os juros moratórios com os juros remuneratórios, pois os primeiros se aplicam em caso de mora, isto é, atraso no adimplemento da prestação contratada. Todavia, os juros remuneratórios são aqueles ditos contratuais, porquanto na vigência do mútuo financeiro ou contrato equivalente remuneram o capital. Portanto, tipos de juros completamente diversos.

No antigo Código Civil os juros contratuais ficavam a cargo das partes no que tange ao percentual (art. 1262), tendo sido necessária a edição do Decreto nº 22.626/1933, para que ocorresse regulamentação. E a interpretação do alcance da “Lei da Usura” é conhecida, no respeitante à Súmula nº 596/STF. Limitou-se o vetusto Código a fixar parâmetros (art. 1.062) aos juros moratórios, apenas. Daí a construção pretoriana, ao longo de décadas, no exame da questão, seja através de direito sumular ou legislação especial.

Mas o Novo Código Civil trata a hipótese legal de forma diversa. Envereda no artigo 591, afirmando textualmente que, “Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406, permitida a capitalização anual. “Assim, disciplina a anualidade da capitalização, bem como traça extremas para a incidência de juros remuneratórios ou contratuais. 

E, por seu turno, o artigo 406, estabelece o teto para o juros moratórios, quando estes provierem de determinação da lei, a fixação segundo a “taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.” Na legislação tributária atual tratar-se-ia da Taxa SELIC, a qual depende das oscilações do mercado, constituindo-se efetivamente de instituto insólito para o fim pretendido.

Discorrendo sobre o tema, prevalece o acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (Nona Câmara Cível), examinado no despacho do Ministro Barros Monteiro (STJ, RE nº 704.867/RS, de 09.02.2005), que explicita em certo trecho a sistemática possível de cálculo dos juros, assim: “Acresça-se ainda a todos esses óbices a circunstância de que a taxa SELIC é uma taxa do mercado financeiro, estabelecida mensalmente para fixar a remuneração dos títulos da dívida pública do Governo Federal. Muito estranho seria que uma nova codificação, que levou décadas para ser finalmente aprovada, subordinasse um ponto central de seu regramento, destinado a regular de forma segura a relação jurídica entre as pessoas, aos humores do mercado financeiro, atrelando os juros dos débitos judiciais e extrajudiciais à cotação dos papéis da dívida pública. Por outro lado, a sua substituição por outro índice não é tarefa simples, porque estamos a tratar de juros legais, portanto juros estabelecidos por lei, aqui especificamente o art. 406 do novo Código Civil. Penso, todavia haver uma solução: ser considerado como taxa legal de juros o percentual de 1% ao mês, 12% ao ano. Trata-se do percentual previsto pelo art. 161, § 1º do Código Tributário Nacional, aplicável em matéria tributária sempre que a lei não dispuser de modo diverso. Tem, portanto, nossa legislação tributária um índice permanente de aplicabilidade imediata sempre que a legislação específica deixar de enfrentar a matéria... omissis ... E, nesse caso, mais uma vez a solução apontada pela lei são juros de 1% (art. sobre ‘ Os juros legais do novo Código Civil e a inaplicabilidade da taxa SELIC’ , de Pio Giovani Dresch, Juiz de Direito, publicado na Revista da AJURIS, 87, 1.1., págs. 217/218). Conclui o ilustre magistrado que: “ A utilização deste percentual (de 1%) não apenas dará resposta adequada aos problemas acima apontados, como igualmente permitirá enfrentar a contento a estranha disposição do art. 591, que veda a fixação de juros em índice superior ao dos juros legais. Esta é a única solução para que não se considere essa proibição como uma limitação ainda mais restritiva que a do art. 192, § 3º da CF/88, o que não me parece que seria bom para os negócios jurídicos.” (fls. 123/125). As razões do recurso especial não cuidaram de impugnar esses fundamentos expendidos pelo julgado ora combatido. A irresignação do recorrente ficou restrita à impossibilidade de limitar-se a taxa de juros em face do que reza a Lei nº 4595, de 1964.” 

A questão conforme posta no acórdão merece reflexões, e provavelmente, será alvo de manifestações jurisprudenciais futuras, ante a sua importância e alcance.

Djalma Sigwalt
é advogado, professor e consultor da Federação da Agricultura do Paraná


Boletim Informativo nº 860, semana de 18 a 24 de abril de 2005
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

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