Bovinocultura de Corte |
Como produzir qualidade? |
O que é qualidade? Objetivamente, a qualidade que qualquer produto deve ter é definida pelos compradores deste produto. São eles que decidem os atributos, e vão à procura destes atributos a cada compra. Os vários estudos sobre a qualidade da carne bovina apontam, quase sempre, para maciez, sabor e cor. São muitos os fatores que influenciam na obtenção dos atributos desejáveis, até a carne chegar à mesa do consumidor, começando na produção, passando pelo transporte do animal vivo, cuidados no pré – abate, abate e pós- abate, no processamento e embalagem, indo até a gôndola do supermercado ou o balcão do açougue. Para o objetivo proposto neste artigo, o que nos interessa são os fatores que estão sob a responsabilidade do produtor. Ou seja, aquelas ações que acontecem dentro da porteira ou, no máximo, até chegar ao abatedouro e que serão decisivos para que o produtor possa negociar melhor com o comprador. Começa com a definição da raça; passa pela alimentação dos animais e pelo manejo despendido à eles durante sua vida. Mas, nunca é demais lembrar que, para conseguir bom preço, existe ainda a necessidade da organização dos produtores para que possam ter qualidade com volume e manter uma oferta constante. Por outro lado, cada mercado tem suas peculiaridades. Tratando-se de mercado externo, além dos citados acima, três outros aspectos estão crescendo em importância e aumentam a competitividade dos produtores, que já se conscientizaram de sua necessidade. São os aspectos ambiental, social e o bem- estar- animal. Os três pontos, se ainda não estão remunerando a mais já são o diferencial nas negociações externas e, no futuro, serão a garantia de mercado. No mercado interno, o enfoque do alimento seguro está se difundindo rapidamente e é importante o produtor se atualizar a este respeito também. Dentre os fatores que influenciam na qualidade, vamos nos ater a três que são os principais e que dizem respeito aos produtores: a genética, a alimentação e o manejo dos animais.
Este fator é bastante polêmico. A discussão está relacionada à gordura entremeada e de cobertura, que variam entre as raças. A gordura entremeada irá se refletir no sabor e na maciez. A gordura de cobertura, pela sua capacidade de proteger a carne no momento do resfriamento nas câmaras frigoríficas, irá refletir principalmente na maciez. As raças européias apresentam um maior teor de gordura num período menor em relação à raças zebuínas, que precisam de um tempo maior para apresentar a gordura desejável. Este assunto vem evoluindo porque existe mercado para carnes gordas e carnes magras. Além disto, estão sendo realizadas pesquisas e já existem bons resultados no sentido de se reduzir a diferença entre as raças no que diz respeito à gordura. No mercado interno, ainda é pequena a demanda por esta diferenciação; mas no mercado externo, embora isto também esteja mudando, principalmente na Europa, a preferência ainda é por carne bovina de raças européias.
Este é o fator em que é possível obter-se grandes avanços aqui no Paraná. Temos condições climáticas para produzir a base de pasto e também porque existem opções para alimentar o gado na fase de terminação de maneira balanceada, o que é decisivo para a qualidade. Não só o volume de alimento, mas a sua qualidade e a oferta em condições favoráveis, interferem no resultado final. Um bom planejamento de pastagens para oferta durante a maior parte do ano, com estratégia de suplementação adequada em forma de silagem, feno, cana de açúcar ou resíduos industriais, em épocas de escassez, evitam os efeitos ainda comuns e que irão resultar no "boi sanfona" que ganha peso no verão e perde no inverno, além de atrasar o abate. Muitos pecuaristas usam tecnologia e têm bom desempenho fazendo planejamento e bom uso de pastagens. Mas não são a maioria e é preciso se desenvolver e maximizar no Paraná modelos, respeitando-se as peculiaridades regionais, que utilizem ao máximo o conhecimento existente. Outro ponto a ser lembrado é o avanço obtido na integração lavoura/pecuária, com ganho indiscutível para o produtor.
Este é um fator ainda não internalizado pela maioria dos pecuaristas e que tem muito a ver, também, com os trabalhadores na pecuária de uma maneira geral. O trato despendido aos animais no dia a dia interfere muito na qualidade da carne. Fatores como disponibilidade de água em quantidade e qualidade, a exposição a temperaturas extremas e a maneira como o peão conduz os animais nas atividades diárias ou no manejo sanitário, são os mais importantes. O tipo de manejo irá proporcionar maior ou menor stress aos animais, o que irá interferir na cor, no sabor e na maciez da carne. O bem-estar- animal tem sido uma preocupação cada vez maior em todo o mundo, não só pelas cobranças de ONGs que são contra os maus tratos aos animais, mas porque realmente interferem na qualidade final do produto. O grande desafio será mudar toda uma cultura conservadora existente principalmente entre os trabalhadores, que estão acostumados a um sistema que aprenderam de seus pais e que é difícil de mudar, ainda mais na ausência do patrão.
Recentemente foi divulgada uma entrevista no site "beefpoint" com o título "Geraldo Perri Morais: a qualidade como força na negociação com o frigorífico".Na entrevista, (www.beefpoint.com.br de 11/03/2005) o vice - presidente da Associação de Pecuaristas de Araçatuba, Geraldo Perri Morais, comenta como eles estão aperfeiçoando a relação com os frigoríficos a partir do quesito qualidade. É interessante a leitura para verificar a nova mentalidade que está nascendo no País nesta questão. È um exemplo de organização com responsabilidade, que tem na qualidade o ponto de apoio. Por outro lado, ainda é um conceito que precisa ser aprendido mas acima de tudo precisa ser assumido. Temos conhecimento de grupos de produtores que estão se organizando, sendo que na primeira vez, 90% dos animais entregues por um dos associados, apresentaram qualidade; na segunda entrega, 25%; e, na terceira entrega, somente 12% dos animais apresentavam o padrão negociado no início do trabalho. Após isto, ele foi suspenso até que voltasse a produzir conforme o acordo. Portanto, qualidade é tecnologia, é mão- de- obra qualificada, é processo, é disciplina e principalmente comprometimento com um uma causa coletiva com resultados para todos, daí a necessidade de excluir-se quem não quer colaborar. O negócio é profissional mesmo. Os percentuais citados no caso acima são reais e não são muito diferentes do que acontece na maioria dos casos. È uma questão de conscientização para a sobrevivência.
O Programa de Produção Paranaense de Carnes e Leite à Base de Pasto vem treinando técnicos em todo o Estado, promovendo eventos e participando em parceria com várias instituições ligadas à pecuária, com o objetivo de difundir tecnologias e conhecimentos, tentando motivar os produtores para que comecem a acreditar que vale a pena produzir qualidade. O SENAR sempre ofereceu cursos gratuitos aos pecuaristas. Somente para 2005, estão programados mais de 90 cursos em vários temas envolvendo a bovinocultura de corte para todo o Estado. A EMATER vem trabalhando com grupos de produtores, visando a produção com qualidade e o aperfeiçoamento da gestão nas propriedades. As Universidades Federal e as Estaduais, todas tem investido em pesquisa e capacitação em tecnologias voltadas à melhoria da produção. O IAPAR desenvolveu pesquisas sobre qualidade e que precisa ser melhor apropriadas por técnicos e produtores. O que precisamos melhorar é o acesso às informações existentes e a viabilizar a adoção por parte dos pecuaristas. A procura por informações de como produzir com qualidade vem crescendo por parte dos produtores em compasso lento porque hoje eles ainda não têm a remuneração pelo esforço a mais. Mas isto está começando a mudar. Esta mudança precisa ocorrer, porque, a quebra do circulo vicioso "qualidade ruim > preço ruim > falta de motivação para produzir qualidade> qualidade ruim > preço ruim... " dependerá do produtor; não há como fugir disto. Quem não acreditar nisto ficará para trás. Rubens
Ernesto Niederheitmann |
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Boletim Informativo nº 857,
semana de 28 de março a 3 de abril de 2005 |
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