Ainda em fase de dimensionar e contabilizar as perdas na safra atual, a agricultura brasileira vê-se diante de perspectivas preocupantes para a safra seguinte, 2009/2010: “Tudo indica que a situação poderá piorar para o agronegócio brasileiro”, diz o pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), Lucílio Alves.
Entre os problemas que se agravaram, estão as restrições ao crédito, a alta dos insumos e a menor demanda internacional pelos produtos agrícolas brasileiros. Este último fator pode diminuir a entrada de recursos no Brasil, tanto do setor de grãos quanto do setor de cargas.
"Em 2009, a rentabilidade do setor vai ser extremamente apertada, e aí volta-se para o governo. Provavelmente será necessária alguma intervenção, mas não há recursos disponíveis para que a intervenção se faça em grandes volumes para que alivie a renda do setor agrícola", avalia o pesquisador.
A perda de renda da agricultura brasileira está estimada em 8,7%, ou R$ 10,4 bilhões (de R$ 89,8 bilhões, na safra anterior, para R$ 79,4 bilhões). As contas são da RC Consultores. A CNA prevê que a quebra pode chegar a 10%, concentrada na dobradinha soja/milho, que responde por 80% do volume e 70% da renda.
Essa escassez de renda no campo repercutirá no restante da economia, com menos dinheiro para comprar carros, máquinas, equipamentos e eletrodomésticos e um volume menor de receita de exportação para o País.
Perdas concentradas
Quanto à estiagem, os comunicados de perdas feitos pelos produtores apontam uma concentração dos problemas no Paraná e Rio Grande do Sul. No Banco do Brasil, as perdas potenciais dos dois Estados somam 2.706 comunicados, ou 86,5% do total informado.
No Proagro, os virtuais prejuízos de paranaenses e gaúchos chegariam a 30.042 operações - ou 90% do total. Embora atingidos pela seca, os Estados de Santa Catarina e Mato Grosso do Sul têm condições extremas localizadas em algumas poucas microrregiões. No Proagro, os comunicados de perdas estão restritos a 3.328 operações catarinenses e apenas 112 sul-mato-grossenses.
No Paraná, líder na produção nacional de milho e feijão e o segundo em soja, a quebra na safra é de 23,4%. A maior queda na safra de grãos do Estado em 20 anos, segundo a Secretaria da Agricultura (Seab). São 5 milhões de toneladas a menos de feijão, soja e milho.
A Secretaria Nacional de Defesa Civil, do Ministério da Integração, registrou notificações de desastres climáticos em oito municípios do Paraná - Cafelândia, Santa Helena, Francisco Beltrão, Itapejara D’ Oeste, Irati, Manoel Ribas, Paranaguá e Santo Antônio da Platina.
Já em Santa Catarina, houve cinco comunicados em Dionísio Cerqueira, Jaguaruna, Nova Veneza, Praia Grande e Siderópolis. No Rio Grande do Sul, são 71 municípios atingidos pela estiagem, vendavais, tempestades, granizo ou inundações bruscas. Até agora, Mato Grosso do Sul não tem registros de desastres climáticos, segundo a Defesa Civil.
"Abril será o mês crítico para os agricultores", diz a assessora técnica da CNA, Rosemeire dos Santos. Segundo ela, apesar da redução nos volumes, uma maior quantidade de produto deve chegar ao mercado em abril, pico da colheita, o que deve derrubar preços e receita. Diferente de anos recentes, quando grande parte da produção era vendida antecipadamente, em 2009 isso não ocorreu por causa da falta de crédito. Hoje, diz ela, só 21% da safra já foi vendida. Em épocas normais, esse número chegava a 35%.
A maior disponibilidade de grãos para venda traz um certo alívio para a inflação no curto prazo. Mas a reversão no quadro inflacionário pode ocorrer se a falta de crédito persistir e afetar a expectativa de plantio para 2010. "Em 2009 a crise tangenciou a agricultura. Em 2010, deve pegá-la em cheio", diz Rosemeire dos Santos.