Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo no último dia 8, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, diz que o dinheiro será necessário para garantir a produção agrícola no próximo ano, sem risco de quebra.
Segundo ele, com o início do plantio da safra coincidindo com a fase mais aguda da crise financeira global, o setor agrícola brasileiro está precisando de pelo menos R$ 10 bilhões nos próximos dias para garantir a produção em 2009. Se os recursos não forem liberados, diz o ministro, há risco de uma quebra da próxima safra, porque "o trator já está no campo". Leia trecho da entrevista aos repórteres Fabíola Salvador, Adriana Fernandes e Beatriz Abreu, da Agência Estado:
Jornal O Estado de S.
Paulo - Com os preços das commodities em forte queda,
qual
é o cenário para a agricultura brasileira?
Reinhold Stephanes - Antes do agravamento da crise havia especulação
nos mercados futuros. Com a falta de liquidez, isso se retraiu e houve
retirada das posições nesses mercados. Não que a demanda mundial tenha
caído, mas os preços voltaram a um patamar intermediário, que ainda
remunera a produção, de maneira geral. Mas há problemas de preços em
alguns produtos.
Jornal
- Que produtos?
R. S. - Temos problema com algodão, milho e frango. O café tem recursos
próprios, o álcool no mercado interno é muito forte e não há problemas.
O arroz está em ordem e os preços continuam bons. O feijão, o boi gordo
e o suíno continuam bem. E o leite preocupa, embora o preço tenha se
estabilizado nos últimos 30 dias.
Jornal
- Há riscos de queda da demanda com a crise?
R. S. - Não se vai comer menos. Quando há diminuição de renda, os
primeiros itens que são cortados são os bens duráveis, automóveis,
geladeiras. As commodities agrícolas ficam mais para uma última opção
de corte num cenário de crise. Primeiro, se deixa de consumir o níquel,
o ferro...
Jornal
- Em que prazo os mercados devem se equilibrar?
R. S. - Eu acho que vai haver um período de três ou quatro meses de
ajustes. Hoje, os preços das commodities estão melhores. Esse ajuste
pode vir em dois, três ou quatro meses. Se mantiver esse nível de
crescimento de 1% a 2% na economia mundial e de 2% a 3% nos países em
desenvolvimento, continuará havendo demanda para a produção agrícola.
Jornal
- Quais são os problemas hoje para a agricultura no Brasil?
R. S. - O primeiro é de crédito. O Banco do Brasil conseguiu antecipar
R$ 5 bilhões que seriam usados no período de comercialização, e esse
dinheiro precisará ser reposto. Para os bancos privados, que estão sem
liquidez, nossos cálculos indicam necessidade de mais R$ 5 bilhões, que
podem ser liberados pela redução de depósitos compulsórios.
Jornal
- As tradings já informaram ao governo que não terão recursos, porque
elas mandaram o que tinham para as matrizes. E aí?
R. S. - Ou se cobre isso por bancos privados ou se faz um empréstimo de
dólares com opção de recompra para essas tradings. Elas propuseram
isso. As tradings compravam antes a safra ou forneciam fertilizantes.
Essas medidas estão sendo estudadas e seguem na mesma linha do que foi
anunciado ontem (anteontem) pelo BC.
Jornal -
Quanto as tradings precisam?
R. S. - Estimamos que esse setor estava aplicando R$ 4 ou R$ 5 bilhões.
Essas medidas precisam ser anunciadas em uma semana ou duas. O setor
está precisando de pelo menos R$ 10 bilhões, com urgência. Se eu não
conseguir os R$ 10 bilhões, grande parte dos produtores continuará
plantando, mas vai diminuir o uso de fertilizantes, de adubos. Tem
gente que vai semear sem eles. A produtividade poderá cair. Aí haverá
quebra de safra. O cenário ainda não é de quebra de safra, mas sem o
dinheiro o crescimento previsto de 5% da produção não vai acontecer.
Jornal
- Qual é a garantia de que esse dinheiro será disponibilizado?
R. S. - Tudo indica que vamos receber. A liberação de recursos para a
rede privada já está praticamente decidida. A discussão está entre R$
3,6 bilhões ou R$ 5 bilhões para os bancos privados. Quanto às
tradings, é que ainda não se tomou uma decisão. O ministro Mantega (da
Fazenda) anotou o pedido e disse que ia estudar a questão.
Jornal
- Além do crédito, há outros problemas?
R. S. - O segundo problema, que não temos solução no curto prazo, é o
aumento nos custos de produção devido à alta dos preços dos
fertilizantes. Quem comprou já comprou na alta. Isso gera impacto e vai
reduzir a renda. O terceiro problema é da comercialização, em seis
meses, quando o produto for ao mercado. E, aí, vamos precisar de mais
recursos e ter que garantir um preço que cubra o custo de produção. O
que é preciso entender é que o governo tem mecanismos e vai atuar, como
já estamos atuando no caso do milho, do trigo e do arroz, vendendo os
estoques.
Jornal
- A crise neste momento do plantio é menos prejudicial?
R. S. - Teria sido muito mais prejudicial se acontecesse na época da
colheita. Eu conversei com um grande produtor do Paraná, Mato Grosso e
sul do Piauí que disse que, como teve duas safras boas e vendeu bem,
poderá se autofinanciar. Levamos um pouco essa vantagem, porque saímos
de duas safras boas. E tem outro fato: depois que começar a rodar, não
pode parar. A terra está lá, a máquina está lá, o insumo, a semente, os
equipamentos. Não tem alternativa. Tem de
plantar.