O cenário de custos de produção em alta e preços internacionais menores, sinalizando possibilidade de redução de renda para o produtor, gera preocupação ao setor agropecuário. Após uma safra de resultados significativos, a pressão dos insumos nos custos de produção abre a possibilidade de reversão desses ganhos, com margem estreita de lucratividade.
As indústrias fornecedoras de insumos (sementes, fertilizantes, herbicidas e outros) reajustaram os preços em índices superiores à inflação. A proximidade do plantio da nova safra de grãos conduz à reflexão. Como será o comportamento dos preços internacionais na safra 2008/09?
Os preços continuarão nos patamares elevados, a taxa cambial sinaliza mudanças de rumo, os preços dos insumos afetarão o custo de produção dos principais produtos?
Essas e outras questões fazem parte das indagações mais comuns aos produtores rurais no momento de decisão de plantio. Os recentes acontecimentos na economia norte-americana, com a ajuda às grandes empresas do setor imobiliário, mais a concordata do quarto banco do país e a notícia de ajuda governamental de US$ 700 bilhões, colocaram o mercado mundial em estado de alerta. E como não poderia deixar de acontecer, as commodities agrícolas na Bolsa de Chicago registraram oscilações.
No mercado doméstico, num primeiro momento, esses fatores não causaram maior impacto. Os preços da soja e do milho não registraram variação. A cotação da soja no mercado paranaense permanece em R$ 46,00/saca. Quanto ao milho, o preço está estável em torno de R$ 20,00/saca.
Embora os fundamentos econômicos sejam sólidos e as reservas externas da ordem de US$ 207 bilhões, a situação não é de todo confortável. O Produto Interno Bruto (PIB), deverá crescer a taxas menores, entre 3% a 4% e os primeiros sinais de alerta deverão ser, futuramente, a redução das exportações brasileiras, aumento do custo do dinheiro no mercado internacional, a conseqüente diminuição de investimentos das empresas brasileiras. A atenção também deverá ser dirigida para os mercados compradores de produtos brasileiros.
Por outro lado, a taxa cambial tem sinalizado alta e há analistas trabalhando com a hipótese de dólar a R$ 2,10/US$1,00. Tal fator é positivo, pois favorece as exportações de commodities agrícolas.
É importante destacar que os preços internacionais da soja entraram o ano de 2008 em patamar elevado, acima de US$ 12,50/bushel (US$ 26,00/saca). A média histórica dos últimos dez anos é de US$ 6,00/bushel, correspondente a US$ 13,20/saca de 60 kg.
Já a média de preços futuros de janeiro a setembro (até dia 22), na Bolsa de Chicago, foi de US$ 28,85/saca de 60 kg, conforme demonstrado na tabela seguinte.
No mercado doméstico, os preços da soja, em linha com o cenário internacional, alcançaram patamares próximos daqueles registrados em 2004, claro que em situações diferentes.
O pico de preços ocorreu em julho/08, com cotação média de R$ 45,67/saca de 60 kg. A partir de agosto/08 observa-se um recuo nos preços recebidos pelo produtor devido a influência de variáveis externas, como a proximidade da entrada da safra norte-americana. A média de janeiro a setembro/08 é de R$ 42,30/saca de 60 kg. Conforme analistas do setor, os preços médios das commodities – soja, milho e trigo – deverão situar-se próximos dos valores observados no segundo semestre de 2008.
Contribuindo positivamente, o quadro de oferta e demanda mundial de soja em grão está com estoques ajustados. Quanto à questão climática, um outro importante fator, as sinalizações são de clima regular, sem a influência do El Niño ou La Nina.
Por outro lado, a pressão dos custos dos insumos e a taxa cambial, poderão comprometer a lucratividade dos produtores que deverá ser menor. Segundo a Secretaria da Agricultura e do Abastecimento do Estado do Paraná – SEAB, alguns componentes dos insumos, por exemplo os fertilizantes formulados, tiveram aumentos superiores a 100%.
As planilhas de custos da Companhia Nacional de Abastecimento – Conab prevêem que para a safra 2008/09 a soja sofrerá 33,4% de aumento nos custos variáveis e o milho 37,2% de aumento. No grupo dos custos variáveis é que são encontrados os fertilizantes defensivos, sementes e combustíveis, fatores que apresentam os maiores aumentos.
Nesse cenário da safra de 2008/09, sinalizando margens apertadas de lucratividade, o caminho para o produtor é a administração dos custos e não perder o foco na produtividade, em outras palavras, racionalização dos custos e eficiência (ganho de produtividade).
Um exercício prático permitirá visualizar melhor a estratégia: uma propriedade com produtividade média de 120 sacas/alqueire ou 50 sacas/hectare, supondo um acréscimo razoável de cinco por cento na produtividade, obterá 126 sacas/alqueire ou 52,5 sacas/hectare. O delta de seis sacas/alqueire ou duas sacas e meia/hectare, ao preço futuro março/09 de R$ 47,34/saca, possibilitará um acréscimo de renda de R$ 284,04/alqueire ou R$ 118,35/hectare.
Por outro lado, se o produtor diminuir a utilização dos insumos e a redução de tecnologia comprometer a produtividade, empregando o mesmo exemplo, supondo uma quebra de produtividade de cinco por cento, passará de 120 sacas/alqueire para 114 sacas alqueire e consequentemente, uma perda de renda de R$ 284,04/alqueire ou R$ 118,35/hectare.
Em relação às estratégias de comercialização, o produtor deve avaliar também os mecanismos de proteção de preços. Um exemplo prático ocorreu recentemente num banco que oferece aos seus clientes a proteção cambial para os contratos de soja. Uma agropecuária cliente foi orientada a vender Contratos a Termo de Moeda (Dólar-NDF) para abril e maio de 2009. O cliente fixou nesse banco, contratos no montante de US$ 155 mil, com prazo para 30 de abril de 2009 e o dólar a R$ 1,95, aproveitando as recentes altas da moeda americana. Dessa forma, como ele já tinha fixado anteriormente a venda da soja em USD31,00/saca, garantiu o preço de R$60,45/saca, ou seja, um piso na venda dos produtos em reais.
PARANÁ SOJA PREÇOS RECEBIDOS | Janeiro - setembro 2008
Já no crédito rural, a crise financeira dos Estados Unidos repercute também em alterações das normas de crédito ao consumidor de todo o mundo. Esse fator aliado à redução de depósitos à vista nos bancos brasileiros, principal fonte de recursos do crédito rural, faz com que os produtores tenham dificuldades no acesso ao financiamento da safra. Os bancos estão mais criteriosos com a liberação de financiamentos. Com o agravante que houve aumento real nos custos de produção. Na busca de novas fontes de financiamento, os produtores encontram alternativas com juros livres que encarecem ainda mais o custo financeiro da safra.
Além disso, as renegociações de dívidas rurais dos últimos anos, ainda vão repercutir negativamente nos ganhos dos produtores durante pelo menos mais quatro a oito anos.
Diante desse cenário, o produtor deve ter cautela ao fazer novos investimentos e criar novas dívidas. Apesar do produtor ter vindo de três safras de crise e de uma safra normal, houve aumento expressivo dos investimentos e financiamentos de novas máquinas. As vendas até setembro de máquinas agrícolas já ultrapassou o total vendido em 2007. Para corroborar a preocupação com uma nova onda de endividamento, os dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) mostram que no acumulado dos primeiros oito meses do ano, foram comercializados 35,5 mil unidades de máquinas agrícolas automotrizes, um crescimento de 47,8% sobre igual intervalo do ano passado. Nesse período, as colheitadeiras tiveram aumento de 127,9% e os tratores de 42,3%. Acompanhando esse aumento, os financiamentos do Moderfrota do BNDES tiveram crescimento de 31,8%, quando comparadas a evolução das duas últimas safras.
Gilda Bozza, Jefrey Kleine Albers e Pedro Loyola
Economistas do Departamento Técnico Econômico DTE /FAEP