A renda, a safra e o agricultor

Constata-se o crescimento da safra agrícola a cada ano. A produção continua respondendo intensamente na exportação brasileira. Elemento considerável do PIB nacional.  Mas, a renda de quem produz no campo, de modo geral, acha-se comprimida. A verificação simples desse fato é feita a partir do grande volume de venda antecipada em todo o País. Significa dizer que boa parte da colheita do início deste ano de 2008, já foi comercializada durante o ano de 2007. O que se mostra sintomático é que essa antecipação de venda já vinha ocorrendo até no primeiro semestre do ano passado. O que gerou tal situação foi a necessidade de capitalização do homem do campo no viso do plantio. Essa conjuntura de antecipação de venda, meses antes da colheita, afastou o produtor dos bons preços do mercado internacional praticados atualmente. Além disso, a escalada dos preços dos fertilizantes passou a exigir ainda mais envolvimento de capital. Em alguns casos, esse produtor já apresenta um passivo de dívidas relativas a safras passadas. Vê-se que a safra vai bem e muito, mas isoladamente, alguns profissionais da lavoura estão encontrando enormes dificuldades para manter-se na atividade.

A questão na verdade tem assombrado o campo há muito tempo. Trata-se da ausência de equacionamento entre custos e renda, envolvendo os preços de mercado. Não sendo esta suficiente, a atividade para alguns se torna deletéria. Principalmente para os pequenos e médios. Por essa razão desde 1964 o Estatuto da Terra, a primeira lei de fomento à produção do campo propriamente dita, preceituava uma política, embora incipiente, de oferta de preços de garantia a quem produz. Chega a preconizar de forma expressa uma margem de lucro percentual em favor do agricultor. Mas a idéia de 1964 acabou por ser acatada e corroborada, ao menos em tese, na Constituição de 1988. Trata-se do inciso II, do artigo 187(CF), determinante de que a política agrícola estabeleça compatibilidade entre os preços e os custos de produção, somando-se a isso a garantia de comercialização. Nada mais é do que a prática de preços de garantia ou preços mínimos preceituada originariamente no Estatuto da Terra. Na mesma esteira constitucional, conforme não poderia deixar de ser, a Lei Agrícola vigente, reafirma o entendimento de que os preços agrícolas devam cobrir os custos. Assim, estaria amparado o homem do campo ante a margem financeira para sua sobrevivência. É preciso encarar o fato com realismo. Não basta a legislação prever as hipóteses de forma teórica. Torna-se mister a prática dos preços de garantia. Os demais países dão prioridade de segurança nacional à produção campesina. Recentes exemplos foram vistos na rodada internacional de Doha. Não há motivo para correr o risco de perder o avanço constante da produção rural nacional por ausência da prática de preços de garantia, reais e equalizados. O sistema produtivo não pode viver unicamente de securitizações de dívidas passadas. Esse passivo somente poderá ser enfrentado de forma real e definitiva na hipótese de devolução de renda ao campo, estabelecendo-se mecanismos eficazes de preços mínimos e de garantia na comercialização.

Djalma Sigwalt é advogado

djalma.sigwalt@uol.com.br

Boletim Informativo nº 1019, semana de 25 a 31 de agosto de 2008
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná
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