Mora contratual fiduciária

A obrigação não cumprida é elemento essencial à resolução dos contratos. Esta pode envolver quaisquer dos contratantes. Nos contratos financeiros surgem situações em que o mutuário, devedor, deixa de cumprir a sua obrigação no vencimento, em razão de disposições negociais abusivas. Em condições assemelhadas tem entendido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça não ocorrer mora contratual por parte do financiado. O substrato desse debate tem acontecido comumente em procedimentos de ações incidentais de embargos. Também em ações revisionais pertinentes a contratos. Ainda, em demandas relativas à busca e apreensão fiduciária ou arrendamento mercantil. Esse debate da mora do devedor tem gerado manifestação repetida de julgados, pois o tema mostra-se de extrema importância para o debate judiciário.

Recente decisão proferida no STJ em 19.06.08 (REsp 1.061.102-PR) rechaça a mora do devedor fiduciário, pois o debate travou-se em procedimento de busca e apreensão (DL 167/67, art. 71). Examine-se o despacho “Bancário. Recurso Especial. Busca e Apreensão. Descaracterização da mora. A presença de encargos abusivos no contrato descaracteriza a mora, afastando seus consectários legais... Da descaracterização da mora. No que tange à descaracterização da mora do devedor em face de haver no contrato cláusulas abusivas, é certo que a existência destas tem força para afastar a incidência da mora do devedor. Nesse sentido, o AgRg no Ag 710.601/MS, da 3ª Turma, de minha relatoria, DJ de 06.03.2006; o AgRg no Resp. nº 507.551, 3ª Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 29.05.2006; e o AgRg no Resp nº 743.828, 3ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, DJ de 01.02.2006. Na presente hipótese. Extrai-se do acórdão recorrido que “...De sorte que, há que se acolher o inconformismo do apelante, com relação à capitalização de juros em periodicidade inferior à anual, devendo-se extirpar a cobrança referente a esse encargo” (fls.1125). Assim, é mister concluir que houve exigência de encargos abusivos, pois a capitalização mensal dos juros não era cabível na hipótese. Portanto, uma vez reconhecida a existência de encargos abusivos, fica descaracterizada a mora do devedor, devendo ser afastados seus encargos. Forte em tais razões conheço do recurso especial e dou-lhe provimento, com fulcro no art. 557, § 1º - A, do CPC, para declarar descaracterizada a mora do recorrente, e, conseqüentemente, afastar seus consectários legais.”

Invalidada a constituição em mora do devedor fiduciário não fica ele obrigado aos acessórios da dívida contratual, atinentes a multa e juros moratórios, até porque, o ato notificatório não tem eficácia jurídica em casos tais. Ocorre, conforme noticia o despacho transcrito que a instância recorrida reconheceu a existência de obrigação contratual nula, no tocante à capitalização de juros. Nesse passo, tendo existido a irregularidade, reconhecida esta em decisão judicial, a mora não se perfaz contra o devedor. Enfim, a mora e seus corolários não militam contra o devedor quando este tem reconhecida em seu favor motivação suficiente para não adimplir a obrigação.

Djalma Sigwalt é advogado, professor e consultor da

Federação da Agricultura do Paraná - FAEP   -   djalma.sigwalt@uol.com.br

 
Boletim Informativo nº 1014, semana de 21 a 27 de julho de 2008
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná
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