RECURSO ORDINÁRIO Nº 00806.2007.022.23.00-4 RO
RECORRENTE: C. M. Z.
RECORRIDO: CONFEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA DO BRASIL - CNA
RELATOR : JUIZ PAULO BRESCOVICIReunião em Londrina
EMENTA:
CONTRIBUIÇÃO SINDICAL - AÇÃO MONITÓRIA FUNDADA EM GUIA DE RECOLHIMENTO DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL - POSSIBILIDADE - REQUISITO DO ART. 1.102-A DO CPC PREENCHIDO - LEGITIMIDADE DA CONFEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA DO BRASIL - CNA - JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA - INCIDÊNCIA - AUTO-LANÇAMENTO.
Declarada a legitimidade da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil para demandar em ação monitória objetivando o recebimento da contribuição sindical rural e julgado procedente o pedido, deve incidir juros de mora, multa e correção monetária sobre os valores postulados, nos expressos termos do art. 600 da CLT. Os encargos moratórios são devidos desde a ocorrência do fato gerador do crédito de natureza tributária e o seu não pagamento na data aprazada, sendo desnecessário o lançamento do débito para a configuração da mora, o que ocorre anualmente.
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, em que são partes as acima indicadas.
RELATÓRIO
O
Excelentíssimo Juiz do Trabalho Substituto Juarez Gusmão Portela,
atuando na egrégia 2ª Vara do Trabalho de Rondonópolis/MT, proferiu a
sentença de fls. 76/80, cujo relatório adoto, por meio da qual acolheu
os pedidos constante da ação monitória, rejeitando os embargos
monitórios manejados pelo requerido, condenando o embargante ao
pagamento das contribuições pleiteadas, assim como a aplicação das
multas previstas no artigo 600 da CLT. O embargante-acionado interpôs
recurso ordinário às fls. 85/90, visando obter a reforma da sentença
quanto à multa moratória. Custas e depósito recursal recolhidos e
comprovados às fls. 95/96, respectivamente. Contra-razões ofertadas às
fls. 99/111. É, em síntese, o relatório.
VOTO
ADMISSIBILIDADE
Preenchidos os pressupostos processuais de admissibilidade, conheço do recurso ordinário.
MÉRITO
DOS ACRÉSCIMOS MORATÓRIOS
O comando decisório de primeira instância de jurisdição objurgado acolheu os pedidos constante da Ação Monitória de cobrança das contribuições sindicais formulados pela CNA, assim como a aplicação das disposições estabelecidas no artigo 600 da CLT.
Irresignado com o julgado,
pretende o recorrente ver reformada a sentença, com o objetivo de
afastar a imposição das multas cominadas no preceptivo legal supra.
Sem razão, contudo.
A
contribuição sindical foi instituída pelo Decreto-Lei nº 5.452/43, com
previsão específica nos arts. 578 a 610 da CLT. Já a contribuição
sindical rural foi criada pelo antigo Estatuto do Trabalhador Rural
(Lei 4.214/63, art. 135), que remeteu a regulamentação do seu valor,
processo de arrecadação e de distribuição às regras inseridas no
Capítulo III do Título V, da Consolidação das Leis do Trabalho. Somente
em 15 de abril de 1971 é que a contribuição sindical rural passou a
possuir regras próprias, ou seja, quando foi editado o Decreto-Lei
1.166/71, que dispõe sobre o enquadramento sindical rural e sobre a
contribuição sindical rural.
Vale ressaltar que o mencionado
Decreto não foi revogado pela Lei 5.889/73, uma vez que o art. 19 dessa
norma estabelece que o enquadramento e a contribuição sindical rural
continuam regidos por aquela norma. Nada obstante, por força das
disposições inseridas nos parágrafos 1º e 3º do art. 4º e arts. 6º e 9º
do Decreto-Lei 1.166/71, ficou ressalvada a aplicabilidade das
seguintes regras da CLT: art. 580, I, III; art. 598, 606 e 600, este
último fixando penalidade em caso de atraso no pagamento, além de juros
e correção monetária".
Entendo não haver revogação tácita do
art. 600 da CLT. As minhas razões encontram-se fundadas, porquanto a
Lei 4.214, de 02.03.1963 (Estatuto da Terra), no seu art. 135, criou o
Imposto Sindical, do qual emerge a Contribuição Sindical Rural, com
natureza jurídica de paratributo, disciplinado, ao depois, pelo
Decreto-Lei 1.166/71 (que dispôs sobre o enquadramento sindical rural e
sobre a contribuição sindical rural).
Contudo, a Lei 5.889/73, mudando o que precisa ser mudado, determinou a aplicação das disposições insertas na Consolidação das Leis do Trabalho ao trabalhador rural, especificando, no seu art. 19, que "O enquadramento e a contribuição sindical rural continuam regidos pela legislação ora em vigor", vale dizer, o Decreto-lei 1.166/71.
E o enquadramento sindical rural, referido pelo Decreto-Lei 1.166/71, faz alusão aos seguintes dispositivos da CLT aplicáveis relativamente à contribuição Sindical Rural: art. 580, "c", hoje inciso III - redação dada pela Lei 6.368/76; art. 580, "b", hoje inciso I - redação dada pela Lei 6.368/76; arts. 598 e 600; e art. 606.
Com base nos preceptivos legais acima gizados, merece relevo o teor do inciso IV do art. 8º da CRFB, verbis:
"a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei;" (destaquei).
Emerge cristalina a garantia constitucional da autora em receber o valor correspondente à contribuição confederativa, de caráter compulsório, portanto, com natureza jurídica de tributo, exigível de todos os proprietários rurais, indistintamente, consoante interpretação sistemática do sobredito dispositivo com o disposto no art. 149 do ordenamento constitucional.
Sérgio Pinto Martins, in Comentários à CLT, 4ª edição, São Paulo, Atlas, 2001, pp. 589/590, com peculiar propriedade leciona:
"... A contribuição prevista em lei (parte final do inciso IV do art. 8º da CF) é a sindical, disciplinada nos artigos 578 a 610 da CLT. (...) A natureza jurídica da contribuição sindical é tributária, pois se encaixa na orientação do artigo 149 da Constituição, como uma contribuição de interesse das categorias econômicas e profissionais, além do que é a contribuição prevista em lei, mencionada na parte final do inciso V do artigo 8º da Lei Magna".
Então, forçoso é concluir que a previsão inserta no art. 8º, IV, da CRFB, não exclui a obrigação do pagamento de contribuição outra, fixada por lei, tal qual a perseguida pela vindicante. A facultatividade quanto ao pagamento a que alude refere-se àquelas contribuições previstas nos estatutos das associações ou sindicatos, fixadas em assembléia geral, cuja abrangência cinge-se aos integrantes das categorias profissionais ou econômicas vinculadas à entidade representativa.
Daí não se poder falar em inconstitucionalidade por infringência ao disposto no art. 149 e 150, I, tampouco em bitributação por afronta aos comandos dos arts. 145, § 2º, e 154, I, todos da Magna Carta.
Colho da jurisprudência:
"COBRANÇA - CONTRIBUIÇÃO SINDICAL DE NATUREZA OBRIGATÓRIA - CONSTITUCIONALIDADE - A contribuição sindical prevista no artigo 578, da CLT foi recepcionada pela Constituição Federal e tem natureza jurídica tributária, porque compulsória e estatuída em lei, cujo pagamento é obrigatório, independentemente de associação. As contribuições exigidas com amparo no Decreto-Lei nº 1.166/1971 caracterizam-se como contribuição de interesse da categoria profissional ou econômica, conforme disposto no artigo 149, da Constituição Federal. - A recepção das contribuições para custeio das atividades dos sindicatos rurais restou reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, sendo exigida, nos termos do artigo 578 e seguintes da CLT, de todos os integrantes da categoria, independentemente de sua filiação a sindicato". (TAMG - AP 0352548-4 - (50515) - Belo Horizonte - 5ª C.Cív. - Rel. Juiz Mariné da Cunha - J. 13.12.2001)
Também é assente o entendimento segundo o qual deve
ser observada a incidência de juros de mora, multa e correção monetária
sobre os valores postulados, nos expressos termos do art. 600 da CLT.
O
Desembargador Federal do Trabalho Osmair Couto, em seu voto condutor no
RO 01470.2005.066.23.00-3, assim pronunciou-se acerca da temática:
"AÇÃO MONITÓRIA. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL. CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA AGRICULTURA. MULTA MORATÓRIA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. PERTINÊNCIA A PARTIR DO VENCIMENTO DA DÍVIDA. A Confederação Nacional da Agricultura possui legitimidade para pleitear, judicialmente, a totalidade da contribuição sindical rural, sendo responsável, ao depois, pelo repasse das verbas devidas às outras entidades beneficiárias. O art. 17, II, da Lei nº 9.393/96 legitimou a Confederação Nacional da Agricultura a cobrar a contribuição sindical devida pelo proprietário rural, em juízo. Tal comando se refere à cobrança decontribuições sindicais devidas à entidade Confederação Nacional da Agricultura, traduzindo que os convênios a celebrar se destinariam a viabilizar aludida cobrança. De igual forma, tem-se por possível a cobrança da multa moratória prevista no art. 600, CLT, uma vez que provado o inadimplemento do contribuinte, devendo esta fazerse incidir a contar do vencimento da obrigação, mesma que outra seja a data da notificação do devedor. Por fim, há que se assinalar que, na estrita forma do art. 606, § 2º, da CLT, a CNA goza do privilégio da Fazenda Pública quanto ao preparo recursal".
Merece reprodução a decisão do STJ citada no aludido voto:
"PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL. INCIDÊNCIA DE JUROS LEGAIS. MULTA. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. ART. 600, DA CLT. ART. 59, DA LEI 8383/91. 1. O art. 600, §§ 1º e 2º da CLT dispõe: Art. 600 - O recolhimento da contribuição sindical efetuado fora do prazo referido neste Capítulo, quando espontâneo, será acrescido da multa de 10% (dez por cento), nos 30 (trinta) primeiros dias, com o adicional de 2% (dois por cento) por mês subseqüente de atraso, além de juros de mora de 1 % (um por cento) ao mês e correção monetária, ficando, nesse caso, o infrator, isento de outra penalidade. § 1º - O montante das cominações previstas neste artigo reverterá sucessivamente:
a) ao Sindicato respectivo;
b) à Federação respectiva, na ausência de Sindicato;
c) à Confederação respectiva, inexistindo Federação.
§ 2º - Na falta de Sindicato ou entidade de grau superior, montante a que alude o parágrafo precedente reverterá à conta "Emprego e Salário".
2. Omissis
3. É inequívoco que a Contribuição Sindical Rural não é débito para com a Receita Federal.
4. Omissis.
5. Omissis.
6. Omissis.
7. Impende consignar que com a proposta de extinção do INCRA, em 1990, a arrecadação foi transferida para a Receita Federal, por força do disposto na Lei 8.022/90, sendo-lhe outorgada, em conjunto, a competência para cobrar a Contribuição Sindical Rural. Com a edição da Lei 8.847/94 foi afastada das atribuições da Secretaria da Receita Federal a cobrança da exação em tela, retornando-se ao statu quo ante.
8. Infere-se, assim, que a edição da Lei 8.847/94, a competência para a arrecadação da Contribuição em comento foi devolvida aos Sistemas Sindicais Rurais, uma vez que esta competência havia anteriormente sido delegada ao INCRA, por meio do Decreto-Lei 1.166/71.
9. Precedentes jurisprudenciais desta Corte: RESP 619.172-SP, Relator Min. José Delgado, DJ de 27.09.2004; RESP 315919/MS, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ em 05/11/2001 e RESP 423131/SP, Rel. Min. José Delgado, DJ em 02/12/2002.
10. Recurso especial conhecido e provido". (STJ 1ª Turma, REsp 616084 / PR ; RECURSO ESPECIAL 2003/0222689-4, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 30.05.2005 p. 223)
Os encargos moratórios são devidos desde a ocorrência do fato gerador do crédito de natureza tributária e o seu não pagamento na data aprazada, sendo desnecessário o lançamento do débito para a configuração da mora, o que ocorre anualmente, nos termos do art. 600 da CLT.
Nego provimento.
CONCLUSÃO
Pelo exposto, conheço do recurso ordinário, bem assim das contra-razões, e, no mérito, nego-lhe provimento, nos termos da fundamentação supra.
ISSO POSTO:
DECIDIU a 1ª Turma de Julgamento do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Vigésima Terceira Região, por unanimidade, conhecer do recurso ordinário, bem assim das contra-razões e, no mérito, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Juiz Relator.
Cuiabá, 15 de abril de 2008
PAULO BRESCOVICI
Juiz Relator