No campo do direito privado, nos últimos tempos, uma das importantes modificações introduzidas constituiu-se no acato pela lei civil do instituto da imprevisão contratual. A cláusula de imprevisão antes da atual codificação sempre foi vista pela doutrina jurídica nacional com fortes reservas. Apenas corrente minoritária admitia a sua aplicação plena no direito positivo. E mesmo assim em casos especialíssimos. Os elementos exigidos para o reconhecimento da imprevisão, em tempo anterior à moderna lei civil de 2002, eram tantos que sua incidência e aplicação aos casos concretos tornaram-se raros. Apenas o CDC, também de data recente, passou a admitir o instituto, embora circunscrito às relações de consumo. Conforme visto, apenas a doutrina minoritária a admitia em plenitude. Frente a esse quadro foi surpresa o axioma do artigo 478 do Código, que em tema de direito privado obrigacional e contratual gera autêntica revolução. Arreda a força vinculativa do contrato e cede espaço à alegação de imprevisão. Considerando-se a tradição da força obrigatória dos pactos e a autonomia da vontade contratual, tal admissão na lei expressa, descortina um direito novo. Muito mais taxativo e intenso, com largueza de aplicação. Efetivamente, abriu-se espaço para que a prestação jurisdicional alcance a autonomia do contrato outrora intocável e absoluta. Claro que elementos certos e requisitos pertinentes devem surgir para que isso aconteça. Com efeito, a imprevisão somente poderá ser argüida em casos excepcionais, mas o ineditismo decorre de que desta vez ela se acha codificada.
A imprevisão, em linhas gerais, surge toda vez que as partes firmam um contrato, em certo tempo futuro, no objetivo de cumpri-lo integralmente. Porém, decorrido o prazo constata-se a impossibilidade do cumprimento da prestação em decorrência de fatores supervenientes, os quais nasceram de situações excepcionais e extraordinárias. E, tais fatores não poderiam ter sido previstos na data da avença. E mais, por sua própria natureza tais questões incidentais resultariam na impossibilidade de adimplência de uma da partes. A onerosidade que disso se origina deverá ser de tal monta que venha a impedir a um dos contraentes o cumprimento integral ou parcial da obrigação. Essa modificação no direito contratual estabelece desdobramentos intensos, tais as possibilidades que se abrem na busca da prestação jurisdicional, nas hipóteses enquadráveis.
A disciplina da lei civil posta no artigo 478 não deixa dúvidas acerca da órbita da imprevisão em certas situações contratuais. Para isso conceitua e define o substrato contratual da execução continuada ou diferida. E, assim explicita: "nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato." O entendimento do texto dedicado à imprevisão funda-se no reequilíbrio do contrato desfeito por acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, ocorridos ao longo do período, gerando onerosidade excessiva para uma das partes. Descortina, efetivamente, uma nova fase do direito contratual.
Djalma Sigwalt é advogado, professor e consultor da
Federação da Agricultura do Paraná - FAEP - djalma.sigwalt@uol.com.br